Ficha Corrida

12/07/2015

Lúcio Yanel, até que enfim!

Filed under: Gaúcho,Lúcio Yanel,Porque hoje é domingo! — Gilmar Crestani @ 12:26 am
Tags: ,

2012-09-13_1347578077Esta foto é do meu Instagram. Fiz por ocasião do Acampamento Farroupilha, no Galpão da Associação dos Servidores do Poder Judiciário Federal, em 13/09/2012, no Parque da Harmonia.

Não sou muito dado a eventos do tipo gauchescos. Mas vou em função dos amigos, como o foi nessa oportunidade. Lembro como se fosse hoje, até porque fui muito em conta da atração musical. Infelizmente, tinha poucos convidados e, felizmente, os poucos pudemos apreciar mais e melhor este grande artista.

Infelizmente, por estas bandas pouco se conhece, apesar das muitas participações em CDs de músicos destes pagos. Precisou, enfim, ser ouvido no centro do país para merecer este reconhecimento. Tenho e curto alguns dos seus CDs, inclusive os que ele lançou em companhia do Mauro Moraes.

Depois que o lado comercial descambou para o tchê music, uma espécie de axé com gaita, larguei de mão. Além disso, a RBS se apropriou do gauchismo como movimento de tradição para adestar ainda mais a manada gaúcha. Não é por acaso que ela, a RBS, tenha dois senadores (Ana Amélia Lemos e Lasier Martins), e os gaúchos apenas um (Paulo Paim).

O gênio desconhecido do sul: Lúcio Yanel

sab, 11/07/2015 – 14:19

Atualizado em 11/07/2015 – 20:30

Luis Nassif

Yamandu já tinha comentado de passagem sobre Lúcio Yanel quando indaguei a razão do seu sotaque argentino. Mas, agora, em Poços de Caldas, o Gabriel Savage me traz mais dados.

No sarau de ontem à noite, Gabriel interpretou várias peças de Yanel. Uma delas, “Pantanal” nada fica a dever aos Estudos de Villa-Lobos. A variedade de sons, de modos de tocar que Yanel criou e Gabriel arrancou do violão – especialmente o modo pampaneiro de tocar -, repito: nada fica a dever aos Estudos de Villa-Lobos, que mudaram a forma de tocar do violão no século 20. Dê-se o devido desconto histórico, é claro, e a dimensão de um (o mundo) e do outro (o sul).

Digo mais: dentro de alguns anos a contribuição de Yanel ao violão será reconhecida como das maiores, um gênio comparável a Garoto e aos grandes formadores do violão brasileiro, por um conjunto de razões: ele como intérprete, como compositor mas, principalmente, como formador da mais nova escola e brilhante escola intrumental do país: a gaúcha, ou pampaneira, para usar o termo que eles gostam.

Semanas atrás coloquei, aqui, vídeo do Yamandu em duo com Arthur Bonilha, ambos valendo-se do mesmo estilo ensinado por Yanel. O que se assistia eram dois violonistas tocando de igual para igual. Dois violonistas sempre podem tocar de igual para igual, mas quando um deles é Yamandu e, de repente, você se depara com dois Yamandu, é milagre. Aí você ouve Gabriel Selvage, e três milagres na mesma região exigem um santo protetor.
Infelizmente Bonilha faleceu em maio, em acidente automobilístico, aos 34 anos de idade.

E aí entramos na história de Yanel e do novo fenômeno da música instrumental brasileira, os gaúchos e seu som pampaneiro.
Gabriel nasceu no campo. Desde criança, criava cavalos. Mantem o hábito da bombacha, que não tirou nem quando excursionou pela Europa. Aos 12 anos ganhou um revólver, que mantinha na cabeceira da cama, para se prevenir contra a violência da região onde morava. Ele narrando os acertos de contas por lá ajuda a entender a razão da violência ancestral brasileira, aliás. O interior gaúcho ainda guarda a herança de violência dos Farrapos

Aos 14 anos vou trabalhar fora de casa, cuidando de cavalos.

Passou a aprender violão e decidiu ter aulas com Yanel. Da sua casa até a cidade onde Yanel morava, na grande Porto Alegre, eram 400 km. Ele viajava de ônibus o dia todo, tinha as aulas e, quando perdia o ônibus de volta, dormia na casa do mestre

As aulas consistiam em vê-lo tocando e pedir-lhe que ensinasse na prática seu modo de tocar. Yanel não lê partituras, não tem a menor ideia sobre as notas. É um gênio intuitivo em estado puro.
Sua vinda ao Brasil é uma epopeia.

Nos anos 70 foi excursionar pela Rússia, uma série de concertos de músicos latino-americanos, dentre os quais muitos brasileiros. Encantou-se com a música do país e, na volta, decidiu parar no Recife

Acabou voltando para a Argentina, mas os sons do Brasil já o haviam capturado. Decidiu radicar-se em São Paulo. Aproveitando sua vinda para o Brasil, um amigo pediu-lhe que passasse por Porto Alegre para entregar umas partituras para um amigo que morava lá

O amigo, em questão, tinha um filho de dois anos, de nome Yamandu, e pronúncia Diamandu.

Yanel entregou, estava tarde e acabou dormindo na casa. De manhã, a mãe de Yamandu acordou e se surpreendeu com o violão que jorrava da sala. Imediatamente acordou o marido para informar que o visitante era um gênio do violão.

Nunca mais o deixaram sair. Yanel se fixou por lá, em uma cidade próxima a Porto Alegre e passou a inundar o fechado mundo gaúcho com sua arte.

Ajudou a formar uma das mais brilhantes gerações de violonistas do país – a julgar pelos três que conheci, Yamandu, Bonilha e Gabriel.

Há alguns anos mudou-se para Caxias. Mora de aluguel, vive de aulas e tocando em botecos.

Já entrei em contato com ele para montarmos uma noite paulista-gaúcha em São Paulo, para apresentar essa brilhante geração aos paulistas. O prefeito Fortunati, de Porto Alegre, topou. Nos próximos dias tentarei que o Danilo, do Sesc, ajude a montar o lado paulista.

Aí se verá ao vivo alguém que, ainda em vida, já é uma lenda.

Vídeos

Veja o vídeo

Veja o vídeo

Veja o vídeo

03/07/2014

Aos fãs do Boom Dylan!

Filed under: Bob Dylan,Música — Gilmar Crestani @ 9:45 am
Tags:

 

El ‘tesoro’ oculto de Bob Dylan sale a la luz 45 años después

Aparecen 149 acetatos de grabaciones del cantautor en un altillo de Nueva York

Irene Crespo Nueva York 2 JUL 2014 – 21:05 CET16

Bob Dylan, en su casa de Woodstock a finales de los sesenta. / columbia records

Al fondo de un altillo en el dormitorio del piso bajo del número 124 Oeste de la calle Houston en Nueva York. Allí, en un rincón, encontró el último dueño del edificio, tras la muerte de su hermana, la casera original, dos cajas de cartón en las que se leía: Old Records (Discos viejos). Las abrió y se encontró con una enorme colección de discos, algunos con el nombre de Bob Dylan en su sobre, la dirección de su sello discográfico, Columbia Records, y el título de la canción. No sabía qué eran, sólo que serían importantes porque recordaba que su hermana le había alquilado aquel espacio al cantante a finales de los años sesenta.

más información

Eran 149 discos de acetato. Ensayos y pruebas que Dylan hizo entre finales de los sesenta y principios de los setenta para sus álbumes Nashville skyline (1969), Self portrait (1970) y New morning (1970) y que nunca habían salido de esas cajas. Hasta ahora. “Es definitivamente uno de los hallazgos más importantes de mi carrera”, dice desde Los Ángeles por teléfono, Jeff Gold, exvicepresidente de Warner Bros. Records, reconocido coleccionista musical fundador de Recordmecca y experto en Bob Dylan.

A él fue a quien llamó el dueño del edificio cuando se dio cuenta del valor de lo que tenía entre manos. “Le llevó mucho tiempo descubrir qué eran”, explica Gold, negándose a dar el nombre del dueño. “Los acetatos llevan unas muescas en un lado, son más pesados de lo normal y no llevan cubierta. No sabía si eran todos de Dylan. Sólo que serían piezas de colección”.

ampliar foto

Uno de los 149 acetatos, con anotaciones de puño y letra de Bob Dylan.

Después de algunas charlas telefónicas, Gold voló a Nueva York para verlos él mismo. “Cuando abrí las cajas y eché un vistazo, me volví loco. Efectivamente eran todos discos de Dylan, en excelentes condiciones y muchos de ellos tenían notas escritas a mano en sus sobres”. Aunque no pudo escucharlos en en ese viaje (porque se necesita un equipo especial para unos discos tan delicados), no se lo pensó dos veces y le ofreció al descubridor el doble de dinero de lo que había imaginado. ¿Cuánto? No quiere dar una cifra ni aproximada. “Para mí no es una cuestión de dinero: esto es historia. Lo importante es descubrir cómo Dylan trabajaba en sus discos en aquella época”.

Cuando abrí las cajas, me volví loco”, dice el coleccionista Jeff Gold

A principios de los años sesenta, Bob Dylan llegó a Nueva York atraído por el revival folk que se vivía en el barrio de Greenwich Village. Todo cambió por completo cuando aterrizó Dylan, el de la voz más ronca de todos los que allí tocaban en cafés y plazas. Lo hizo mejor que nadie y, tras publicar sus primeros álbumes, se alquiló un piso en la calle MacDougal y un bajo, a dos manzanas, en el 124 Oeste de la calle Houston, que usaba como estudio de grabación. En este estudio componía, grababa estos acetatos, propiedad de Jeff Gold ahora, y se los mandaba a su productor Bob Johnston, que vivía en Nashville. Johnston hacía la mezcla y se los mandaba de vuelta con anotaciones. Esas anotaciones que ahora se leen en las carátulas encontradas. “Le mandé algunas fotos de los acetatos para ver si eran suyas y me confirmó que era su letra. Otras eran de Dylan”, continúa. “Era la forma de tener controlado al músico en la distancia. Y demuestra lo mucho que le llevaba a Dylan refinar sus canciones”.

El 124 Oeste de la calle Houston en Nueva York que escondía el tesoro de las grabaciones de Dylan.

Como reconocido experto y coleccionista del cantante de Minnesota, Jeff Gold mantiene una buena relación con su equipo. Tras pasar tres meses, con ayuda de amigos, “transfiriendo a digital, catalogando y fotografiando todos los acetatos”, les llamó para ofrecerles copias de todo lo que tenía. “Y me lo agradecieron mucho. Es probable que Columbia Records tenga los master de todos estos temas en sus archivos, pero quizá no de algunas mezclas específicas”.

La mayoría de los discos contienen versiones inéditas de canciones que luego publicaría en sus tres álbumes consecutivos. “En algunos casos son desconocidas”, dice Gold. “Nunca había escuchado antes las versiones que hizo de los temas de Johnny Cash, Folsom prison blues y Ring of fire; ni la versión gospel que hizo de Tomorrow is a long time, grabada pero nunca publicada en el álbum New Morning”.

Nunca había escuchado su versión de ‘Ring of fire’, de Cash”

Esos discos son algunos de los que se quedará Gold, quien considera este descubrimiento como uno de los dos hitos en su carrera de coleccionista y fan de Dylan. “El otro fue cuando encontré en 2010 una cinta de un concierto suyo en la universidad Brandeis en 1963. Se la vendí a la oficina de Dylan y lo publicaron como un álbum en directo. Y sí, me quedo los mejores y los más interesantes”, dice emocionado. El resto los ha empezado a poner ya a la venta a través de su web, Recordmecca, a un precio que va desde los 1.800 euros a más de 5.000.

El ‘tesoro’ oculto de Bob Dylan sale a la luz 45 años después | Actualidad | EL PAÍS

15/06/2014

As músicas das copas

Filed under: Copa 2014,Gianna Nannini,Música — Gilmar Crestani @ 12:07 am
Tags:

Dentre todas, destaco Plácido Domingo, no mundial da Espanha, em 1982, e "Un’estate italiana", de Gianna Nannini e Edoardo Bennato,  da copa da Itália de 1990. Gianna é a irmã mais velha do ex-piloto italiano de Fórmula 1, Alessandro Nannini. Gianna é uma grande letrista e iluminada roqueira que fez muito sucesso nos anos 90. Ah, também a escolha do musicista dos faroeste, Ennio Morricone, outro italiano, para fazer a trilha dos pistoleiros argentinos. Depois, o pop, que é o “sertanejo universitário” globalizado, tomou conta.

Tutte le canzoni dei mondiali: quando sport e musica vanno a braccetto

Iniziano oggi i mondiali di calcio in Brasile e come ogni coppa del mondo, da decenni ad oggi, per circa un mese ci sarà una canzone che sentiremo ovunque: dalle radio alle discoteche sulla spiaggia, nei supermercati e nella suoneria del cellulare di chi incontriamo per strada.

Se quattro anni fa a spopolare era stata Shakira con lo straordinario successo di Waka Waka, gli organizzatori brasiliani hanno deciso di puntare per la colonna sonora dei mondiali sul duo Jennifer Lopez-Pitbull e sul loro pezzo, dai ritmi squisitamente carioca, We are one-Ole Ola.

Approfittiamo di questa occasione per una carrellata delle canzoni delle varie edizioni della coppa del mondo. Un viaggio nel tempo, nello sport e nella musica. Tra le sigle più memorabili certamente quella di Ricky Martin di Francia ’98 e le "Notti Magiche" di Italia 90. Andando più indietro riscopriamo però che la vittoriosa avventura di Spagna 82 è stata giocata con Placido Domingo come sottofondo o che in Argentina ’78 gli organizzatori avevano optato per una melodia scritta dal grande Ennio Morricone. Ma oltre ai grandi nomi ci sono da rispolverare i ritmi scanzonati di Inghilterra ’66 o il pomposo patriottismo di Usa ’94.

Buon ascolto!

Brasile 2014 – "We are One (Ole Ola)", Jennifer Lopez & Pitbull

Sudafrica 2010 – "Waka Waka", Shakira

Germania 2006 – "The Time of Our Lives", Il Divo

Corea/Giappone 2002 – "Boom", Anastacia

Francia 1998 – "La Copa de la Vida", Ricky Martin

Usa 1994 – "Gloryland", Daryl Hall

Italia 1990 – "Un’estate italiana", Nannini – Bennato

Messico 1986 – "El Mundo Unido por un Balon", J. Abara

Spagna 1982 – "Mundial ’82", Placido Domingo

Argentina 1978 – "Marcha del Mundial ’78", Ennio Morricone

Germania 1974 – "Fussball Ist Unser Leben", Werner Drexler y Jack

Messico 1970 – "Futbol Mexico 70", R. do Nascimento

Inghilterra 1966 – "World Cup Willie", Lonnie Donegan

Cile 1962 – "El Rock del Mundial", Los Ramblers


Tutte le canzoni dei mondiali: quando sport e musica vanno a braccetto – AgoraVox Italia

09/02/2014

Ute Lemper y Neruda

Filed under: Música,Pablo Neruda,Poesia,Ute Lemper — Gilmar Crestani @ 12:31 pm
Tags:

 

Ute Lemper y Neruda, pareja imposible

La cantante alemana encalla en su esfuerzo de llevar al escenario los poemas de amor del Nobel chileno. Su gira española visita siete ciudades

Borja Hermoso Barcelona 8 FEB 2014 – 19:01 CET

Ute Lemper, el viernes en Barcelona. / Gianluca Battista

Ute Lemper es alemana (Münster, 1963), vivió en París mucho tiempo, lleva 17 años instalada en Nueva York aunque no quiere oír hablar de pasaporte estadounidense, canta en alemán, en inglés, en francés, en italiano, ahora también en español y pronto lo hará en portugués. El chino y el ruso quedan lejos, pero ya verán como todo se andará.

Se atreve lo mismo con las tormentas de Bertolt Brecht que con las locuras de Bukowski, lo mismo con las falsas ternuras de la chanson que con el aullido etílico del cabaret, lo mismo es Piaf que Brel, Leo Ferré que Lotte Lenya, Celan que Neruda, igual le da Astor Piazzolla que Kurt Weill, Costello que Sondheim, transita con parecida comodidad entre la tristeza sonora del bandoneón que entre el jolgorio flamenquero de un buen cajón. Ha sido la chica deseada por todos en fastuosos montajes de Cabaret o Chicago en Broadway o el West End, se encierra en teatros a la italiana de grandes capitales y en fríos auditorios de provincias de esos que algún concejal o consejero de Cultura supo sacarse de la chistera, mueve en el escenario su privilegiada estructura ósea como si fuera la replicante de Blade runner, susurra y chilla, silba y se acaricia un hombro, deja entrever una pierna sin fin, guiña un ojo, enseña la espalda, reanuda sin freno el rito de la seducción, convierte el show en un híbrido de teatro, música y acto sexual.

La gente es cada día más inculta, más plana y más maleducada”

Por si fuera poco, los posicionamientos del personaje contra las extremas derechas europeas (fue muy sonada en los noventa su personal cruzada contra Le Pen) y las injusticias sociales, y su visión del papel del arte, son de alto voltaje. Sobre esta última cuestión, por ejemplo, su pesimismo es elocuente: “Hubo épocas en las que el arte y el pensamiento influyeron profundamente en la política; hablo de los años sesenta, Vietnam, el feminismo y todo eso, pero también de los años veinte, un tiempo en el que el arte fue de verdad revolucionario y rompió muchos resortes del conservadurismo. Hoy, el arte es un puro producto comercial y los artistas no asumen riesgos. Hoy el arte está dormido, es como un mueble en un apartamento bonito, un mueble frío que cumple una labor estética y de puro entretenimiento. La consecuencia de ello es que la gente es cada día más inculta, más plana, también más mal educada”.

Y todo eso es Ute Lemper, pero todo eso, pese a su empírica e indiscutible capacidad de fascinación, no es garantía de éxito. Tanto eclecticismo tiene sus peajes, porque no es lo mismo ver a la Lemper cantando en alemán la entartete musik (música degenerada), que sulfuraba a los nazis, que asistir a su nueva aventura escénico-discográfica, una incursión musical por los poemas de amor de Pablo Neruda. Vasta misión. Pero ya se sabe, lo honorable de las misiones no tiene por qué ir necesariamente acorde con el éxito del resultado.

La cantante arrancó el viernes por la noche en el Palau de la Música Catalana de Barcelona su gira por siete ciudades españolas para presentar su nuevo disco, Forever. Los poemas de amor de Pablo Neruda, un tributo personal al escritor y diplomático chileno que ganó el Nobel en 1971.

Me daba bastante miedo banalizar su mensaje con mis canciones”

“Neruda fue uno de los pocos personajes capaz de unir con eficacia y belleza el arte y la política, pero precisamente por eso mismo, me daba bastante miedo banalizar su mensaje con mis canciones. Así que me concentré en sus poemas de amor, que no son románticos, sino desgarradores, a veces violentos, siempre entre el deseo de felicidad y la imposibilidad de ser felices”, explicaba hace unos días Ute Lemper desde su casa de Manhattan en una conversación telefónica con este diario.

Resulta conmovedora la irrefrenable gana de probar cosas nuevas por parte de esta artista. Ute Lemper asegura, y habrá que creerla, que este disco sobre Neruda se lo ha pagado ella, y que se ha gastado en él un montón de dinero que, vaticina, no recuperará. “Mire, yo me arriesgo, siempre. Y este proyecto de Neruda es la prueba. Me he gastado un montón de dinero para grabarlo, ya no se hacen discos así, de concepción tan compleja, con canciones hechas sobre la base de un material literario, con arreglos especiales en cada una de ellas, a caballo entre la world music, el jazz, el tango, la música clásica… es un viaje, es un reto, pero me gustan los viajes complicados”.

La gira de Lemper / Neruda pone en marcha sobre el escenario una miniorquesta de seis voces que acunan a la maestra de ceremonias: bandoneón, guitarra acústica, piano, chelo, violín y cajón. Ute Lemper ha elegido 11 piezas del autor de 20 poemas de amor y una canción desesperada, y las interpreta, claro, a su manera.

El arte hoy es como un mueble frío que cumple una labor estética”

El esfuerzo es enorme, el resultado se queda en magma sin rumbo. El espíritu del poeta rojo y el mar profundo de la Isla Negra quedan bien lejos de todo esto. Tanto, que al final del espectáculo —y a petición de los propios promotores de la gira—, Lemper se tiene que poner el sombrero negro ahuevado y desgranar varios de los éxitos que hicieron de ella lo que en verdad es, y no otra cosa: una excelsa cantante de cabaret.

Así, el viernes por la noche en el Palau cayeron Lili Marlene y Mackie Messer (Mackie el Navaja), la estrella hizo al público silbar los estribillos y todo acabó entre algodones. Antes, con las versiones atormentadas (y tormentosas) de poemas nerudianos como Tus manos o El poema más triste número 20 todo había transcurrido más bien en un clima de perplejidad.

El verbo español de Ute Lemper no es su verbo francés, ni el inglés, ni por supuesto el alemán, no acaba de captarse bien, la voz sigue embriagando, sí, pero si hablamos de poesía de Neruda, lo ideal sería que los versos se entendieran.

Bueno, no es tan grave, a Umberto Tozzi también le salía mejor Ti amo en italiano que Te amo en español. Eso sí, Mis manos en tu cintura de Adamo era soberbia. Eso hay que reconocerlo.

La diva y España

Tras su paso por el Palau en Barcelona —“el teatro más bonito del mundo” — dijo la cantante nada más salir al escenario el viernes—, la excursión española de Forever recalará en otras seis ciudades, dividida en dos partes.

La gira llegará hoy a Altea y pasará por Galicia la próxima semana. Santiago, el día 14 y Vigo, el 15.

La artista alemana volverá a finales de abril para otras tres citas: Logroño, el 26; Pamplona, el 27; y Madrid, el 28.

Ute Lemper alterna esta gira con actuaciones por el mundo de su espectáculo Paris days, Berlin nights.

Está preparando un nuevo disco, el último de su trilogía de autores latinoamericanos, esta vez sobre textos del escritor brasileño Paulo Coelho.

ute lemper: Ute Lemper y Neruda, pareja imposible | Cultura | EL PAÍS

02/02/2014

Leitura de domingo: Stephen Hawking

Filed under: Casca de Noz,Stephen Hawking — Gilmar Crestani @ 9:23 am
Tags:

 

Senhor do tempo

Stephen Hawking em 120 minutos

JOSÉ EDELSTEINTRADUÇÃO CLARA ALLAIN

RESUMO Em visita à Universidade de Cambridge, físico argentino entrevista o cientista mais popular da atualidade. Um retrato da vida e do pensamento de Stephen Hawking, que voltou ao noticiário nesta semana ao negar, em novo artigo, a existência dos buracos negros, contrariando conclusões de 40 anos de suas próprias pesquisas.

Os corredores dos pagodes modernos que compõem o Centro de Ciências Matemáticas da Universidade de Cambridge convidam ao assombro. No primeiro andar, uma porta se destaca em meio à coreografia confusa criada pela infinidade de salas idênticas. É a única que não tem maçaneta; abre-se com um código numérico, e nela ainda se veem quatro furinhos nos quais, até há pouco, parafusos sustentavam uma discreta placa dourada, com 17 caracteres negros gravados em tipografia clássica, em letras maiúsculas, dizendo "LUCASIAN PROFESSOR".

A placa percorreu uma breve distância até parar na porta de Michael Green, um dos pais da teoria das cordas. O mesmo rótulo tinha sido fixado, em 1669, à porta de um jovem professor universitário de apenas 26 anos que respondia pelo nome de Isaac Newton. A partir daí, ser titular da cátedra Lucasiana converteu-se em distinção superlativa, legendária, compartilhada por gigantes da história da ciência. Como aquele que me aguarda atrás da porta da sala B1.07, Stephen William Hawking.

Se um encontro com Hawking é sempre aguardado com ansiedade máxima, a minha ansiedade se viu redobrada pela frustração da primeira tentativa.

Algumas semanas antes, eu tinha visita marcada à sua casa, mas um problema de última hora causou seu cancelamento. Foi preciso trocar o ambiente sóbrio e acolhedor da residência de Hawking pelo de sua sala de trabalho, luminosa e moderna. Em seu lar, eu o teria encontrado, como anos antes, mais descontraído, diante de estantes de madeira, nas quais livros convivem com desenhos que lhe são enviados por dezenas de crianças do mundo todo e com algumas primeiras edições que ele coleciona, e ouvindo Wagner. "Ninguém conseguiu, nem antes nem depois dele, transmitir tanta emoção com a música."

DOENÇA Como se sabe, Stephen Hawking sofre de uma doença degenerativa que o imobilizou quase por completo. Não obstante essa deficiência grave, cujos primeiros sintomas apareceram na época de sua tese de doutorado, quando completou 21 anos, ele conseguiu desenvolver uma carreira científica que o elevou ao Parnaso dos maiores físicos teóricos da segunda metade do século 20.

Para dar a dimensão de sua importância como cientista, serei categórico: boa parte do que sabemos quanto aos aspectos teóricos mais fundamentais acerca da origem do universo e seus mais misteriosos e monstruosos habitantes, os buracos negros, é obra dele.

Apesar de toda sua carreira ter sido marcada pelas limitações impostas pela doença, foi nos primeiros anos que ela avançou mais rapidamente. O jovem Stephen Hawking tinha grandes aspirações quando chegou a Cambridge e, em muito pouco tempo, viu-se diante da possibilidade real de não viver nem para concluir o doutorado.

O prognóstico habitual para os pacientes com esclerose lateral amiotrófica é de dois ou três anos de vida. A ponto de jogar a toalha, Hawking se apoiou em três pilares: o amor de sua primeira mulher, Jane Wilde; o incentivo intelectual que foi conhecer o físico matemático Roger Penrose; e, não menos importante, um aspecto de sua personalidade que se fará notar neste encontro: sua rebeldia impetuosa, obstinada e por vezes presunçosa. A rebeldia de alguém que vê a ciência "como uma disciplina não apenas racional mas também romântica e passional".

Seu caráter indômito o levou a enfrentar a autoridade acadêmica da época, Fred Hoyle, e sua "teoria do estado estacionário" (segundo a qual o universo, em permanente expansão, não se dilui graças à criação contínua de matéria), que era vista como alternativa promissora à então infamada teoria do Big Bang (cujo nome, paradoxalmente, foi cunhado por Hoyle).

Apesar de sua dificuldade crescente para escrever ou caminhar, Hawking publicou uma série de trabalhos cujo ápice foi um artigo assinado com Penrose, em janeiro de 1970. Nesse texto, eles demonstraram matematicamente que eventos em que o espaço e o tempo nascem e morrem, como o Big Bang e os buracos negros, não apenas são prováveis na teoria da relatividade geral como são simplesmente inevitáveis. Os cientistas só se encontraram cara a cara uma vez durante o processo de redação do que hoje se conhece como o "teorema da singularidade".

CASCA DE NOZ Pouco antes, Arno Penzias e Robert Wilson tinham descoberto acidentalmente que o universo emitia, a partir de toda e qualquer direção, uma radiação térmica, indicação de que, levando em conta que a expansão produz resfriamento, ele teria de ter sido menor e mais quente no passado. Se regredíssemos no tempo tanto quanto a imaginação nos permitisse, chegaria um momento em que o universo inteiro caberia numa casca de noz e que sua temperatura seria altíssima. O Big Bang, como fruto desse teorema e dessas observações, adquiriu desde então status de teoria científica.

O trabalho feito com Penrose bastaria para que Hawking conquistasse um lugar na história da física. Mas suas contribuições mais características têm a ver com os buracos negros, criaturas fantásticas cuja história é fascinante.

Sua descoberta matemática foi feita por Karl Schwarzschild, que completou os cálculos nas trincheiras do front russo na Primeira Guerra, pouco após Einstein publicar a teoria da relatividade geral. Schwarzschild não chegaria a saber que, por um quarto de século, seus resultados seriam recebidos como uma extravagância. Algo tão excêntrico quanto o pênfigo paraneoplásico, doença autoimune que o mataria meses mais tarde.

Em 1939, Robert Oppenheimer e Hartland Snyder demonstrariam que uma estrela suficientemente pesada poderia implodir devido à atração gravitacional, colapsando até chegar ao estado descrito por Karl Schwarzschild.

Muitos outros físicos contribuiriam com pistas relevantes. Mas a mudança que fez com que esses seres mitológicos, cuja força gravitacional é tão intensa que nem sequer a luz consegue escapar, fossem considerados como entidades possivelmente reais deve muito a John Archibald Wheeler, que em 1967 os chamou buracos negros.

Nessa época o jovem doutor Stephen Hawking começava a domesticá-los, armado com papel e lápis, ao mesmo tempo em que sua mulher, Jane, se ocupava de Robert, seu recém-nascido primogênito.

Já confinado a uma cadeira de rodas, Hawking viu nascer sua filha Lucy, cuja chegada auguraria outras alegrias: pouco depois ele descobriu que os buracos negros deviam ter entropia, conceito estatístico associado a sistemas compostos. Mas, diferentemente do que ocorre em todos os sistemas naturais conhecidos, sua entropia parecia residir em sua fronteira, e não no buraco negro em si.

Toda a informação se encontraria, portanto, na superfície que o rodeia, como uma lata de alimento em conserva que não se pode abrir, mas cujos detalhes podemos acessar pela leitura do rótulo. De acordo com o estabelecido então pelo cientista, os buracos negros seriam como hologramas.

As contribuições teóricas de Hawking dotaram de substância física esses entes misteriosos que, segundo ele, se emitissem radiação, evaporariam, levando junto o que haviam deglutido. Isso causa um conflito frontal com as leis da física quântica: a informação, como a energia, não pode ser perdida. Se os buracos negros evaporam sem deixar rastro daquilo que engoliram, tanto faz se o livro era uma antologia poética de Vinicius de Moraes ou se era o mesmo livro, mas com páginas em branco.

Agora, depois de 40 anos de intensos debates, durante os quais Stephen Hawking ajudou a dar entidade aos buracos negros, o físico britânico a nega.

Ele divulgou sua nova posição, na semana passada, em um artigo na plataforma arXiv, que acolhe trabalhos antes de sua publicação em revistas científicas.

No texto, Hawking sugere que o chamado horizonte dos eventos, fronteira matemática a partir da qual toda e qualquer coisa desapareceria dentro de um buraco negro, simplesmente não existe. Se não há horizonte de eventos, não há buracos negros! Para ele, em vez de horizonte de eventos, haveria um "horizonte aparente", capaz de capturar a luz por um tempo. O processo pelo qual o buraco negro engoliria matéria seria assim tão caótico que, ainda que a informação não se perdesse, estritamente, reconstrui-la seria tão difícil quanto, digamos, prever que tempo vai fazer em São Paulo no instante preciso em que você estiver lendo estas linhas.

O novo artigo ainda não foi revisado por outros cientistas nem apresenta fundamentação matemática para suas conclusões audazes e provocadoras. De fato, nenhuma das previsões de Stephen Hawking pôde ser comprovada.

NOBEL Por isso ele não recebeu o Nobel. Foi, no entanto, agraciado com uma distinção ainda mais prestigiosa, a medalha Copley, prêmio científico mais antigo do mundo, outorgado pela Royal Society de Londres desde 1731.

Hawking a recebeu em 2006, dois anos antes de Penrose. Enquanto o Nobel de Física, Química ou Fisiologia é habitualmente dividido, a medalha Copley é entregue a uma só pessoa por ano. Darwin, Einstein e Pasteur a receberam. Em 1838, numa rara ocasião em que foi difícil escolher um nome, ela foi compartilhada por Michael Faraday, um dos dez físicos mais importantes da história, e Carl Friedrich Gauss, rei da matemática.

No início dos anos 80, Hawking se propôs a escrever um livro em que pudesse explicar os conceitos avançados da física fundamental ao grande público. Recusou-se a fazê-lo com editoras acadêmicas, pois lhe interessava que o texto pudesse ser acessível a qualquer leitor. Habituado a usar uma linguagem metafórica e carregada de imagens em suas palestras, sentia-se preparado para lançar uma ponte sobre a enorme distância que separa do cidadão comum as sofisticadas teorias da física moderna, cuja expressão natural depende do idioma das matemáticas.

O lento processo de redação e correções do livro acabou dificultado por um enorme contratempo. Em meados de 1985, numa visita que fazia ao Cern (Organização Europeia para a Pesquisa Nuclear), uma pneumonia deixou Hawking à beira da morte, e foi necessária uma traqueostomia para salvá-lo. Desde então, ele ficou mudo. Apesar disso, em 1988 saiu, finalmente, "Uma Breve História do Tempo", que catapultou a divulgação científica ao status de best-seller. O estímulo que o livro representou para que milhares de jovens se inclinassem à ciência é incalculável.

CQC No horário novamente agendado, ali estava eu, à porta da sala de trabalho de Hawking; e, quando passei por ela, ali estava o próprio Hawking. O primeiro contato visual teve um ingrediente inesperado: o cientista mais famoso do planeta usava óculos escuros que pareciam saídos do "CQC" –lembrei-me de que era possível, pois, quando em visita a Santiago de Compostela, ele havia participado da versão espanhola do programa.

Diante do espanto que não tive como esconder, Jonathan Wood, o assistente técnico que monitora com extrema atenção o sistema através do qual Hawking se comunica, assinalou a claridade ofuscante que chegava pelas grandes janelas da sala: "Ele precisa dos óculos de sol para poder utilizar o sistema de comunicação".

Há quase três décadas, Stephen Hawking se comunica com o mundo externo por meio de um computador integrado à sua cadeira de rodas e de um programa especial com que monta suas frases, emitidas por um sintetizador de voz. Apesar dos avanços tecnológicos Hawking não quer nem ouvir falar em melhorar a qualidade do sintetizador –cuja voz, além de metálica, para o constrangimento de um professor britânico, tem sotaque americano. "Essa é minha voz", diz, com lógica arrasadora.

Até o início da década passada ele era capaz de mover os dedos de sua mão direita com agilidade suficiente para manipular um mouse. Mas, quando perdeu a mobilidade da mão, teve que recorrer ao reconhecimento de movimentos faciais. Seu assistente anterior, Sam Blackburn, concebeu um detector que sai da parte superior de seus óculos, semelhante a uma pequena lâmpada de leitura, registrando os movimentos de sua bochecha.

Com essa única maneira de clicar, Hawking não pode navegar pela tela, como antes fazia. Sua velocidade de comunicação diminuiu muitíssimo, até chegar a uma palavra por minuto. Alternativas de todo tipo vêm sendo exploradas –desde o scanning cerebral até o rastreamento dos olhos, passando por um sistema sofisticado que monitora seu rosto, aproveitando a complexidade de movimentos a seu alcance. Mas, por ora, ele continua usando esse sistema.

A perspectiva de encará-lo numa conversa tão cheia de silêncios prolongados era perturbadora. Eu o cumprimentei e me sentei ao seu lado. Ele me observou com especial atenção quando eu lhe disse que María, uma menina que ele conheceu na Galícia e que tinha recebido o diagnóstico de uma doença semelhante à dele, estava muito bem. Reforçado pela imobilidade do resto de seu corpo, o efeito que produz o olhar de Hawking quando seus olhos claros se fixam sobre os nossos é assombroso: você tem a certeza de estar com ele e de que ele está com você. É um breve instante de comunicação intensa.

MENU No primeiro almoço que tivemos em Santiago de Compostela, veio à tona, devido ao menu, seu gosto pela boa carne. A imobilidade de seu rosto converte o momento da refeição numa situação difícil, e ali se manifesta sua proverbial determinação. Hawking jamais parece fazer uma opção culinária pensando em simplificar a operação de comer. Não se priva de nada. Na Galícia, não deixou de provar nenhum marisco e comeu polvo e crustáceos até se cansar.

Ao falar de comida, foi inevitável que a conversa se voltasse à qualidade da carne argentina. Assim eu soube que não é apenas da carne que ele se recorda ao pensar em meu país mas também do tango. Falei disso com ele ao entrar em sua sala de trabalho. Perguntei se havia algum outro aspecto da Argentina que tivesse chamado sua atenção e ele me respondeu da maneira mais inesperada: "O papa. Sou membro da Pontifícia Academia de Ciências e espero vê-lo na próxima reunião".

Surpreendeu-me o fato de que um agnóstico como ele tivesse optado por essa referência, quando poderia ter recorrido a tantas outras –entre elas, a de uma nova figura, que marcou a física teórica das duas últimas décadas, revolucionando aquele que talvez seja o terreno mais árido do século passado: a busca de um formalismo que compatibilize as duas grandes teorias do século 20, a física quântica e a teoria da relatividade geral.

Aos 45 anos, Juan Martín Maldacena é atualmente membro do prestigiosíssimo Instituto de Estudos Avançados de Princeton, onde Albert Einstein trabalhou –além de ser conselheiro no braço sul-americano do ICTP (Centro Internacional de Física Teórica), com sede na Unesp, em São Paulo.

Hawking o conhece bem porque, em 2003, eles fizeram juntos um trabalho em que convivem a noção de entropia gravitacional introduzida por ele e a chamada conjectura de Maldacena. De modo que poderia ter aludido a ele, em lugar do papa.

Achei interessante perguntar a alguém que viveu a condição de estrela emergente da física teórica sobre outro jovem na mesma situação. A resposta de Hawking foi tão sucinta quanto contundente: "Ele é brilhante. Muito original". Não me atrevi a contar-lhe que em 1999, na conferência anual da teoria das cordas em Potsdam (Alemanha), Maldacena e eu quase o derrubamos quando retornávamos apressados ao banquete da conferência e topamos com ele num corredor do hotel: ao abrir uma porta, foi quase por milagre que conseguimos desviar de sua cadeira de rodas.

MEIA HORA Mais de meia hora tinha transcorrido para que obtivesse essas duas breves respostas.

O sistema de comunicação de Hawking é frágil. No canto superior direito da tela de seu computador há dois quadrados pequenos. O quadrado superior contém as letras do alfabeto. No inferior, há os números e algumas teclas de função.

Quando Hawking começa a escrever uma palavra, abre-se uma janela retangular, colada às outras, com dez palavras sugeridas, numeradas de zero a nove. O sensor preso a seus óculos detecta o único gesto que ele usa no sistema: um movimento do maxilar para a bochecha, que ativa um clique. Como não há sinais distintos para indicar vertical ou horizontal na tela, um cursor executa uma dança perpétua sobre os quadrados: para cima, para baixo, para cima…

Quando ele clica, o cursor se fixa sobre o quadro selecionado e então, devagar, começa a percorrer as linhas distintas. Uma vez escolhida uma linha, percorre cada letra ou símbolo nela. Se há um erro, é preciso esperar que o cursor reinicie a dança para, então, dirigi-lo pacientemente até o ícone que representa a função "apagar".

O modo como Hawking faz questão de escrever corretamente, sem pular uma letra ou um sinal de pontuação, é comovente. Impossível não pensar na preguiça que habitualmente se manifesta em abreviadas mensagens de texto no celular ou nas redes sociais.

Com frequência, devido à degeneração muscular ou ao cansaço, suas pálpebras quase se fecham, em um movimento que ele provavelmente não pode controlar e que em muitas ocasiões causa erros de comunicação. Embora ele tenha alguma liberdade de movimento facial, como arquear as sobrancelhas, seu gestual é limitado. Esses movimentos sutis, quase imperceptíveis para quem não está acostumado, servem, contudo, para que Hawking se comunique com as pessoas mais próximas, para poder concordar ou discordar rapidamente, ou para comunicar-se quando não está em sua cadeira de rodas –por exemplo, quando está na cama. Ali ele também recorre ao método que usava antes de dispor de um computador, o qual é exaustivo só de imaginar: forma palavras reconhecendo letra por letra, em uma cartolina.

Há um momento em que a impressão de rigidez em seu rosto se apaga repentina e explosivamente. É quando ele desenha uma risada. Seus cuidadores, sobretudo os veteranos, conhecem seu senso de humor e captam sua gargalhada com facilidade. Nesses momentos, manifesta-se em toda a plenitude o ser humano que vive nas profundezas de seu corpo imóvel. Por outro lado, sua prostração lhe confere certo ar atemporal. É fácil esquecer que estamos diante de um homem de 72 anos.

Ao lado de Albert Einstein, Galileu Galilei está no altar pessoal de Stephen Hawking. Naquela que provavelmente seja a única concessão que faz ao pensamento mágico, Hawking intui alguma forma de causalidade no fato de ter nascido exatamente 300 anos após o 8 de janeiro de 1642, último dia na vida de Galileu.

Quando, em 2012, o homem que deveria morrer antes dos 25 anos chegou aos 70, a comemoração foi um jantar no imponente refeitório do Trinity College, o mais respeitado da Universidade de Cambridge –entre seus antigos membros, além de 32 Prêmios Nobel, figuram nomes como lorde Byron, Vladimir Nabokov, Bertrand Russell e Ludwig Wittgen- stein. Éramos uns 250 convidados, entre os quais só um envergava o smoking como se fosse uma roupa de todo dia: o ator Daniel Craig, o James Bond. O principal ausente foi o próprio Hawking, que não pôde comparecer por problemas de saúde. Estava ali sua mãe, Isobel, com quem ele manteve uma relação muito estreita até a morte dela, aos 98, em abril passado.

APOSTA Stephen Hawking criou o hábito de fazer apostas com seus colegas a respeito de previsões científicas. Com uma particularidade: se não me engano, ele não ganhou nenhuma. A última é muito recente: foi quando ele apostou que o bóson de Higgs jamais seria encontrado. Em 4 de julho de 2012, o laboratório Cern confirmou a descoberta ocorrida no Grande Colisor de Hádrons (LHC). Hawking rapidamente declarou-se perdedor e pediu o Nobel para Peter Higgs (o britânico de fato veio a partilhar o prêmio com o belga François Englert, em 2013).

Sempre tive a impressão de que ele sistematicamente apostava contra o que julgava mais provável, como se desafiasse a natureza a seguir por um rumo inesperado, levado por sua rebeldia obstinada e seu espírito brincalhão (não seria seu trabalho mais recente uma "boutade", um produto desse espírito?). No caso do bóson de Higgs, por exemplo, parece-me claro que ele, como muitos físicos teóricos, desejava que não fosse encontrado para que o jogo pudesse ser aberto a novas teorias. Comento essa hipótese e, embora ele não me responda, uma gargalhada muda que se desenha em seu rosto parece me dar razão.

CULTURA POP A presença de Hawking na cultura popular é incomum para um cientista, e poderia ser ainda maior se ele fosse alguns anos mais jovem. A julgar pelos bonequinhos que exibe no seu escritório, ele se orgulha muito das participações que fez em episódios de "Os Simpsons", "Jornada nas Estrelas" e, mais recentemente, "The Big Bang Theory".

Seu espírito lúdico é, de fato, extraordinário. Suas palestras sempre têm momentos cheios de graça, dos quais ele desfruta, prolongando seu próprio silêncio para ouvir as risadas do público. Quando, anos atrás, foi recebido pelo prefeito de Santiago de Compostela na praça principal da cidade, depois de percorrer o trecho final do Caminho de Santiago, aceitou sem pensar duas vezes minha sugestão de saudar o prefeito pelo nome, com o único objetivo de ver sua expressão de surpresa.

Enquanto esperava que Hawking respondesse às minhas perguntas, eu contemplava com a respiração contida o esforço titânico que ele fazia.

Quando falam com ele, as pessoas habitualmente ficam a seu lado, olhando para a tela do computador. Assim, em muitas ocasiões a leitura da primeira metade de uma frase já prenuncia seu final. Isso não impede que Hawking continue a lutar contra a adversidade para terminar a frase, sem erros de ortografia.

Lembrei-me do que sua filha, Lucy, tinha me dito: "As pessoas às vezes se esquecem de que meu pai tem uma deficiência grave. Estão tão acostumadas a vê-lo funcionar com a cadeira de rodas e o sintetizador de voz, a dar palestras de forma fluente e com linguagem polida, que esquecem a magnitude da luta e o esforço tremendo que estão por trás disso". Eu não poderia concordar mais.

O denominador comum da vida de Hawking tem sido o tempo. O tempo escasso que lhe deram aos 21 anos; o tempo inicial e o final, aos quais ele dedicou sua carreira científica com tanta paixão; o tempo que não transcorre, que só pode ser vivido no ponto sem retorno dos buracos negros; o da breve história, que revolucionou o conceito da divulgação científica. Os primeiros versos de "Auguries of Innocence", de William Blake, parecem escritos para ele:"Num grão de areia ver o mundo / e numa flor agreste o céu, / reter na mão o infinito / e numa hora a eternidade".

Se podemos chamar de milagrosa a conexão que Hawking, a partir de seu corpo imóvel, tem com o universo formal e abstrato da física, não é menos milagrosa sua preocupação com assuntos sociais que poderíamos supor que lhe fossem alheios ou distantes.

Sua relação com a deficiência física mudou com o passar dos anos. Durante muito tempo, Hawking não queria ser identificado com ela. Uma vez tomada a decisão de concluir seu doutorado, foi como se tivesse dado as costas à sua doença e optado por viver ignorando-a. Desafiando-a.

Quando começou a usar a cadeira de rodas, o cientista deslocava-se pelas ruas de pedra de Cambridge em velocidades temerárias. Em várias ocasiões acabou esparramado no gramado perfeitamente cortado das faculdades, obrigando os transeuntes ocasionais a transgredir as normas que proíbem que os não membros das faculdades pisem na relva, a fim de ajudá-lo a subir na cadeira outra vez.

"Eu nunca quis ter pena de mim mesmo. A deficiência era normalmente vista como algo vergonhoso a ser escondido." Ele negava tão fortemente a sua doença que nem queria ouvir falar das organizações que, nos anos 1980, trabalhavam em prol da integração das pessoas com alguma forma de deficiência.

Como todos que veem Stephen Hawking pela primeira vez, quando o conheci no Chile, em 1997, fiquei impressionado com a dignidade e a força de vontade com que ele levava sua vida adiante. Essa era uma viagem muito especial, pois o último dia da conferência ocorreria na Antártida.

"Quero fazer as coisas da melhor maneira possível. Obviamente, devido à minha deficiência, preciso de ajuda, mas sempre procurei superar as limitações de minha condição e levar a vida mais plena possível. Percorri o mundo até a Antártida e experimentei a ausência de gravidade. Algum dia, quem sabe, eu possa viajar ao espaço. Sou mais feliz hoje que antes de a doença ter se manifestado."

Conforme passaram os anos e aumentou sua dependência de sua equipe de cuidadores e enfermeiras, ao mesmo tempo em que se tornou consciente de sua posição privilegiada, Stephen Hawking converteu-se numa voz de referência na luta pela integração das pessoas com deficiências. Foi assim que, em 2012, aceitou com orgulho o convite para participar da cerimônia de abertura dos Jogos Paraolímpicos de Londres.

"O grande sucesso dos Jogos Paraolímpicos mostrou que os atletas com deficiências são como quaisquer outros atletas e devem ajudar a fazer com que as pessoas com algum tipo de deficiência sejam aceitas pela sociedade. Creio que a ciência deve fazer tudo o que for possível para prevenir ou curar as deficiências. Ninguém quer ser deficiente, se puder evitar. Espero que meu exemplo dê ânimo e esperança a outros que estejam em situações semelhantes, para que nunca desistam."

O compromisso social e político de Hawking pode ser apreciado tanto em suas declarações públicas quanto em seus silêncios escolhidos. Sempre foi defensor aguerrido da saúde pública e da necessidade de investir em pesquisa científica. Define-se ideologicamente como socialista, o que não o impediu de manifestar sua rejeição firme à guerra do Iraque sustentada pelo trabalhista Tony Blair –que ele não parece ter em muita estima.

"O futuro da humanidade e da vida na Terra é muito incerto. Corremos o risco de nos destruirmos graças à cobiça e à estupidez."

Sua sensibilidade ideológica se evidencia também quando ele aborda temas díspares e aparentemente exóticos. "A descoberta de vida extraterrestre inteligente seria o achado científico mais importante da história. Mas seria arriscado tentarmos nos comunicar com civilizações extraterrestres. Se elas decidissem nos visitar, o resultado poderia ser semelhante ao de quando os europeus chegaram à América, algo que não terminou muito bem para os nativos."

CONTROVÉRSIA Em maio de 2013, Hawking se viu envolvido numa controvérsia. Ele havia aceitado participar de uma conferência sobre o fator humano na formação do futuro, organizada em Jerusalém em homenagem ao presidente de Israel, Shimon Peres.

No entanto, um mês e meio antes do evento ele enviou uma carta breve e discreta aos organizadores, anunciando que, após ter consultado cientistas palestinos que havia conhecido em 2006, durante uma viagem a Ramallah, tinha desistido de participar.

De algum maneira, a carta chegou ao Comitê Britânico para as Universidades da Palestina (Bricup), de onde vazou para a imprensa; o movimento Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) apressou-se a declarar que o cientista tinha aderido à sua causa.

A missiva sucinta e respeitosa de Hawking terminava dizendo: "Se eu participasse, expressaria minha opinião de que a política do governo atual de Israel provavelmente vai conduzir ao desastre".

Tratando-se de um tema delicado para a opinião pública internacional, as críticas se intensificaram de imediato. Para piorar as coisas, num primeiro momento a Universidade de Cambridge declarou que Hawking não viajaria a Israel por problemas de saúde; horas depois, foi obrigada a se desdizer, deixando no ar a sensação de que tinha tentado ocultar a realidade.

Ninguém se deu ao trabalho de ler a declaração de Hawking e enxergá-la no contexto do pacifismo militante de alguém que já visitou Israel em outras ocasiões, recebeu a distinção científica máxima desse país, o Prêmio Wolf, e mantém vínculos estreitos com seus pesquisadores. Alguém que de maneira alguma aderiria a boicotes como os promovidos pelo BDS, que são uma negação total do diálogo.

O cientista dedicou 45 minutos de esforço comovente para me explicar sua posição; definitivamente, ele procurava contribuir com um grão de areia para o restabelecimento do diálogo entre as partes.

"Eu ia a Israel com a condição de poder dar uma conferência na Cisjordânia, porque sinto que as universidades palestinas necessitam de contatos com o exterior, mas todos os acadêmicos palestinos me disseram que eu deveria respaldar o boicote. Senti não ter ido", disse. "Se tivesse ido, teria dito que Israel precisa dialogar com os palestinos e com o Hamas, como a Grã-Bretanha fez com o IRA. Não se faz a paz falando com os amigos, mas com os inimigos. Estou satisfeito pelo fato de as conversações de paz estarem sendo retomadas. Se isso tivesse acontecido antes, teria ido a Israel."

CAVALEIRO Chama a atenção o fato de um inglês da envergadura acadêmica de Stephen Hawking ainda não ter sido nomeado cavaleiro. Todos os cientistas britânicos de seu nível já o foram, incluindo Roger Penrose, com quem ele compartiu muitas honrarias. Há outra exceção notável: Peter Higgs. É inimaginável que isso não lhes tenha sido oferecido.

Não creio que em qualquer dos dois casos se trate de uma posição antimonárquica, já que ambos foram laureados Companheiros de Honra pela rainha Elizabeth 2ª e aceitaram a distinção.

A oferta do título de cavaleiro costuma ser levada aos candidatos por um intermediário, que deve apresentar as razões que a motivam. Hawking e Higgs são homens de princípios, que não hesitariam em recusar uma distinção se a julgassem em desacordo com seus méritos pessoais ou se a oferta lhes chegasse por um emissário que achassem inapropriado. Se a rainha da Inglaterra lê a Folha, eu a incentivo a tentar outra vez.

Antes de nos despedirmos, vamos à Potter Room para fazer as últimas fotos. Esse salão é o ponto nevrálgico do Departamento de Matemática Aplicada e Física Teórica, onde acontecem os debates, os seminários, as conferências e até os obrigatórios chás das cinco. A presença de Hawking na Potter Room já foi imortalizada em um busto –última obra do escultor inglês Ian Walters, morto em 2006.

As lâmpadas estão apagadas, e as janelas laterais produzem um jogo de luz e sombras que conferem realidade à estátua e irrealidade ao Hawking verdadeiro, que parece muito à vontade posando e se divertindo com os comentários que, com frequência crescente, geram seu sorriso franco e o olhar atento. Depois as vozes se calam, os olhares se cruzam pela última vez, e a confusão dos corredores e seu labirinto volta a tomar conta de nossos passos.

06/01/2014

Nove dias em Havana

Filed under: Cuba,Cubanos — Gilmar Crestani @ 10:44 pm
Tags:

cuba

É longo mas vale a pena ser lido.

Nove dias em Havana, por zegomes

seg, 06/01/2014 – 14:46 – Atualizado em 06/01/2014 – 17:10

Nove dias em Havana

Por zegomes

Nove dias comendo lagosta quase de graça.

De como, em Cuba, lembrei-me de Pinheirinho.

Eu e meus amigos fomos a Cuba. Estivemos zanzando em Havana de 1º a 09 de novembro/2013. Era uma velha ideia, minha e de meu amigo Salém e sua esposa Alice, sempre adiada. Em fevereiro/2013 disse pra meu parceiro Cássio: Vamos a Cuba em novembro, depois que você terminar a obra? Cássio, que vive no mundo da construção civil e das coisas práticas, respondeu-me: Onde fica isso? Vamos.

PREPARATIVOS PARA A VIAGEM

Decididos a viajar em novembro, passei a pesquisar as passagens na internet. A Cubana de Aviación sai de São Paulo em voo direto para Havana. Copa Airlines sai de várias cidades centro-norte e sul-americanas, entre elas Brasília, em voo internacional com conexão na Cidade do Panamá (Humm… desovam multidões de viajantes no aeroporto do Panamá, que é um imenso shopping, será se fizeram isso de propósito, será? As cucarachas não são bem vindas, mas o dinheirinho delas sim, recolhido lá longe, será se é isso?). Escolhi a Copa pela comodidade de sair direto de casa sem ter de dar a volta por São Paulo. Mais do que na hora de se quebrar esse monopólio das partidas internacionais serem centralizadas no Rio e São Paulo.

Compradas as passagens, comuniquei meus amigos Salém e Alice em Goiânia: Eu e Cássio já compramos as passagens para 01º de novembro. Vamos ou vão adiar mais uma vez? Responderam: Então agora é assim, vem comunicar já com as passagens compradas… É assim, sim, respondi, o sistema agora, como alguns dizem, é estilo Coréia do Norte (Dizem, às vezes, também  sistema Cuba, mas nessa situação, é melhor dizer sistema Coréia do Norte, afinal estamos namorando Cuba). Estamos avisando com oito meses de antecedência, não podem reclamar.

Dia seguinte ligaram: podemos convidar também o Cario e a Hilda? Claro.

Salém, Cario e eu somos de uma mesma turma do curso de medicina da Universidade Federal de Goiás, nos formamos no início dos anos 80, há mais de trinta anos. Depois disso nunca mais tinha visto o Cario, que se especializou em anestesiologia e foi trabalhar no interior de Goiás. Com Salém a relação continuou próxima, mesmo quando ele passou uns anos na França, se especializando em psiquiatria com foco na recuperação de dependentes químicos. Não é só um grande especialista, mas um ser humano raro. Feliz de quem é seu paciente e feliz de quem (como eu), teve a sorte de cruzar com ele e adquirir sua amizade. É a pessoa mais rica em “alteridade” que conheço. Quê? Alguém não conhece essa palavra chiquérrima? Bem, melhor é perguntar se alguém conhece, pois certo mesmo é que só os filósofos a usam com desenvoltura. Fui apresentado a ela recentemente, num texto escrito por um amigo filósofo em um Blog. À medida que eu lia o texto ia me parecendo que a palavra era usada no sentido mais ou menos assim de “ver o lado do outro”, “compreender a situação do outro”. Mas não acreditei que palavra tão… tão… como se pode dizer, tão refinada, pudesse significar coisinha tão trivial. Mas era isso mesmo. Fui ao dicionário de filosofia e constatei. Um dos significados da palavra é esse: ver o lado do outro, se por na condição do outro. Então posso dizer: Salém é a alteridade em pessoa. É a melhor definição que se pode dar dele.

Estava formada a nossa equipe de viagem: Salém, Cario, suas esposas Alice e Hilda, Cássio e eu.   “Éramos Seis”  rumo a Cuba.

O QUE A INTERNET E OS GUIAS RECOMENDAM

Após a pesquisa das passagens, passamos a buscar outras informações. Alice é boa pesquisadora. A internet e os guias Lonely Planet Cuba e Guia Visual Publifolha Cuba foram nossas fontes.

Descobrimos:

Poderíamos nos hospedar em hotéis ou em casas de família, com diferenças grandes de preço. Escolhemos a Casa de Agustina no centro da cidade. Quem quiser fazer contato com ela é só jogar no Google: Casa de Agustina Centro Habana calle Neptuno con Industria e localizar seu e-mail. Ela também tem página no Facebook.   Salém e Alice optaram por ficar lá os nove dias. Eu e Cássio quisemos passar dois dias em um hotel cinco estrelas, o Hotel Nacional. Cario e Hilda, talvez por serem também empresários do agronegócio, cheios da alta grana, com fazenda e granjas no rico sudoeste de Goiás, optaram somente por hotel. Moradores do interior, não se comunicaram adequadamente conosco. Escolheram pela internet um hotel na Praça da Revolução e se hospedaram muito longe de nós e dos buchichos da cidade. Arrependeram-se. Tínhamos reservado para eles uma casa de família vizinha à de Dona Agustina, por indicação desta, já que ela dispõe apenas de dois quartos. Tivemos de desmarcar. Eles justificaram a preferência por hotel pelo fato de “fumarem muito e soltarem muito pum”. Ficariam constrangidos em casa de família.

Deveríamos providenciar a Tarjeta de Turista, uma espécie de visto para Cuba. Pode ser emitida no próprio check in pela Copa Airlines ou em Consulados de Cuba. Eu e Cássio fomos à Embaixada em Brasília. Cuba emite essa Tarjeta em uma folha à parte, sem carimbos no passaporte, justamente para evitar que o turista tenha problemas depois, sofra discriminação, em eventual viagem aos EUA.

Deveríamos ter um certificado internacional de vacina contra febre amarela. Cuba não exige, mas o Panamá sim, e como se passa duas horas, tanto na ida como na volta, no Shopping do Panamá (aquilo é um shopping, não um aeroporto), é necessário levar, pois pode ser exigido.

Deveríamos levar sempre algum papel higiênico. Verdade. Fora dos hotéis é um produto não disponível em locais públicos. Nem mesmo nos banheiros do Aeroporto José Marti, limpíssimos, modernos, encontra-se esse importante produto.

Aconselhável levar euros em vez de dólar. Verdade. Cuba impõe uma sobretaxa cambial sobre o dólar e com isso perde-se um pouco.

É necessário um seguro saúde para o período da viagem. O Cônsul cubano em Brasília nos disse que poderíamos fazer isso no aeroporto em Havana, mas a Copa Airlines asseverou-nos que sem ele não embarcaríamos em Brasília, pois era exigido no check in. Então o adquirimos aqui mesmo. Ao final, em nenhum momento da viagem alguém nos pediu comprovante de seguro saúde ou de vacina contra febre amarela. Nem no Shopping do Panamá, nem em Cuba.

CHEGADA A HAVANA

Após pegarmos nossa bagagem na esteira, nos dirigimos à saída do aeroporto. Conosco não houve revista de bagagens. No portão principal, tanto à direita como à esquerda há balcões onde você pode trocar o seu dinheiro por Cucs. Há filas. Aqui a primeira surpresa linguística: fila, em Cuba, se chama fila mesmo e não cola, como consta nos manuais de conversação em espanhol.

Ao trocar o dinheiro, deve-se fazer um cálculo aproximado de quanto se pretende gastar no país. No momento ainda há o sistema de dois câmbios, embora isso deva mudar logo, segundo os planos da área econômica do governo e as mudanças planejadas pela equipe de Raul Castro. Há os Pesos Conversíveis (Cucs) para estrangeiros (1 Cuc = 2,5 Reais) e os  Pesos Cubanos ou Moeda Nacional (1 Real = 60 Pesos Cubanos) que são a moeda de troca entre os cubanos.

Se o turista trocar dinheiro demais em Cucs e não gastá-los todos em Cuba, no retorno, no aeroporto, há um local, no segundo andar, onde pode trocar de volta por dólares ou euros. Não precisamos fazer isso porque administramos bem as trocas cambiais de modo que nossos últimos Cucs utilizamos para comprar algumas coisas no próprio aeroporto, na volta: Rum Santiago de Cuba Añejo, Rum Havana Club, camisetas, artesanato, etc.

Sempre importante lembrar-se de reservar 25 Cucs para pagar a taxa de embarque no retorno.  

Após o câmbio, a busca por transporte para o centro de Havana. Aqui a segunda surpresa linguística: ônibus, em Cuba, se chama ômnibus mesmo, com um “m” a mais, e não autobus, como está nos manuais de espanhol. Diz-se também popularmente guagua, com o mesmo sentido de ônibus.

Deve-se esquecer os ônibus, há abundância de táxis (automóveis, vans, etc.). Combina-se o preço antes, informando o endereço (dirección) aonde se vai. Pagamos 30 Cucs por uma van, mais 5 de gorjeta. Não esqueça que o nome de gorjeta em espanhol é propina. Portanto, se disser “una propina para usted” receberá em retorno um largo sorriso de agradecimento e não uma cara encabulada!  Com propina e tudo, saiu a R$ 12,50 por pessoa a viagem até o centro de Havana, esquina da rua Indústria com Neptuno, onde fica o apartamento de Dona Agustina. Muito barato, pela distância. Antes, tínhamos deixado Cario e Hilda em seu hotel na Praça da Revolução (longe, longe de tudo, longe do mar! Uma infeliz escolha dos dois).

Após nos acomodarmos, Dona Agustina começou a nos dar alguns conselhos sobre a vida na Cidade de Havana (Isso não teríamos em nenhum hotel, Salém tem razão). Disse: Aqui em Havana não precisam ter medo de serem assaltados com arma de fogo ou facas. Esse tipo de violência não temos aqui (percebia-se um pouco de orgulho em sua voz), mas devem tomar cuidado para não ostentar correntes de ouro ou abrir carteiras recheadas de dinheiro em público. Pode acontecer de um “negrito” (Até em Cuba os negros são os culpados!) aparecer e zás – Fazia um movimento com a mão de quem estava arrancando de supetão a corrente do pescoço.

Dona Agustina jura que em Cuba ninguém passa fome, todos têm acesso à saúde e educação e todos (essa é mais raro de ouvir falar) têm acesso à moradia. Quando o morador não é dono do imóvel, paga um aluguel baixíssimo ao governo. Ela nos dizia isso num contexto de recomendação a que não ficássemos dando nosso dinheiro a qualquer um que aparecesse (jinetero): Aqui em Cuba ninguém passa fome (portanto não fiquem caindo na lábia dos jineteros e dando dinheiro para eles).

Afirmou também que é calúnia dizer que Cuba é comunista e que é uma ditadura. Nada disso. E que são chamados de gusanos (vermes) esses cubanos que se dedicam, a partir dos Estados Unidos, a difamar a pátria. Eles não têm amor à pátria.  É um doce, a velhinha.

PASSEANDO EM HAVANA. CUIDADO: OS JINETEROS!!!

Andar nas ruas de Havana exige apenas um pequeno cuidado: se você não gosta de assédio, não peça informações. Consulte o seu guia, solitário, e vá em frente. Será incomodado apenas pelos taxistas dos bicitáxis e cocotáxis que a cada instante oferecem uma corrida a 3 Cucs ou 05 Cucs, dependendo se eles interpretam a sua figura como mais ou menos endinheirado.

Agora, se você abordar alguém para pedir uma informação pode correr o risco, ainda mais se estiver em área turística (pois nem tudo na cidade, lógico, é zona turística), de se dirigir justamente a um jinetero. Ele não só dará as informações como fará questão de te acompanhar e se torna um grude (para quem está solitário e quer companhia pode ser maravilhoso).

Os Guias nos passam a impressão de que “jinetero” são aqueles vendedores molestos, sempre presentes em locais turísticos, que oferecem de tudo e são insistentes. Em Cuba jinetero é isso mesmo (quer levá-lo “ao melhor” restaurante, quer buscar prá você “os melhores” charutos, etc.), mas… Como o jinetero oferece todo tipo de serviços, pode oferecer também os serviços sexuais, e parece que o sentido da palavra está cada vez mais resvalando para “prostituto”.  Se usado no feminino, “jinetera”, o sentido é 100% prostituta. Garoto de programa é chamado de “pinguero”, mas, cada vez mais, “jinetero” se aproxima do sentido de “pinguero”.  Por isso, é uma palavra a ser usada com cuidado.

Tudo bem. Em Salvador os vendedores assediam para vender fitinhas do Senhor do Bomfim. Em Havana os jineteros querem nos arrastar para pequenas armadilhas de consumo.

Saímos para almoçar. Nós seis. Pesquisamos no Guia e fomos a um restaurante na Rua Campanário. Estava fechado. Havia algumas pessoas sentadas nas calçadas, em frente a seus prédios (muito comum, em Centro Habana. Como aquelas pessoas de cidades pequenas, do interior, que se postam em suas cadeiras de balanço, à tardezinha, vendo a vida passar e fofocando). Disseram-nos: Está fechado porque não pagaram os impostos. De repente, do nada, apareceram em nossa frente dois rapazes. Ambos negros. Um, muito bonito e falante, Pablo. Outro, quase gordinho, meio estrábico, tímido, Michel.

O falante Pablo, com verve de malandro carioca das antigas, disse que ia nos levar a um restaurante especial e pedia que nós os seguíssemos, já andando. Vira esquina e vira esquina e nós atrás de Pablo, eu parei e disse para os meus companheiros: Se quiserem, vamos embora. Pode ser alguma armadilha e eu não quero ser o culpado. Então Salém (sempre Salém, compreensivo com as “classes populares”) disse: Que pode nos acontecer? São 13hs, a rua está cheia de gente, vamos lá ver em que isso vai dar. Continuamos.

Pablo, enfim, entrou em um Paladar, que é um restaurante particular. Eu dei cinco Cucs para cada um e disse adeus, na esperança de que fossem embora. Nos sentamos. Comida e bebida caras. Os dois sentaram juntos, porque Alice convidara. Falei baixinho pra Alice que eu já tinha dado a gorjeta deles e que devia ser uma coisa ou outra: ou a gorjeta ou a comida. Mas falei por falar, dando o caso por encerrado, porque ninguém seria grosseiro a ponto de escorraçá-los da mesa. Para minha surpresa, Alice tomou a gorjeta deles. E os dois almoçaram conosco.

Percebemos que os jineteros usam uma tática espertinha. Eles levam os turistas para bares ou restaurantes e recebem comissões desses locais. Cássio viu quando Pablo recebeu sua comissão do proprietário. Consequentemente as comidas e bebidas são mais caras.

Pablo e Michel são universitários. Estudam turismo na Universidade de Havana. Tão logo acabamos a refeição e estávamos ainda bebericando rum, Pablo se propôs a adquirir os melhores charutos para nós. Principiou uma negociação com Cario. Deleguei a função de negociador a Cássio.

Cássio se gaba de ser bom de catira. Não sei se essa palavra é nacional. Em Goiás e Minas ela é uma dança. Pelo menos de Goiás prá cima (Tocantins, Piauí, Maranhão) significa também negócio, rolo, gambira, troca-troca ou venda de coisas novas ou usadas entre particulares. Bem, Cássio Bom de Catira foi delegado por mim para negociar com o esperto Pablo algumas caixas de charutos Monte Cristo e Cohyba.   Só o fiz porque Cario estava junto, negociando os charutos dele, e entendia bem o espanhol. Acho que Cássio nunca tinha ouvido antes alguém falar espanhol, mas, pelo que ouvi de longe, os três se entenderam bem, negociando preços, descontos, etc. Quando chegamos em casa descobrimos, por Dona Agustina, que havíamos perdido 20 Cucs em cada caixa comprada. Ela tinha um sobrinho que fornecia a preços menores. Só Salém e Alice ainda não tinham comprado e se deram bem. Lamentações de nossa parte. Cássio, consternado em ter sido passado para trás e arranhado sua fama de catireiro que nunca sai perdendo, arrumou a desculpa de que não entendia bem o que Pablo falava. Pode ser, Cássio, mas seu desempenho me fez lembrar de Seu Percival, pai de Salém, que gosta de alertar sempre, em suas conversas: touro que sai de sua terra pode ter que virar vaca (em outras terras). Acho que ele diz isso para meter medo nos filhos e mantê-los em Goiás, sob suas asas. Velhinho esperto.

Pois é. Jinetero é isso. A maneira quase inocente da turma de Cuba se virar com esses turistas endinheirados, cheios de dólares, que aparecem por lá. Como Dona Agustina falou (e outros cubanos também nos confirmaram), sem navalhas, sem tiros. Meu amigo Salém, especialista em alteridade, como já sabemos, compreensivo com a situação do outro, pode falar: deixem o vendedor de fitinha em Salvador e o jinetero em Havana ganharem a vida deles. Já basta o que eles têm de suportar de turista mal-humorado e pão-duro!

AS SANTAS INOCENTES

Dois dias após o episódio Pablo, nós já havíamos descoberto que o lugar de comer e beber, para quem está em Centro Habana ou Habana Vieja, é o Restaurante Hanói.

Mas, as santas inocentes Alice e Hilda ainda não haviam aprendido a lição.

Cansados das andanças da manhã, Salém, Cássio e eu ficamos descansando em casa à tarde, após o almoço. Alice e Hilda saíram, arrastando Cario. Duas horas depois ligam para Dona Agustina: que nós devíamos ir urgente para onde estavam, que o músico Amaranthos, do grupo Buena Vista Social Club (sic) estava dando uma canja no bar, que à noite haveria show mas só pra quem já tinha ingresso, que era imperdível, etc. Fomos correndo. Quem há de perder uma canja do Buena Vista?

Chegando lá, foi fácil perceber o que estava acontecendo. Nossos colegas estavam numa mesa com um casal de universitários (Jineteros? Sim.). Estavam quase bêbados, todos. Os “universitários” pediam um mojito atrás do outro. Mojito a 6 Cucs  (15 reais). Os jovens cubanos eram especialmente adocicados, fazendo aquele estilo “você é endinheirado mas cheio de problemas, de solidão. Nós estamos aqui para contagiar você com nossa alegria”.

A conta aparentemente já ia longe. Pedi dois mojitos, para mim e Cássio. Horríveis. Faltava alguma coisa naquilo.

De repente apareceu uma terceira personagem na história. Uma moça de feições orientais estava recostada no balcão atrás de nossa mesa. Vi quando os “universitários” mandaram o garçom servir um mojito para “La China” (por nossa conta, lógico).

Para quem não sabe (como eu não sabia), no fim da escravidão em Cuba, no final do século XIX, a Casa Grande cubana, da mesma forma que a brasileira, teve a idéia de importar estrangeiros para o trabalho. Enquanto aqui os imigrantes foram europeus, em Cuba foram chineses. Por isso, a porcentagem da população de origem chinesa lá é relativamente grande. E comeram o pão que o diabo amassou.

La China vestia uma calça legging, justíssima. Recostava no balcão, empinava a bunda, requebrava um pouquinho e, por cima do ombro, olhava para trás, para Cássio.

Sabedor de como Cássio tem total obsessão por traseiros (não importa de quem) senti que a batalha, naquele momento, estava perdida. Olhei para ele: estava transfigurado.

THAT OLE DEVIL CALLED LOVE

Todos os amantes já passaram por isso (ah, confessem!), quando flagram o amor mirando uma pessoa bonita que passa, ou que está próxima, com o olhar cheio de desejo. As mulheres costumam arrancar os cabelos, ou aumentam suas visitas ao cabelereiro para se enfeitarem mais, algumas, mais dramáticas, falam em tomar veneno. Alguns homens pensam em pegar numa arma. Ninguém fica indiferente. Pode-se reagir educadamente, friamente, mas não com indiferença.

Tentei racionalizar. Tinha de sair imediatamente daquele local. Com ou sem Cássio. Primeiro, porque eu sabia que uma tragédia se aproximava: o valor daquela conta de bar. E sentia muita vontade de deixar as Santas Inocentes administrarem, sozinhas, a encrenca que elas criaram.  Segundo, mesmo deixando Cássio lá, em estado de transe, eu tinha certeza que nada ia se passar, a não ser um diminuto momento de ilusão. Raciocinei: La China certamente é puta, vai cobrar. Cássio não gosta de puta, nem porta dinheiro suficiente para bancá-la. Quando servia o exército, em Brasília, jovem e bonito, saiu com uma puta do Conic. Na prestação do serviço, a senhorita, apressada e mal-humorada, gritava: Anda rápido, desgraçado, rápido, tenho mais o que fazer. Cássio não conseguiu. Ficou traumatizado para sempre com essa classe.

Coloquei 20 Cucs na mão de Cássio (para pagar nossos mojitos) e falei baixinho: Vamos embora, isso aqui é uma armadilha…

Irritado por eu ter interrompido sua hipnose, Cássio foi grosso, falou alto, pra todos ouvirem: Prá você tudo é armadilha.

Era tudo que eu precisava. Fiz biquinho, fiz beicinho. Peguei o CD que acabara de comprar do Amaranthos (que nunca pertenceu ao Buena Vista, tenho certeza). Levantei-me e fui. Hilda ainda me alcançou na porta. Mostrei-me muito “magoado” por causa de La China.

As mulheres, nessas horas, são solidárias. As mulheres e os gays… São mestres na arte da chantagem emocional.  

Pena que não consegui forjar “una furtiva lacrima”, para dar mais realismo à tragicomédia romântica.

QUANDO AS MARGARIDAS FENECEM

Saí. Passei na Bodeguita del Medio, estava superlotada. Continuei até o calçadão da Baía de Havana e caminhei em direção ao Malecón –onde a Baía encontra o mar aberto do chamado Estreito da Flórida-.

No Malecón ficam os rapazes “de vida fácil”. Sabia disso. Cheguei até a pensar: se rolar, dou o troco em Cássio.

Caminhava lentamente, ainda no calçadão da Baía. Um homem passou por mim, cruzamos os olhares. Achei muito demorado o seu olhar sobre mim. Meu radar detector de situações perigosas, bem treinado num lugar chamado Brasil, disparou sinais.

Não olhei para trás.

De duas uma, pensei: Ou é um estudo prévio para um assalto, já que um turista desgarrado é uma presa perfeita. Ou é uma paquera –por dinheiro, claro-. Só um lunático, aos cinquenta e quatro anos, vai pensar que alguém baixa o seu olhar sobre ele pela sua simpatia ou sua beleza (perdida, ou pior, nunca possuída). Até as divas alcançam um ponto da vida em que veem, com tristeza, seu poder de sedução desmoronar. Jane Fonda falou, numa entrevista, que, após os cinquenta, se sentiu paulatinamente mais invisível. Betty Faria afirma que, a partir dos sessenta, aprendeu a valorizar quem sorri para ela. Formas poéticas para nos contarem que a idade e o tempo nos levam, de forma irremediável, para o vasto território da solidão.  

De repente alguém emparelhou comigo. Era o homem. Meu radar disparou sinais alucinadamente.  Estávamos no largo onde se encontram o calçadão da Baía com o Malecón. Muitas plantas. Ótimo lugar para um assalto atrás de um arbusto.

Ô meu deus, tenho certeza que vou ser assaltado. Como naquele domingo de 1996, quando, só eu sei o que passei, peguei um buzu em Copacabana, eu e um colega, para a rodoviária Novo Rio, pleno meio dia, para regressar a São Paulo, depois do feriado da semana santa. Só eu sei o que passei. Dona Agustina não falou a verdade, o homem vai me assaltar.

Porém não. Tudo paranoia. O cubano perguntou-me se, a partir de meu país –nem perguntou qual era-, eu não o ajudaria a importar medicamentos para sua filha doente. Compreendi, aliviado, que devia ser mais uma variante dos golpes ingênuos –sem revólver ou faca- praticados pelos cubanos chamados de jineteros. Havia lido alguma coisa sobre esse truque na internet.

Apressei o passo e disse, sem voltar-me: Cuba não necessita de que lhe mandem medicamentos ou médicos. Pelo contrário.

Ainda ouvi sua resposta, com um toque de raiva na voz: É claro que necessita, tu bem sabes do bloqueio.

Desisti de andar pelo Malecón, atravessei a rua e fui cair numa avenida, estilo boulevard, belíssima: o Passeio de Marti ou Passeio do Prado. Arcadas lindíssimas fazem um longo corredor.  Em ruínas, mas, mesmo assim, impressionantes.

Voltei pra casa. Contei a história da La China para Dona Agustina, que quase morre de tanto rir (da desgraça alheia). Tomei uns goles de rum Santiago de Cuba Añejo. Descansei um pouco das emoções. Dormi. Às oito e meia resolvi ir jantar no Restaurante Hanói.

Chegando lá fui recebido pelos gritos de meus companheiros. Estavam bêbados e cansados. Tinham se perdido no caminho para o Hanói. Não conseguiam encontrar o local. Alguns tiveram de mijar na rua. A conta chegara perto de 500 reais. La China pedira 50 Cucs (125 reais) para Cássio pelo programa. Pedi minha lagosta e meu daiquiri de goiaba. Todos me tratavam com alguma deferência. O que uma pequena chantagem emocional bem elaborada não provoca: As mulheres e os gays são mestres nessa arte.

MELHOR LOCALIZAÇÃO PARA SE HOSPEDAR

O melhor lugar para se hospedar em Havana é ao redor do Parque Central. Porque a partir daí dá para alcançar a pé a quase todos os objetivos turísticos (e não turísticos). O Parque Central não é um parque, mas uma praça. Fica ao lado do Capitólio, que é uma réplica (dizem que alguns metros maior) do de Washington.

De um lado do Parque sai a Calle Obispo que é a principal rua de Havana Velha, uma pequena artéria comercial. Ao final dela está a Plaza de Armas, onde há muitos bares e restaurantes, edifícios antigos da Havana colonial, uma feira permanente de livros usados e a Baía de Havana.

Do outro lado do Parque, na direção contrária, sai a Calle San Rafael que atravessa toda a região chamada de Centro Habana e vai terminar em Vedado, perto da Universidade de La Habana e do Hotel Nacional.

Ao redor do Parque Central ficam vários hotéis: O Hotel Inglaterra, o mais antigo de Havana; Hotel Telégrafo; Hotel NH Parque Central e Hotel Plaza. Uma quadra afastado fica o Hotel Sevilha.

Se a intenção é ficar em casa de família, pelo preço ou pela acolhida familiar, A Casa de Agustina, onde ficamos é localizada perto do Parque Central.

Grande roubada é ficar no bairro chique chamado Miramar porque é longe de tudo. Os hotéis de luxo que ficam em Vedado, como o Meliá, também ficam longe.

Carlo e Hilda reservaram, antes da viagem, um hotel na Praça da Revolução. Também é uma má escolha. É longe. Não existem atrações por perto.

Salém adorou ter ficado na casa de Dona Agustina, disse que foi a melhor coisa da viagem. Quando chegamos lá me decepcionei um pouco. Por e-mail ela me garantira que cada quarto tinha um banheiro. Não era verdade. Era um banheiro compartilhado para os dois quartos. Questionei. A velhinha se fez de desentendida. “Aca en Cuba las casas de baños son conpartidas…”. Salém só faltou me mandar calar a boca, com dó do aperto da velhinha, apavorada com a possibilidade de perder os hóspedes. Dizia: calma, calma, não se precipite. Ah, Salém, e sua alteridade!

Cássio e eu ficamos sete dias com Dona Agustina e dois dias no Hotel Nacional (cinco estrelas) como havíamos planejado.

Dona Agustina aluga dois quartos num pequeno apartamento. Camas boas, limpeza dez, com ar condicionado. Fica no quarto andar de um prédio com elevador (pré-revolução?) na esquina da Rua Indústria com Rua Neptuno. Essas ruas do centro de Havana são estreitas, dificilmente passaria por elas um ônibus, por exemplo. O transporte público é feito pelos chamados táxi-ruta, que são táxis lotação e funcionam como pequenos ônibus. De nossa janela ficávamos observando logo cedo esses automóveis passarem na Rua Neptuno, cada um mais lindo que os outros e antiqüíssimos (Quem sabe a idade daquelas coisas?) Fenomenal, como são lindos os automóveis antigos de Havana e de uma variedade enorme.  De vez em quando apareciam também uns Ladinhas (Lada soviético) feios, mas são minoria.

Outra cena constante e chamativa que tínhamos de nossa janela era a dos cachorros nos terraços dos prédios vizinhos. Parece que os donos saíam para trabalhar e eles ficavam nos terraços daqueles prédios quase em ruínas. Vimos, com o coração nas mãos, alguns pularem os parapeitos e, equilibrando-se perigosamente nas muretas, ficarem observando a rua lá embaixo.

A vastidão de prédios do Centro de Havana, todos em aparente ruína e caindo aos pedaços é impressionante. Cássio, com seu olhar de pedreiro e construtor comentou: Se não recuperarem esses prédios, em vinte anos estarão todos no chão. E essas cerâmicas e rebocos artesanais desgrudando das fachadas são um perigo para os passantes lá embaixo na rua.  Tive um calafrio de pavor. Um pedaço de barro desses, caindo de tão grande altura, se acerta alguém significa morte ou invalidez.

Esses prédios detonados estão apenas em uma região da cidade chamada de Centro Habana e Prado. Havana Velha, que é ligada a Centro Habana de um lado, é Patrimônio da Humanidade e é preservada. Vedado, que se liga a Centro Habana pelo outro lado, se parece com qualquer cidade brasileira, com ruas largas, arborização, alguns arranha-céus, casas bem conservadas. O espetáculo das ruínas é só em Centro Habana. 

Dona Agustina cobra a diária de 20 Cucs (cinqüenta reais) pelo quarto para duas pessoas. O café da manhã é à parte e custa 3 Cucs (7,5 reais): Uma xícara de café com leite (eu disse uma), um copo de suco de fruta natural, uma fruta, pão, manteiga, queijo e um pedaço de presunto frito ou ovo. O cardápio não muda, mas não é de todo ruim.

DE COMO PASSAR NOVE DIAS COMENDO LAGOSTA

Uma coisa intrigante nos restaurantes de Havana é a ausência de carne bovina nas opções das cartas de menu. Com exceção de um prato chamado “Ropa Vieja” que é uma espécie de carne de gado desfiada no arroz. Filet Mignon, picanha, etc. essas coisas são ausentes.   A possível resposta para o fato apareceu no Blog do Nassif, no post da estudante da Universidade Federal de Santa Catarina, que passou alguns meses em Cuba, em viagem oficial de estudo. Ela afirma que o gado bovino no país é reservado para a produção de leite (o leite das crianças?).

Em compensação, lagosta, camarão, pescados, porco e frango não faltam nos cardápios.

Após apanharmos um pouco com os jineteros, nos primeiros dias na cidade, aprendemos alguma coisa:

Lugar para tomar café, chá, leite, com bolos, pães, etc. é a Cafeteria Francesa. Fica no Parque Central, ao lado do Hotel Inglaterra.

O Restaurante Hanói oferece comida deliciosa, farta, barata. Um prato de lagosta –enorme- com arroz e outra guarnição custa 12 Cucs (30 reais). O mojito custa 1,5 Cucs (Na Bodeguita é 5 Cucs) e o daiquiri (maravilhoso) apenas 2 Cucs (No Floridita é 7 Cucs).  Fica na esquina da Rua Brasil com Bernaza, numa pracinha chamada Santo Cristo. A Rua Brasil é a que sai exatamente da frente do Capitólio.

Daiquiri é um drink internacional, conhecidíssimo. Eu, porém, nunca tinha nem visto nem provado. É uma espécie de vitamina de fruta na qual se mistura rum e gelo moído ou batido no liquidificador. Colocam tanto gelo que fica semelhante a um sorvete na taça. Vários sabores de frutas. O de goiaba do Restaurante Hanói ficou sendo o meu preferido. Simplesmente delicioso.

Para quem está em Vedado, o Restaurante La Roca, perto do Hotel Nacional, serve uma paella por 12 Cucs, com camarão, lagosta, frango e carne de porco. Dizem eles que é para duas pessoas, mas é para quatro, tal o tamanho da travessa de comida. Deliciosa. Cometi a bobagem de pedir um daiquiri de morango. Horrível. Parecia feito com ki suco. Não me animei a pedir um outro sabor para ver se os daiquiris do La Roca se salvavam. É sempre mais seguro pedir um sabor de fruta da época. Há muitas barracas e carrinhos de frutas nas ruas de Havana. Em nenhuma delas, nesse início de novembro de 2013, faltava banana, goiaba, limão, mamão ou abacaxi. E os melhores daiquiris do Hanói eram justamente os de goiaba, abacaxi e limão. Certamente feitos da polpa fresca. Onde os cubanos iriam encontrar morango fresco, fora de época, com essas dificuldades que eles sofrem para comerciar? Devem colocar algum xarope de morango na bebida. O resultado é triste. No Hanói, os garçons, mais sinceros, diziam que morango estava em falta. Zelam, com certeza, pela qualidade do seu daiquiri de dois Cucs, que eles afirmam, com orgulho, ser melhor que o do Floridita, de sete Cucs, e eu confirmo: é impossível haver uma coisa melhor que aquilo.

O La Roca é sempre cheio, no almoço e no jantar. Após as nove da noite geralmente há shows, então se alguém pretende apenas jantar sossegado, é melhor chegar mais cedo, antes das nove.

Pertinho do La Roca está o El conejito (O coelhinho), que serve carne de coelho de várias maneiras. Fomos almoçar lá no penúltimo dia de nossa viagem. No caminho perguntamos a uma moça que passava onde ficava o restaurante. Nos respondeu: olha, está fechado hoje para dedetização, mas eu vou levar vocês a um ótimo Paladar…  Logo nós, já escolados na escola de Pablo ela achava que ia enganar. Agradecemos e fomos adiante, nos orientando pelo mapa. Estava aberto normalmente. De verdade, os jineteros em Havana não dão moleza. Um prato individual com metade de um coelho mais guarnições (arroz moro, mariquitas) por seis Cucs (15 reais) achamos bem barato. E até que coelho não é ruim!

Baião de Dois (arroz com feijão dentro) é onipresente em Cuba. Lá se chama Arroz moro (Arroz moros y cristianos) ou Congris, esse é um nome de influência haitiana (o Haiti fica a 90 km de Cuba). Congris é a aglutinação de feijão Congo + Riz (arroz em criollo haitiano). Os garçons perguntam: arroz blanco o arroz moro/congris?

Mariquitas são chips de banana verde. Já vi isso em Rondônia. O povo pega banana verde, picota como se fosse batata e frita. Não tem muita graça.

Boniato é batata doce. Muito frequente nos restaurantes. Boniatillo é doce de batata doce.

UM POUCO DA HISTÓRIA DE CUBA

cuba-embargoEm minha primeira passagem pela feira de livros usados da Plaza de Armas comprei um livro sobre a História de Cuba. Faço aqui um resumo resumidíssimo. É interessante porque nós, leigos, costumamos pensar Cuba só a partir das brigas dos EUA com Fidel. Essas brigas, entretanto, vêm de muito mais longe. 

Cristóvão Colombo chegou a Cuba em 1492, mas só em 1510 a Espanha enviou Diego Velásquez para colonizar a ilha. Nesse ano estima-se que havia 112 000 indígenas em Cuba. Em 1555 restavam apenas 3 900. José Marti, em um artigo dedicado ao Padre Bartolomé de Las Casas (protetor dos índios), assim escreveu:

[…] En aquel país de pájaros y de frutas los hombres eran belos y amables; pero no eran fuertes. Tenían el pensamiento azul como el cielo y claro como el arroyo. Pero no sabían matar. Caían como las plumas y las hojas. Morían de pena, de fúria, de fatiga, de hambre, de mordidas de perros […]

Acabados os índios, como no Brasil, os colonizadores foram buscar os negros da África.

Cuba não tinha ouro. A exploração colonial se deu por ciclos agropecuários: do gado, do tabaco, do açúcar, do café.

Espanha dominou Cuba até 1898, quando houve a “independência” (76 anos após a brasileira). Entre aspas porque existia outra criatura, além da Espanha, que não aceitava que Cuba se tornasse independente: Estados Unidos. Em 1767 Benjamin Franklin já expressava o interesse em Cuba. Em 1805 o Presidente Thomas Jefferson comunicou à Inglaterra, que em caso de uma guerra contra a Espanha, anexaria Cuba. Em 1823 o Presidente James Monroe proclamou a Doutrina Monroe, onde consta que os EUA não aceitariam nenhuma potência estrangeira se apropriar de terras no continente americano (fez uma reserva de mercado). Outros presidentes estadunidenses ofereceram dinheiro à Espanha para comprar Cuba (como fizeram para adquirir a Florida).

Entre 1868 e 1878 houve a chamada Guerra dos Dez Anos pela independência de Cuba. Os independentistas chegaram a tomar mais da metade da ilha. Mas perderam. Estados Unidos se posicionaram francamente a favor da Espanha, com o Presidente Ulisses Grant fornecendo informações sobre os rebelados, vendendo navios de guerra, proibindo expedições dos revoltosos a partir de seu território, etc.

Terminada essa guerra, José Marti foi para o exílio e continuou a preparar a luta pela independência, alertando sempre que, embora a luta fosse contra a Espanha, pairava outro grande perigo para a independência de seu país: as intenções anexadoras dos Estados Unidos.

Em 1895 estourou a segunda guerra de independência. José Marti foi assassinado tão logo voltou a Cuba. Os independentistas avançaram pelo país. Estados Unidos, nos primeiros meses, apoiou a Espanha, depois, sentindo a causa perdida, declarou guerra a uma Espanha já decrépita como potência colonial.   

Ganhou a guerra e se apoderou das colônias da Espanha: Filipinas, Porto Rico e Cuba. Enviou um governador militar para Cuba. Em meio a intensa agitação política, foi decidido que o país teria uma nova constituição. Nas discussões da Constituinte os EUA tiveram de aceitar que Cuba fosse considerada “independente”, mas impuseram a chamada Emenda Platt: Os EUA poderiam intervir militarmente a qualquer momento que julgassem a independência do país ameaçada (quer dizer, sempre que inventassem uma desculpa); Cuba cederia terras, arrendadas ou vendidas, para as companhias americanas, (United Fruit, Usinas de açúcar de capital estadunidense, etc.); Seriam permitidas bases militares estadunidenses (Guantânamo e Bahia Honda, esta última nunca foi implementada); As taxas para os produtos estadunidenses em Cuba seriam muito baixas, etc.

Conclusão: Cuba “independente” continuava uma colônia, agora dos EUA, assim como José Marti previra.

Desde 1898 até 1959 Cuba foi uma “colônia” estadunidense. Estados Unidos comandavam governos títeres, corruptos e cruéis. Suas empresas operavam 40% da produção de açúcar (36 usinas estadunidenses) e eram donas de vastos latifúndios. 90% do serviço de eletricidade e telefônico e 50% do transporte ferroviário.

Gestores em Cuba eram estadunidenses. Nas rebeliões e greves de trabalhadores do período uma das principais reivindicações eram que cubanos tivessem acesso a todos os postos de trabalho. A máfia comandava inúmeros negócios, legais e ilegais.

A Revolução de 1959 tomou o poder em janeiro. Em março foi promulgada a primeira lei de reforma agrária: pessoa física ou jurídica só podia possuir até 30 caballerias de terra (1 caballeria= 13,5 hectares). Os proprietários seriam indenizados com bônus de vinte anos.

Estados Unidos tomou isso como uma declaração de guerra e a partir daí começou a disputa que acompanhamos até hoje, com bloqueios, mais de 600 tentativas de assassinato de Fidel Castro, disseminação de pragas e epidemias, etc.

Esse resumo demonstra uma coisa: a briga dos EUA com Cuba não é só por causa do “comunismo”. Ela começa lá atrás no desejo de anexação e dominação. O ódio é porque a pequenina Cuba disse não. Cuba Libre só é aceitável para os EUA se for o drink com Coca-Cola.

Recentemente o Presidente Raul Castro disse que Cuba e os EUA podem ter uma relação civilizada.  O vizinho Brutus sabe o que é isso?

Fosse pelo menos o marinheiro Popeye.

PEGADAS DE HEMINGWAY

Ernest Hemingway morou em Cuba por vários anos. Primeiro num quarto do Hotel Ambos Mundos, na Rua Obispo, quase na Plaza de Armas. Depois, por insistência de sua esposa Martha Gellhorn, comprou uma chácara chamada Finca Vigia, a 15 km do centro de Havana, na pequena cidade de San Francisco de Paula. Vizinha a esta fica a Baía de Cojímar, uma pequena vila de pescadores onde o escritor ia beber no Bar e Restaurante La Terraza, local muito aconchegante, aberto até hoje. Cojímar foi a inspiração para o cenário de O Velho e o Mar. Em Havana Hemingway bebia Mojitos na Bodeguita Del Médio e Daikiris no Floridita.

Martha Gellhorn foi uma das esposas de Hemingway. Era uma jornalista e escritora estadunidense. Um de seus livros é chamado ‘A Face da Guerra’, relatos jornalísticos como correspondente das várias guerras que cobriu. Um pequeno trecho da introdução ao relato das guerras na América Central, na era Reagan (escreveu a introdução em 1986):

“A ex-embaixadora americana nas Nações Unidas, a principal teórica da atual administração americana, enunciou uma nova visão americana do mundo. Existem dois tipos de ditaduras, proclamou a senhora: totalitária, comunista e absolutamente abominável, e autoritária, de direita, talvez não tudo o que se poderia desejar, mas anticomunista e aceitável como um aliado. É uma nova doutrina. Os direitos humanos são violados em ditaduras totalitárias e o governo americano vai protestar energicamente. O horrível abuso dos direitos humanos nas ditaduras autoritárias é ignorado ou minimizado. Será que os outros governos do Mundo Livre aceitam a linha política do Líder? Eles não expressaram qualquer repúdio público a este sistema de subdividir a injustiça. Talvez devamos parar de nos chamar de Mundo Livre e, em vez disso, nos chamar de Mundo da Livre Iniciativa. É um nome mais preciso, já que engloba nossos clientes e companheiros “autoritários”.

“Muitos antes do medo da União Soviética se tornar a principal preocupação dos governos americanos, eles sustentaram ditaduras autoritárias por toda a tradicional esfera de influência dos Estados Unidos, o Caribe, as Américas Central e do Sul. Se um povo oprimido e faminto se rebelava, os fuzileiros eram enviados para restabelecer a ordem. Se o povo conseguia eleger um não-tirano, que cuidaria de seus interesses, esse governo era desestabilizado. As necessidades trágicas da população desses países não eram importantes. A palavra gringo não é uma piada; para os pobres, que são a maioria da população, é o nome que o inimigo recebe em toda a América Latina.

“Eu fui para El Salvador em total e completa ignorância….”

(A Face da Guerra – Martha Gellhorn – Tradução de Paulo Andrade Lemos e Anna Luisa Araujo – Editora Objetiva 2009)

Os relatos dessa senhora, que não é nenhuma radical, apenas uma pessoa honesta, acerca das guerras de El Salvador e do Vietnã, são muito emocionantes. Fatos reais. Feitos e artes do “mundo livre”, da “maior democracia” do ocidente, atos heróicos para nos “libertar” das cortinas de ferro.

Por isso, andando pela Baía de Cojímar, entrando no Restaurante-Bar La Terraza, eu pensei mais nela que em Hemingway e seus rifles. Morreu em 1998. Saudações, Martha Gellhorn.   

DE COMO, EM CUBA, LEMBREI-ME DE PINHEIRINHO

Nosso taxista anticomunista nos levou por um giro a Praias do Leste. Tentava, todo o tempo, advinhar o que nós estávamos falando. Quando escapava alguma palavra que ele entendia como “comunismo” ou “Fidel Castro”, fazia uma careta, entortava a cabeça para o lado e falava: “Comunismo no. No, comunismo no”.

Como era uma decisão pessoal não ficar discutindo política com os cubanos, ficava apenas ouvindo as manifestações dele.

Estávamos na Baía de Cojímar, a quinze quilômetros do centro de Havana, ele se aproximou de mim, apontou para os prédios de Alamar, que ficam vizinhos, e disse: Olha, pra você ver que horrível o que eles fazem: quando algum prédio lá do centro de Havana ameaça desabar eles pegam o povo que mora no prédio e alojam em apartamentos ali em Alamar e depois recuperam o prédio, mas não chamam o povo para voltar a morar lá. Usam o prédio recuperado para outra coisa. As pessoas acostumadas a morar no centro tem de ficar morando longe (a gente olha pro lado da Baía e vê o centro de Havana ali a 15 km), não é uma coisa horrível?

Respondo pra ele, com ar bem distante, fingindo enfado: lá onde moro já vi coisa pior. Ele fica decepcionado ao não perceber em mim um estarrecimento frente à grande injustiça por ele narrada. Balbucia algo assim: Coisa pior, é?

SEM VIOLÊNCIA, SEM POLÍCIA VIOLENTA

Cássio já foi vítima de violência policial, por isso o tema nos interessa muito. Por Cuba ter a fama de ser um regime fechado, uma ditadura, pensávamos que veríamos nas ruas uma polícia com cara de poucos amigos, truculenta. Muito pelo contrário, as pessoas não sabem o que é violência policial. Ousei perguntar para uns dois cubanos sobre casos de violência policial. Ambos negaram. Um respondeu: Como assim? Polícia é para proteger as pessoas, não para bater. Ah, tá. Ficamos algumas vezes observando policiais na rua. Não há muitos e andam isoladamente. Talvez tomem conta de um determinado setor e fiquem caminhando pelas quadras que devem vigiar, não sabemos. Portam um revólver. Vimos participarem de conversas na rua, com passantes, gargalharem, como se fossem compadres.

Para confirmar o que Dona Agustina nos disse na chegada, sobre cuidados com correntes de ouro e carteiras, Hilda teve sua corrente de ouro agarrada por um rapaz na Rua Aquila, em Centro Habana. Cássio ainda correu atrás do “meliante”, mas ele, dono do pedaço, sumiu rapidamente. Em pleno dia. Isso, porém, foi uma exceção. Andamos muito na cidade, inclusive à noite, nunca sentimos o clima pesado ou ameaça de atos violentos contra nós.   

Sem violência, sem assaltos a mão armada, sem assassinatos, sem milícias e traficantes exercendo poder de vida e morte sobre a população e sem polícia violenta, só se pode dizer que nesse quesito Cuba é invejável.

MENOS MÉDICOS

Depois dos episódios do Mais Médicos, da “maravilhosa” recepção aos médicos cubanos, dos gritos de “escravos”, pensei comigo: ao preencher qualquer documento não devemos colocar a profissão de médico como nossa profissão. Por segurança, vai que somos descobertos e levamos uma surra. Melhor disfarçar.

Apenas paranóia. Tudo transcorreu sem alterações. Dona Agustina até tentou que uma sobrinha médica ciceroneasse Salém, valente defensor do SUS, por parte das estruturas de saúde pública de Havana. Fui convidado a ir junto, mas pedi, implorei, que não me delatassem, em Cuba, como exercendo essa profissão. Seguro morreu de velho.  Acabou não dando certo a excursão de Salém, porque a médica já estava acompanhando uma equipe alemã.

Falando em SUS, um dia nos sentamos num local na Plaza de Armas que servia “Guarapo com Ron” e começamos a conversar. Surpreendeu-me que Salém acusou Lula de ter tentado prejudicar o SUS. Fiquei muito surpreso mesmo. Nunca ouvi falar disso. Seria “el Ron en La cabeza” de Salém? Não aprofundamos o assunto. Salém é muito militante. Sua vida é uma defesa contínua dos direitos dos pacientes psiquiátricos, toxicômanos, moradores de rua, etc. E é valente, se mete em muitas lutas. Por isso diz que não tem tempo de ler os Blogs alternativos. Mas… Compra a Folha de São Paulo aos domingos, costume de um tempo em que todos nós aprendíamos alguma coisa com esse jornal. Tempo que passou. Será se Salém ainda se deixa envenenar?

Numa coisa concordamos: a medicina explodiu com a era Lula. Nós médicos não conseguimos mais atender a demanda. E não aumentou só o trabalho. Grana também. Melhorou para toda a sociedade brasileira. Para a classe médica, isso e um pouco mais. Daí como entender que essa classe se insurja com tanto ardor contra as administrações petistas? Acabou o que restava de algum racionalismo? As pessoas já não fazem as escolhas que lhe favorecem? São as trevas do fascismo bafejando nossas cabeças?  Que venham mais médicos… Nós não estamos dando conta.

“Guarapo”, ao ver essa palavra, escrita na placa em frente ao restaurante, viajei longe. Fui até o ano de 1966. Nosso pai migrara do Piauí para o antigo norte de Goiás que hoje é Tocantins. Ou seja, atravessara o Rio Parnaíba para o Maranhão, alguns quilômetros e atravessara o Rio Tocantins para o Goiás. Não era uma migração para muito distante, como se pode pensar. Olhando no mapa do Brasil observa-se que o sul do Piauí toca no antigo norte de Goiás hoje Tocantins. Naquela época, entretanto, quando ainda não havia boas estradas, o deslocamento era muito difícil, e a viagem parecia ter sido para muito longe. Juntando-se a isso as incertezas econômicas de uma mudança, nosso pai preferiu deixar três dos cinco filhos (até então nascidos) na casa de nossos avós, no Piauí. Ficamos eu, com seis anos, e os dois menores, de um e dois anos. Nosso avô tinha um pequeno engenho. Vivia de produzir cachaça e rapadura. Garapa de cana, para nós, era um refresco e um alimento cotidiano. E se chamava garapa: g-a-r-a-p-a. Um ano depois nosso pai foi nos buscar e fomos para o Goiás: uma pequena vila na beira da rodovia Belém-Brasília, fundada por piauis, e onde só tinha piauís e um punhado de mineiros. Ônibus das viações Expresso Braga e Rápido Marajó, que faziam linhas interestaduais, paravam lá para lanchar. A lanchonete, de um piauí, servia “Caldo de Cana”. Se a gente pedia garapa, eles corrigiam, o “certo” é falar caldo de cana. Seguramente algum sulista comentara isso, de passagem por lá, e os piauís locais passaram a ter vergonha de falar garapa, tinham de falar “o certo”. Mas isso é outro assunto: Como pessoas usam palavras para diminuir semelhantes. Alegrei-me, de verdade, com a palavra guarapo. Ali, naquela pequena praça lotada de turistas de todas as partes do mundo, estávamos tomando g-u-a-r-a-p-o com rum e não caldo de cana.  Uma pequena vingança retroativa a 1966 que me proporcionou Cuba libre (de frescura, breguice e viralatice)! 

ME VOY A BAYAMO Y SANTIAGO NAMORAR OS NEGRÕES GUAPOS

Estávamos na Cafeteria Francesa à noite. Por coincidência Dona Agustina apareceu lá para comprar os pães do café da manhã do dia seguinte. Convidamo-la para nossa mesa. Sentou conosco. No balcão, comprando alguma coisa, tinha uma moça negra, segurando uma criança pela mão. Vestia um macacão rosa, curto, e era belíssima, deslumbrante. Homens, mulheres e gays se viraram para admirá-la. Não foi orgulhosa. Não olhou para ninguém, mas também não arrebitou o nariz. Saiu calmamente, puxando sua criança pela mão. Dona Agustina disse que há uma região de Cuba, Bayamo, onde os negros têm fama de serem especialmente belos.

Próximo destino: Bayamo. Se hay negras lindas, hay também negrões.

Descobrimos, nas ruas de Havana, a negritude cubana:

Nas ruas de Havana descobrimos                                                                                  

            Cuba é negra

De Oriente a Ocidente

            Cuba é negra

De Pinar a Santiago

            Cuba é negra

Nas ondulosas curvas dessas ancas

            Cuba é negra

Na exuberância desses falos

            Cuba é negra

No punhal dos cimarrones

            Cuba é negra

Nos sorrisos de marfim

            Cuba é negra

Fidel visitando o Harlém

            Cuba é negra

Na alegria e na festa

            Cuba é negra

No sofrimento e na dor.

RON SANTIAGO DE CUBA AÑEJO

Uma coisa deliciosa de Cuba é o Rum Santiago de Cuba Añejo (envelhecido). Tão bom que nem experimentamos outro mais conhecido: O Havana Club. Não dá ressaca. Encontrado em todos os pequenos supermercados e no aeroporto. O preço é o mesmo (uma característica do país que ficamos apreciando muito, não importa se é no aeroporto ou na rua, o preço é igual): 7,60 Cucs a garrafa grande e 3,80 a pequena. Andávamos sempre com uma garrafa para nosso deleite.

ZEZE DE CAMARGO E LUCIANO NO PARQUE CENTRAL

Passando pelo Parque Central sentamo-nos um pouco nos degraus da estátua de José Marti. Um jovem começou a conversar conosco em português perfeito. Era do interior e estava ali esperando parentes que vinham apanhá-lo. Fã de Zezé de Camargo e Luciano, sabia suas músicas de cor. Aprendera português em um curso da televisão cubana para entender melhor as letras. Estava visivelmente emocionado em conhecer falantes do português. Pedimos que cantasse uma música da dupla. Cantou “É o amor”. Bela voz. Cantou outras músicas até que seus parentes chegaram para buscá-lo. Cario deixou com ele seu endereço e o convite para, caso quisesse, vir ao Brasil.   

COMPRAS, O QUE CUBA TEM A OFERECER?

Em termos de compras, perfumes nacionais de Cuba (Alícia Alonso e outras marcas), cosméticos (as mulheres a quem presenteei com esmaltes e perfumes de Cuba elogiaram muito), livros (história, negritude, candomblé, etc.), rum e charutos. Mais não há. Mas quem vai a Cuba para fazer compras, se já vivemos no mundo do consumismo? Vamos lá justamente buscando observar o contrário: para vermos como se vive num mundo sem o intenso consumismo de hoje. Claro que a todo ser humano agrada ver enorme diversidade de coisas para o consumo (de quem tem dinheiro no bolso). Dizem que Sócrates andava no mercado de Atenas exclamando: quanta coisa de que não necessito… Talvez os cubanos, seres humanos que são, preferissem ver a exuberância de mercadorias que vemos em nossas cidades (mesmo que não possamos dispor de tudo). Os cubanos talvez andem por seus mercados e pensem justamente o contrário de Sócrates: não tem muitas das coisas que (acho que) preciso.  Mas seriam mais infelizes do que a imensidão de brasileiros excluídos?

ONDE MORA A FELICIDADE?

Vamos fazer um esquema:

Classe média brasileira: dispõe de comida, educação, saúde, moradia, moeda forte, liberdade para viajar (porque tem moeda forte), insegurança em relação à violência (a desigualdade extrema será sempre fonte de insegurança extrema);

População brasileira pobre: Não dispõe de comida, educação, saúde nem moradia garantidos, insegurança extrema, vítimas tanto dos bandidos como da polícia, tem liberdade para viajar, mas não viaja pois não tem moeda forte;

Povo cubano: eles mesmo afirmam que dispõem do satisfatório em termos de comida, educação, saúde e moradia. Há segurança (produto da reduzida desigualdade), a polícia é educada e respeitadora do cidadão (eu e Cássio presenciamos e testemunhamos), falta moeda forte, dizem que não têm liberdade para viajar, mas quando convidados por alguém que banca a viagem eles conseguem liberação, donde se deduz que não viajam porque não têm moeda forte, como acontece com o povo brasileiro pobre.

A blogueira oposicionista Yoánis não saiu de Cuba para morar na Europa, depois voltou, montou seu negócio de blog, altamente financiada, não se sabe por quem? Recentemente não viajou mundo afora falando mal do governo e do momento do seu país? Então há falta de liberdade de viajar? Não seria melhor dizer falta de dinheiro, moeda forte, para viajar?

Quem é mais feliz? Sei lá.   Entende?   Alguém arrisca?

NÓS, HABITANTES DESSE VALE DE LÁGRIMAS

Como no Brasil, e em outros países calientes, em Cuba não falta sexo. Sexo é a maior dádiva dada por Deus, a nós, habitantes desse vale de lágrimas. Sexo por prazer, sexo por dinheiro. E não se venha com carolice de dizer que “sexo por dinheiro é prostituição e isso é abominável.” Vamos mudar o disco.

As pessoas fazem sexo por beleza (a beleza que provoca tesão) ou por dinheiro. Um jovem e belo fazer sexo com um feio, velho, fedido, doente, gordo, etc.  tudo que ao senso comum provoca repulsa ou asco, mesmo que seja por dinheiro, é sim um ato nobre. Sexo é o ato de intimidade mais profundo que um ser humano pode oferecer a outro.

Portanto, a profissão de prostituta ou prostituto, é, no mínimo, respeitável. Eles aliviam a dor e a solidão dos desprezados, tocam seus corpos e se deixam ser tocados.

É também um ato de amor. Via de mão dupla. Ajuda mútua.

POLÍTICA I: CRIMEZINHOS LEVES DA DIREITA

cuba-usa-embargoDesculpem os que amam os EUA, não dá pra falar de política em Cuba, sem falar dos Estados Unidos. Eles são onipresentes. Os cubanos sabem que sobre suas cabeças se debruça uma sombra mortal que se chama EUA.

Quando pedimos maior acesso democrático à informação no Brasil, o fim do monopólio privado nas comunicações, uma reforma política que democratize a representação, as políticas de estado laico, etc. sempre aparece alguém da direita para dizer que isso é comunismo, que lutamos pelo aparelhamento do Estado visando uma ditadura comunista, e citam rosários de crimes do comunismo, Stálin, Coréia do Norte, etc. numa total deturpação do que é a luta por democracia num país desigual como o Brasil.

Quem ainda acredita em comunismo, cara direita? Só Vocês. O comunismo caiu de podre. Não há estímulo à produção. Há escassez. O seu contraponto, o capitalismo, estimula a produção, utiliza exército de milhões de trabalhadores (deixando outros tanto na reserva e no desespero) mas não distribui a riqueza produzida.

Os filósofos, economistas e políticos honestos em todo o mundo estão tentando sair dessa dicotomia: máquina de produzir riquezas[1] com concentração, do capitalismo X justa distribuição com baixa produtividade (escassez), do socialismo. E preservando o valor eterno da democracia. Cabeças pensando, vamos, ajudem, em vez de ficar enumerando, pela milésima vez, os crimes que Stálin praticou.

Agora, cara direita, se é pra utilizar o princípio retórico do Tu quoque[2] (Tu também), fazendo competição de crimes, vamos relembrar alguns crimes do capitalismo, especialmente aqueles praticados por seu expoente-mor no último século, os Estados Unidos:

Quando as bombas de Na Palm jogadas pelos EUA sobre o Vietnã caíam, elas não derrubavam só a floresta, elas destruíam vastas áreas de plantações de populações pobres, que viviam da agricultura. Se não morressem de bala ou de bomba nos próximos meses, elas morriam de fome, pois tudo o que tinham era sua lavoura. Isso e mais outras “coisinhas leves” levaram à morte de cinco milhões de pessoas do Vietnã, do Laos e do Camboja. E os que ficaram aleijados? E as inúmeras crianças vietnamitas que nasceram com defeitos devido à exposição química? E o desespero de gerações e gerações? Martha Gellhorn visitou Saigon nessa época. Havia espécie de campos de concentração para abrigar órfãos, infindáveis órfãos, todos em grande sofrimento, desnutrição e extrema carência.

Tudo isso porque os EUA e a cara direita odeiam os comunistas e querem salvar o mundo de seus crimes.

Em plena ditadura de El Salvador, Martha Gellhorn esteve nesse país:

“A umas poucas quadras da fortaleza de concreto cinzento da embaixada americana, no quintal sombreado do escritório da diocese, há um barraco de folha-de-flandres pintado de verde, o lar da Comissão de Direitos Humanos salvadorenha. É um bom lugar para se conseguir uma visão geral do que preservar a liberdade significa para os salvadorenhos comuns.

“Você pode ler aleatoriamente seleções de centenas de depoimentos juramentados de atrocidades. Você pode estudar álbuns de fotos dos assassinados. Você também pode ter conversas esclarecedoras com pequenas mulheres morenas e robustas, imediatamente simpáticas em vestidos de algodão limpos e desbotados, com seu cabelo preto enrolado no topo de suas cabeças. As mulheres são parentes das vítimas que vêm aqui, apesar do perigo, para testemunhar, pedir conselhos, receber uma doação semanal de farinha de trigo, para conversar. Na minha rápida visita a San Salvador, fiquei espantada com a confiança daqueles que têm mais a temer.

“Por exemplo, parei uma mulher magrela que estava carregando um saco plástico de farinha de trigo sobre a cabeça. Para sua família? Ela não tinha mais família exceto a mãe e três filhos de seu irmão. Ela tem 47 anos e, há dois anos, tinha três irmãos e uma filha. Um por um eles desapareceram. Ela me levou atrás do barraco para me mostrar o que havia sido feito com ela porque ela ousou perguntar à polícia sobre seu irmão mais velho, depois sua filha. Havia um corte em seu seio esquerdo que descia até o mamilo, ela tinha uma ferida de facada profunda no ombro e outra na cabeça.

“-Todos eles me estupraram. Depois, eles enfiaram uma lanterna dentro de mim. Estou partida por dentro. Caminho muito mal. – Isso foi por seu irmão mais velho. Ela levantou o vestido rapidamente para revelar um corte longo direto descendo por sua barriga, outras cicatrizes. – Eles acharam que eu estava morta. Eles me deixaram como morta. – Isso foi quando ela tentou descobrir sobre sua filha. Ela não deu qualquer sinal de autocomiseração, mas disse com lágrimas súbitas: Imagine, uma menina de 25 anos, grávida.

“Quando o segundo irmão desapareceu, sua mãe, incapaz de aceitar a perda em silêncio, voltou para sua aldeia com o filho mais novo. Dias depois, encontrou o corpo decapitado do último filho a 7 quilômetros da aldeia.

“ Foi um encontro acidental; ela não era diferente de qualquer outra mulher recebendo farinha.”

“O Presidente Reagan certa vez descreveu a catástrofe do Vietnã como “aquela causa nobre”. Recentemente, ele chamou os guardas de Somoza, novamente matando seus compatriotas na Nicarágua, sob os auspícios da CIA, de “defensores da liberdade”. Agora, ele fala eloquentemente em “preservar a liberdade em El Salvador, para o que mais centenas de milhões de dólares são exigidos.” [3]  

Tudo isso porque os EUA e a cara direita odeiam os comunistas e querem salvar o mundo de seus crimes.

Estados Unidos fundou uma escola no Panamá para treinar oficiais das forças armadas dos países das Américas, chamada Escuela de las Américas. Sediada primeiro nos Fortes Amador e Gulick, no Panamá. Depois se mudou para o Fort Benning, nos EUA. Em 17 de janeiro de 2001, mudou de nome para Instituto de Defensa para la Cooperación de Seguridad Hemisférica.

A Escola de las Américas é uma escola de torturas e de doutrinação para o “anti-comunismo”. Tão terrivelmente mal-afamada ficou que há até ONGs formadas para denunciar suas atividades, como SOAW – SOA Watch – Observador da Escola das Américas (School of Americas Watch em Inglês)[4].

O senador democrata Martin Meehan, de Massachusetts, disse uma vez: “Se a Escola das Américas decidisse celebrar uma reunião de ex-alunos, reuniria alguns dos mais infames e notórios malfeitores do hemisfério”.

“A Escuela de las Américas era um bastião dos Estados Unidos”, lembra José Miguel Guerra, um dos mais prestigiados jornalistas no Panamá, para o jornal suíço Neue Zürcher Zeitung. “Aqui, os militares de toda a América Latina, com exceção de Cuba, eram doutrinados pelo Pentágono para ter o controle político sobre seus países.”[5]

Certamente foram os aprendizes dessa escola que destruiram a vida daquela pobre mulher salvadorenha (e de outros milhares ou milhões de “perigosos comunistas” América Latina afora) que Martha Gellhorn entrevistou na fila de doação de farinha de trigo da diocese de San Salvador.

Roberto d´Aubuisson, militar e político salvadorenho, chefe de esquadrões da morte e mandante do assassinato do arcebispo de San Salvador, Oscar Romero, se graduou na Escola de Las Américas. No tempo de formação por lá ficou conhecido como “Maçarico Bob”, “Blowtorch Bob”, por suas contribuições às técnicas de tortura com maçaricos. Matou milhares de salvadorenhos, nas condições mais cruéis possíveis. Dizia que para tornar El Salvador um país sem comunistas, era necessário matar ainda uns 200 a 300 mil.

É bem provável que a farinha de trigo distribuída fosse uma doação da grande democracia, os Estados Unidos, nosso grande defensor contra a ditadura comunista dos soviéticos, de Stálin.

Tudo isso porque os EUA e a cara direita odeiam os comunistas e querem salvar o mundo de seus crimes.

Quem quiser conhecer mais “crimezinhos leves” dos EUA pode buscar informações no livro Killing Hope de William Blum.

POLÍTICA II:  PARAÍSO  -  INFERNO

Portanto, cara direita, crime por crime, tu quoque.

Enquanto Stálin e seus seguidores se matam principalmente em guerras internas,  em disputas ideológicas e pelo poder de encaminhar “a revolução”, os EUA direcionam seus crimes para o “inimigo exterior” que ousar se rebelar contra sua vontade.

Tudo bem, a União Soviética invadiu a Hungria e a Tchecoslováquia para evitar mudanças no regime. Mas, e os EUA, invadiu quem, planejou e concretizou derrubadas de governos democráticos de onde? Assassinou quantos por vias diretas ou indiretas? A lista é grande, vamos omiti-la aqui.

O ditador da Coréia do Norte fuzila o tio e a notícia se espalha em todos os jornais. O ditador não é sutil. É escancarado. A grande democracia dos EUA é maravilhosa, tem julgamentos justos, cidades lindíssimas, todos queremos ir pra lá mas… lá no escondido, lá no subterrâneo, treina homens para usar o maçarico, para decapitar pobrezinhos em El Salvador, para matar padres que defendem os pobres, etc. Qual a diferença com a Coréia do Norte? A sutileza e a hipocrisia. Aí a cara direita faz a pergunta clássica: Já que critica os Estados Unidos por que não vai para a Coréia do Norte? Não, não vou. Se tiver de optar vou para os Estados Unidos. Porque lá é o paraíso. A pergunta que a cara direita nunca faz é: Para que meu país se torne um paraíso, eu preciso tornar a metade do mundo um inferno? Eu preciso fazer uso dos conceitos da Arte da Guerra, do Sun Tzu, e ficar detonando meio mundo, preventivamente, para construir meu paraíso?   Eu preciso treinar os militares de outros países na obsessão do anticomunismo a ponto deles agredirem cruelmente seu próprio povo, em extensivos genocídios, como fizeram as ditaduras latino-americanas, influenciadas pelos EUA?

A vontade dos EUA é manter-se, ele e seus aliados, como um paraíso, para onde todas as riquezas afluem. Vontade de mandar, regular a vida dos outros países, dispor de seus bens. Um dualismo tipo paraíso/inferno. Onde criamos um paraíso para nós e um inferno para os outros.

Nós construímos nosso paraíso às custas de eliminar a qualidade de vida dos outros, os meios de subsistência dos outros. Ao mesmo tempo que os depredamos, construímos nosso muro. O muro do México é típico como ilustração do dualismo paraíso/inferno. É como se dissessem: Fiquem do lado de lá, miseráveis. Nós só queremos de vocês os valores econômicos que raspamos de seu tacho. Não venham estragar o nosso paraíso com a sua presença esfomeada.

O muro de Berlim foi erguido porque os EUA e seus aliados se postaram na fronteira, com voz de sereia, chamando: venham para o paraíso, venham para o paraíso. Com o objetivo de detonar o outro lado pela fuga de mão de obra. O muro do México é muito mais cruel.

O muro do México desnuda o que os EUA representam: a exclusão. O muro de Berlim encobre: olhem, todos querem fugir para o nosso sistema de vida, nós somos o mundo livre, a democracia. Ocultando que o “mundo livre” e próspero só subsiste com a escravidão neocolonial da outra parte do mundo.

Por que ninguém se envergonha do muro do México, como diziam que se “envergonhavam” com o muro de Berlim?

POLÍTICA III: MÉXICO E CUBA, SUPORTAI

Estados Unidos foram comendo porções do México pelas beiradas, a ponto de um Presidente mexicano falar aquela famosa frase: pobre México, tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos.

O Brasil também sofre a ação do Império. Todavia, pelo menos, está distante. México e Cuba estão ali, agarrados com ele.

Os EUA tentam, há 52 anos colocar Cuba novamente de joelhos. O embargo comercial é uma declaração de guerra, segundo o jurista Dr. Pedro Serrano, em artigo na Carta Capital de 24/02/2013.

A organização política e econômica do mundo está sempre em tentativas e experimentos.  Cuba também tem direito a fazer seus experimentos.

O grande feito de Cuba não é ter experimentado o comunismo. O grande feito é ter dito não ao Rei Leão, ao império, e estar resistindo até hoje. É isso que aprendemos a admirar nesse pequenino e tenaz país. Cuba não aceitou o esquema estadunidense de Paraíso-Inferno. E é isso a causa de todo o ódio dos Estados Unidos. Ódio de quem não sabe viver e deixar viver. Ódio de quem não sabe o que é alteridade, como sabe meu amigo Salém.

Cuba é a nossa fronteira.

Cuba é a Resistência.

QUE LINDA MÚSICA DE UM GUSANO

Dos músicos cubanos contemporâneos à Revolução de 1959, parte permaneceu em Cuba – Os músicos do Buena Vista Social Club são a maior expressão – e parte partiu para o “exílio dourado”, com muitos dólares. Célia Cruz e Guillermo Portabales pertencem ao último time. Guillermo Portabales tem uma música chamada Yo te canto Puerto Rico, onde canta os seguintes versos:

Mi Puerto Rico querido hoy lloro mi Cuba esclava

Mi Puerto Rico querido Como sufre tu isla hermana

El pájaro ha sido herido e hoy sangra de sus alas

E outra música, muito bonita, chamada Lamento Cubano, cuja letra é:

¡Oh! Cuba hermosa, primorosa,

¿Por qué sufres hoy

Tanto quebranto?

¡Oh! Patria mía,

¡Quién diría

Que tu cielo azul

Nublara el llanto!

¡Oh! En el susurro del palmar

Se oye el eco resonar

De una voz de dolor

Que al amor llama…

¡Oh! Al contemplar

Tu ardiente sol,

Tus campos llenos de verdor,

Pienso en el tiempo aquel

Que se fue Cuba…

¡Oh! Cuba hermosa, primorosa,

¿Por qué sufres hoy

Tanto quebranto?

¡Oh! Patria mía,

¡Quién diría

Que tu cielo azul

Nublara el llanto!

Pienso en el tiempo aquel, que se fue, Cuba…

Para muitos, tempos bons são aqueles em que a vida é uma festa para poucos!

Será por coisas assim que Platão fez aquelas criticazinhas a esses seres chamados poetas?

ÚLTIMOS DOIS DIAS EM HAVANA – HOTEL NACIONAL

Nos dois últimos dias em Havana, eu e Cássio nos mudamos para o Hotel Nacional. Despedimo-nos de Dona Agustina e sua ajudante Jaqueline.  Deixamos tudo que sobrara (sabonetes, papel higiênico, balinhas Arcor tipo caramelo) para elas, além de uma boa “propina”. Dona Agustina ainda chegou a dizer: No, hijo, no necessita… Mas em seguida agarrou os Cucs.  Salém e Alice permaneceram lá. Dona Agustina, a nosso pedido, indicou o restaurante La Roca como sendo um bom lugar para se comer, na região de Vedado. Por fim, chamou um taxista que cobrou 4 Cucs (10 reais) para nos levar.

Hotel Nacional. Antigo, da década de trinta, cheio de histórias. Em seu hall há fotos de hóspedes ilustres: Artistas de Hollywood, Nat King Cole, Frank Sinatra, Presidente Lula, Glória Pires, etc. Fica no início do bairro de Vedado, à beira mar, ao lado do Malecón.

Pagamos 360 euros por dois dias (mais de mil reais!). Por seis pernoites em Dona Agustina, já com café da manhã incluído, pagamos 390 reais.

Importante lembrar que o check in é feito a partir das 16:00 hs. A Justificativa é que os trabalhadores da limpeza necessitam de quatro horas para o trabalho – Entre o check out às  12:00 hs. e o check in às 16:00. Não adianta insistir, você só entra em seu quarto às 16:00 hs.

O café da manhã é soberbo. Um salão enorme repleto de comidas, de máquinas de fazer sanduíches, de máquinas de fazer omeletes e panquecas. Pela primeira vez constatamos que da proximidade geográfica (apenas 123 km) entre Havana e os EUA alguma influência ainda havia de restar: a variedade imensa de bacons e de ovos no café do Hotel Nacional, típico, dizem, do estilo norte-americano de quebrar o jejum pela manhã.

Uma vez instalados, fomos explorar o bairro.  Na esquina das Ruas Infanta (Calzada de Infanta) e San Lázaro, entramos numa livraria chamada “Alma Mater”, que é ligada à Universidade de Havana. Muita coisa boa. Escolhi dois livros, pensando que o preço na etiqueta fosse em Cucs. Ao passar no caixa, só recebiam em pesos cubanos (portanto os livros eram de graça). Que faço? Não tenho pesos cubanos aqui comigo. Vá na agência de correios ao lado e troque alguns Cucs por pesos cubanos. Fui. Troquei apenas 4 Cucs (10 reais) no correio e com isso levei sete bons livros. Absolutamente de graça.

Dali fomos conhecer a Copelia, a famosa sorveteria cenário do filme Morango e Chocolate. Decepção total. Um lugar de onde se deve fugir. No centro de uma praça há algumas construções. Quando você entra na praça, achando que está passeando, é abordado por um guarda dizendo que você está furando a fila. Pergunta também se vai pagar em Cucs ou pesos cubanos. Se tiver pesos cubanos é enviado para uma das filas,  vai pro meio da galera, do povão. Se você tem Cucs, é conduzido para a área de estrangeiros, uma sala no primeiro andar, sem janelas, com uma tevê ligada, onde é servido um sorvete caríssimo e péssimo, péssimo. Fuja.

Lugar de comer no Vedado é mesmo no La Roca, como aconselhou Dona Agustina. A enorme e deliciosa paella a 12 Cucs (30,00 reais) é magnífica

ADEUS A CUBA

Dissemos adeus a Cuba em 09 de novembro de 2013.

Adiós a Cuba é o nome de uma das danças cubanas do compositor Ignacio Cervantes (1847-1905). Viveu tempos no exílio na época das guerras de independência de Cuba. Essa composição foi tema do filme Morango e Chocolate. Soa muito triste. Tem-se a impressão, nos movimentos da música, que o compositor agarra-se a alguma coisa para não ter de ir-se, para não partir involuntariamente. Súbito, alguma força o arranca e o manda embora, sem comiseração (para o exílio).

Adiós a Cuba

A pequena peça musical Adiós a Cuba, de Ignacio  Cervantes,  tem melodia triste, nostálgica, plena de melancolia.    Após a súplica inicial, repetida, sentida, lacrimosa, no meio da obra há uma inflexão, de pesarosa desistência, como se uma grande lágrima fluida, de inexorável adeus, de inevitável adeus, irrompesse, e com ela levasse os pais, os amigos, os amores, todas as alegrias, a paisagem verde, as flores do jardim, os animais de casa.

[1] Como disse o jornalista estadunidense David Simon no texto EUA, um país dividido, publicado aqui no GGN/Blog do Nassif

[2] Citação inspirada na Resenha de Francisco Quartim de Moraes sobre o livro de Domenico Losurdo Stalin: história crítica de uma lenda negra

[3] A Face da Guerra – Martha Gellhorn – Tradução de Paulo Andrade Lemos e Anna Luisa Araujo – Editora Objetiva 2009

[4] Demarchi – colaborador do GGN/Nassif postou em 15/09/2012 um texto sobre o assunto.

[5] Dois parágrafos anteriores são citações de um texto de Marcelo Rubens Paiva no Estadão: Escola de tortura vira hotel 5 estrelas, de 10.07.2013

Nove dias em Havana, por zegomes | GGN

16/10/2013

Vinicius de Moraes (1913-1980), Barbado

Filed under: Vinicius de Moraes — Gilmar Crestani @ 9:22 am
Tags:

 

Vinicius de Moraes (1913-1980)

José Steinsleger

Como en aquella época no ejercía el periodismo, lamento no haber entrevistado a Barbado. Pero en su hermosa crónica sobre lo que Ipanema fue, el periodista Sergio Kiernan recuerda aquel día de 1962, en el bar Jangadeiro, cuando Barbado se sentó bajo la mesa del actor y dibujante Hugo Bidet y el pescador Kabinha, y “…pidieron un bol, le sirvieron una cerveza helada y lo bautizaron por la barbita que le asomaba bajo la quijada”.

Barbado era un perrito callejero que recorría los bares de Ipanema, y “…aceptaba ecuménicamente los chops que le sirvieran” (En la vereda del sol, Kiernan, Radar, Página 12, Buenos Aires, 9/1/2000). Y en derredor, mientras los militares tornaban más y más inseguro el ambiente, los bares que habían inspirado a los fundadores del movimiento que dio en llamarse bossa nova empezaban a perder brío y alegría.

En el Veloso (que por razones de marketing hoy se llama Garota de Ipanema y ya no es lo que fue), Barbado tenía otros amigos de la bohemia carioca. Algunos de los antiguos comensales, aseguran que con un discreto guau, Barbado festejaba los versos y acordes que ensayaban Vinicius de Moraes y Antonio Carlos Jobim al ver pasar la menina (niña), llena de gracia “…caminho do mar”.

Heló Pinheiro, la menina (Heloisa Envida Menezes Paes Pinto), que sigue guapa y pronto cumplirá 70 años, contó alguna vez que su novio de aquel entonces (y actual marido) quiso enfrentarse a puñetazos con Jobim, quien llegó a pedirle varias veces que se casara con él, a pesar de los 18 años de diferencia entre ambos. Aunque celebra que al final terminamos como amigos en una relación de afecto y reconocimiento.

Sin embargo, Vinicius siempre aclaró que en La Garota se propuso cantar al gran amor de ayer mismo pasó y ya no vuelve más. Y ajustándonos a su amigo Eric Nepomuceno, el vate también creía que “…siempre habrá una mujer a la espera con los ojos llenos de cariño, y las manos llenas de perdón”. ¿Será? Las nueve esposas que Vinicius tuvo en vida (y que una tras otra arrojaron la toalla), dirían “hummm…”

Mas ¿qué culpa tuvo el sol que hace 100 años, calentando un poco más las frías aguas de Río de Janeiro, engendró del mar aquel semidiós corto de vista, no muy apuesto, creyente y para colmo comunista, que jamás hizo esfuerzo para que todas las mujeres cayeran rendidas a sus pies?

La fórmula no fallaba. Vinicius tomaba la guitarra, y con ronca y melodiosa voz entonaba: “Se todos fossem iguais a vocé / Que maravilla viver… Amar sem mentir /nem sofrer /Existiría verdade / verdade que ninguém vé / se todos fossem iguais a vocé”.

A más de poeta, Vinicius fue diplomático, cronista y… censor cinematográfico. “Llama al presidente y pídele que cierre todos los cines / Ya no soporto trabajar de censor…” (El falso mendigo, Novos poemas, 1938). Y profeta. En 1948, en el consulado de Los Ángeles, escribió a su amigo Pablo Neruda:

A ti te atacarán por la espalda / los vendepatrias de tu país en forma de cuchillo / Tu patria en forma de cuchillo, que un día / ha de incorporarse ensangrentada / por la sangre de la cobardía y la maldad. Así, 25 años después: “Que año tan sin criterio / éste del setenta y tres / que se llevó al cementerio a tres Pablos de una vez… /Pablos de muchos caminos: Neruda, Casals, Picasso… /tres líderes cuya muerte / el mundo entero sintió… oh año triste y sin suerte: ¡la puta que te parió!”

El 18 de marzo de 1976, Vinicius recibió otro golpe. Voy a comprar cigarrillos y regreso, dijo el pianista Francisco Tenorio Cerqueira a Vinicius, Toquinho y los músicos que por esos días se hospedaban en el hotel Normandie de Buenos Aires y actuaban en el teatro Gran Rex. Pero cuatro hombres vestidos de civil, bajo el mando del torturador y genocida Alfredo Astiz, lo secuestraron en la avenida Corrientes y nunca más apareció.

El pensamiento político de Vinicius fue diáfano y transparente como sus poemas. En alguna ocasión le preguntaron: ¿para qué sirven los poetas? Respuesta: para no ser presidentes de la república. ¿A usted no le gustan los intelectuales? Respuesta: sólo cuando se van a Europa a gozar de las vacaciones, o cuando duermen el sueño de los justos. ¿Por qué no le gusta el sol? Respuesta: tal vez porque él se traga los hombres de la realidad.

A su muerte, Eric Nepomuceno escribió en Sábado, el suplemento cultural del unomásuno histórico: Vinicius se murió una mañana de miércoles en un mes de julio. Nada puede ser menos carioca que un miércoles, principalmente si es un miércoles de julio. Suele lloviznar en Río, cuando es julio. Y los miércoles suelen ser aburridos en todas las ciudades del mundo.

El último poema de Vinicius, O haver (El haber), fue publicado en el anteúltimo número de la legendaria revista Crisis, dirigida por Eduardo Galeano (39, julio de 1976). Uno de los doce cuartetos dice así:

“…Resta la comunión con los sonidos, este sentimiento / de la materia en reposo, esta angustia de la simultaneidad / del tiempo, esta lenta descomposición poética / en busca de una sola vida, una sola muerte, un solo Vinicius”.

La Jornada: Vinicius de Moraes (1913-1980)

Nélida Piñón, vista da Espanha

Filed under: Literatura,Nélida Piñón — Gilmar Crestani @ 7:26 am
Tags:

 

Nélida Piñón, la reina de las letras brasileñas (I)

Por: Víctor Núñez Jaime | 14 de octubre de 2013

495856La villa española de Guernica acababa de ser destruida por aviones alemanes cuando nació Nélida Piñón en 1937 en Río Janeiro, Brasil. Sus abuelos eran emigrantes gallegos que habían dejado familiares en la península ibérica. Por esta razón, desde niña, Nélida viajaba varias veces a España. Poco antes de que cumpliera 10 años, decidió dedicarse a las letras. Parecía lógico porque crecía rodeada de libros que disfrutaba leer. “Yo estoy muy agradecida con mis padres porque me dieron una cuenta abierta en tres librerías de Río de Janeiro. Pero nunca controlaron mi lectura, ni hubo censura. Yo leía sobre todo libros de aventuras. Y me estimulaban, casi me urgían a que yo me hiciera parte de las aventuras. Pero pensé que sólo había una manera: ser escritora. Y dije: el escritor es aquel que sólo tiene la propiedad de escribir porque ha vivido aventuras. Me encantaban los libros del Oeste americano, los almanaques de Flash Gordon. Tenía una pasión por Los tres mosqueteros. Bueno, eso es hasta hoy, porque voy a París y siempre visito el lugar de las batallas de los mosqueteros. O sea: hasta hoy, yo soy una aventurera, por lo menos mentalmente”, cuenta.
No obstante, Nélida Piñón primero estudió periodismo y luego filosofía. Fue hasta 1961 cuando comenzó su obra novelística con Guía-mapa de Gabriel Arcanjo. Y desde entonces empezó a cosechar varios reconocimientos como el Premio del Pen Club en 1985, el Juan Rulfo diez años después, el Internacional Menéndez Pelayo en 2003 y el príncipe de Asturias en 2005. Ha sido profesora en las universidades de Harvard, Georgetown, John Hopkins, Columbia y Miami, además de otras instituciones en Francia, España y Perú. Fue la primera mujer en presidir la Academia Brasileña de las Letras. La han calificado como una de las mejores embajadoras de Brasil y de su lengua.
Su obra se caracteriza por ser una mezcla de realidad, fantasía, ilusiones, sueños, memoria y reflexiones. En cada uno de sus libros es ella y, al mismo tiempo, los otros. En su discurso de aceptación del Premio Juan Rulfo 1995, expresó: “Tengo el placer de servir a la literatura con memoria y cuerpo de mujer. Narro porque soy mujer. Narro porque desde mis orígenes cumplo con una creencia proteica. Bajo el ardor de la vida, bajo la epifanía de las palabras, me toca asumir todas las formas humanas.”
Ahora explica aquella precisión que dijo en Guadalajara (México): “Vivimos en un laberinto sin salida. El laberinto tiene una entrada, pero jamás salida. Mientras estás buscando la salida, estás viviendo la vida. Te puedes encontrar con  flores, con un pedacito de pan, con una botella de vino… O sea: todo puede pasar dentro del laberinto. Somos hijos de laberintos. Si uno entiende la naturaleza compleja de cada cual, es más fácil vivir. En mi persona y en mis textos no existe la simplificación de la vida. Sólo complicidad, porque somos así. Y si reconocemos que somos así, es mucho más fácil convivir. Hay que aceptar el juego de la seducción para ablandar nuestra animosidad.”
Cuando se le pide que haga una autocrítica de su obra y diga aquello que considera deficiente en su forma de escribir, por un momento se desconcierta, abre totalmente sus pequeños ojos y levanta las cejas. “Nunca nadie me había preguntado eso. Pero es muy interesante”, responde, para luego agregar: “Yo creo que mi forma de escribir no está mal. Pero si me dijeras que quién quiero ser, te diría que Shakespeare o Cervantes. Pero como no soy ninguno de ellos, estoy muy contenta de ser Nélida porque he hecho todo lo que he podido. Me satisface que he servido en algo a la literatura.”
—Entonces, desde una visión retrospectiva y autoanalítica, ¿ninguno de sus textos o parte de ellos la ha decepcionado? —se le insiste.
—No, no. Es que yo soy muy natural. Claro, de pronto pienso que si volviera a vivir determinada experiencia, actuaría distinto. Pero no me reprocho nada. Lo que sí deseo es que la vida me sorprenda con un texto mejor y que yo pueda seguir exigiendo lo mejor de mi, como lo hago siempre. Yo soy muy exigente. Trabajo meticulosamente, asombradamente, el lenguaje.
Quizá por esto que dice ahora, Nélida Piñón ha definido a la novela como “un gran texto arqueológico.” Tan sólo para escribir Voces del desierto, donde recrea los días de Scherezade y reinventa la fascinación de Las mil y una noches, realizó una investigación sobre Medio Oriente durante cinco años y leyó tres veces el Corán.
“No pretendí hacer una ficción erudita, pero sí que el texto tuviera todos los elementos a su servicio. Yo tenía la  intención de hacer una novela que entronizara la imaginación, el arte de fabular. Todos los libros nacen de esto, sí. Pero quería poner más énfasis para poder observar la imaginación y la fabulación humana. Por eso elegí a Scherezade. En Oriente Medio hubo una excedencia de imaginación a partir de un paradigma del monoteísmo. La imposición de un Dios y la aceptación de que nadie podía verlo, es un milagro de la imaginación. Ingresaron a la esfera de lo abstracto y a partir de ahí todo es posible y cualquier ejercicio de imaginación es aconsejable. Pensé que sería muy interesante el mundo del desierto en donde la historia costura lo que el viento deshace. A ese pueblo pobre, la imaginación le devuelve la vida”, explica.
Pero la también autora de Dulce canción de Caetana ha salido del mundo del desierto para escribir un libro sobre Homero. Se trata de un conjunto de ensayos que tituló Aprendiz de Homero. “Todos nosotros —dice— somos eternos aprendices de Homero. En este libro hay un texto pequeño en donde digo: Homero sólo existe porque yo existo. Nosotros lo hemos eternizado. Todos somos discípulos y cómplices de Homero. Sin esa complicidad habría una ruptura. Hay escenas en la Iliada y en la Odisea que uno dice: yo he vivido esto. Es algo absolutamente extraordinario.” CONTINUARÁ…

Nélida Piñón, la reina de las letras brasileñas (I) >> Periodista en Serie >> Blogs EL PAÍS

Autor

Víctor Núñez JaimeVíctor Núñez Jaime es un escribidor de historias. Estudió periodismo y literatura hispanoamericana. Sabe que el periodismo es más de nalgas que de cabeza, porque hay que estar sentado durante largos ratos escribiendo, corrigiendo… Es autor de tres libros: Un periodista ante el espejo, Los que llegan. Crónicas sobre la migración global en México y Una cabrona de Tepito. Ha ganado, entre otros, el Premio Nacional de Periodismo Cultural (México) y el Premio a la Excelencia Periodística de la sociedad Interamericana de Prensa. Con libreta y pluma en mano, sale a por las historias. Contrasta estadísticas con los testimonios de la gente. Visita a los escritores y periodistas de renombre. Está obsesionado con el buen uso del idioma español. Le apasiona leer y estudiar. Devora libros. Él es lo que ha leído. Y también lo que ha escrito.

11/09/2013

Pinoshit!

Filed under: Chile,Ditadura,Pinochet — Gilmar Crestani @ 9:07 am
Tags:

 

Mapa literario del golpe de Pinochet y sus secuelas

Hace 40 años, el 11 septiembre de 1973, la vida de Chile cambió con el golpe de Pinochet y la muerte de Allende

Repasamos las obras literarias clave que cuentan aquel episodio y sus consecuencias y su aporte a la Historia

Rodrigo Pinto Santiago de Chile 10 SEP 2013 – 12:42 CET5

Fotograma de ‘La muerte y la doncella’, de Polanski, basada en la obra de teatro homónima de Ariel Dorfman.

El golpe de Estado de Pinochet, la muerte de Salvador Allende en el Palacio de la Moneda y la dictadura en Chile han proporcionado a las artes, y particularmente a la literatura, un material excepcionalmente poderoso para redibujar el imaginario del país y desde ahí iluminar con más crudeza y estremecimiento la historia reciente de Chile. Sin duda que otros oficios y disciplinas como el periodismo de investigación y la historia también han contribuido a revelar lo que está detrás de las versiones oficiales y la enumeración cronológica, pero es en la novela, el cuento y la poesía donde mejor se revela el poder de la palabra para construir un relato que tiene más fuerza y hondura.

Cientos de libros —y decenas en el presente año— ilustran un proceso de reflexión artística histórica y crítica que no tiene visos de cesar. Es una literatura que crea una cartografía de Chile en constante renovación. Uno de los títulos más universales es La muerte y la doncella, la obra de teatro de Ariel Dorfman, llevada al cine por Roman Polanski, sobre una víctima de la tortura y la transición democrática de Chile. Hoy, en su 40º aniversario, el golpe se ha vuelto omnipresente en la escena ciudadana, en exposiciones fotográficas, en actos públicos, en columnas periodísticas, en obras de teatro, lanzamientos o reediciones de libros.

EL GOLPE

Quien mejor abordó el horror que de inmediato se instaló en Chile tras el golpe es Roberto Bolaño en Estrella distante, a través de un personaje inolvidable, Carlos Wieder, infiltrado en un taller de poesía que cultiva una siniestra forma de arte a partir de la tortura y la desaparición de detenidos. Tiempo que ladra, de Ana María del Río, es una interesantísima novela de formación —que desgraciadamente no ha sido reeditada— estructurada por la relación entre la protagonista y su padre, que llega a ser ministro del Gobierno de Allende y sufre luego la brutalidad de la represión. De amor y de sombra, popular novela de Isabel Allende, establece un relato coral de los efectos de la dictadura tras los primeros años del golpe. No es gran literatura, pero tiene el mérito de narrar un momento histórico con un estilo cercano a muchos lectores.

En crónica, destaca Golpe, de los periodistas Margarita Serrano y Ascanio Cavallo, libro que reconstruye, con nuevos testimonios —la primera edición es de hace diez años—, “las 24 horas más dramáticas del siglo XX” en Chile. Cavallo es coautor también de otro libro crucial para entender la dictadura, La historia oculta del régimen militar, junto a Manuel Salazar y Óscar Sepúlveda. Una reciente publicación más académica, Ecos mundiales del régimen militar, editada por los cientistas políticos Patricio Navia y Alfredo Joignant, recoge textos aparecidos en la prensa extranjera y escritos por destacados historiadores como Eric Hobsbawm.

De ensayo y poesía

Tratándose de Chile, no hay que extrañarse de que la poesía presente una riquísima veta de reflexión y trabajo de la memoria respecto del golpe y la dictadura. José Ángel Cuevas es uno de los poetas que ha tomado esa línea desde sus recuerdos del golpe hasta el deslavado presente de la política. Rodrigo Lira, que se suicidó en 1981, a los 32 años, dejó atrás una colección de poemas entre los que destaca 4 trescientos sesenta y cincos y un trescientos sesenta y seis de onces, críptico título que captura de manera magistral los cinco primeros años -sin ninguna referencia concreta- de la dictadura militar. Juan Luis Martínez incluyó en La nueva novela un poema que podría emparentarse con Casa tomada, el cuento de Julio Cortázar, pero que en realidad es una muy sutil y sobria manera de referirse a los detenidos desaparecidos. En este ámbito el libro cumbre es, sin duda, Canto a mi amor desaparecido, de Raúl Zurita, un poemario donde la fuerza épica de la poesía del autor alcanza sus máximas cumbres en la evocación y lamento por esos cuerpos torturados y asesinados condenados además a perderse en el fondo del mar o en tumbas ignotas donde se les niega a sus cercanos hasta el consuelo del recuerdo y el homenaje. Enrique Lihn y Diego Maquieira son otros poetas que desde la ironía o el esperpento, en libros como París, situación irregular o La Tirana, retrataron magistralmente la sofocante atmósfera del Chile de la dictadura. Y Parra. El Parra de los Sermones del Cristo del Elqui y Hojas de Parra, poeta imperecedero que siempre ha logrado adelantarse a su tiempo con una mirada tan irrepetible como inolvidable.

EL EXILIO

Carlos Cerda —que volvió en 1984— escribió la mejor novela sobre el exilio —Morir en Berlín, 1993—, que funciona como un doble epitafio, el de la dictadura chilena y de la caída del Muro de Berlín. Otra gran novela sobre el exilio chileno, Cobro revertido (1992), pertenece a José Leandro Urbina, que pasó sus años de lejanía del país natal en Canadá. Recientemente, Juan Forch publicó Las dos orillas del Elba, novela que aborda el exilio desde un ángulo mucho más humano y lúdico que político y dramático.[LADDOBLE]

LAS CÁRCELES SECRETAS

El mismo Cerda escribió La casa vacía, novela que se inicia cuando una pareja compra una casa en un antiguo barrio santiaguino. La casa —según comprueba con espanto una de las invitadas a la fiesta de inauguración— era uno de los centros de detención y tortura de la policía secreta. José Miguel Varas, otro retornado, también escribió dos cuentos, Pikinini y La perra —estampas, más bien, breves y demoledoras— sobre el paso por este tipo de cárceles. Entre los libros testimoniales destacan sobre todo dos obras antiguas, Estadio Nacional y Chacabuco, de Adolfo Cozzi, un joven estudiante en ese entonces que supo captar con mesura inigualable su paso por dos campos de detención. El centro de detención Villa Grimaldi, uno de los más severos de la dictadura, ha motivado numerosas crónicas periodísticas y testimoniales, entre las que destaca Una mujer en Villa Grimaldi, de Nubia Becker.

LA VIDA EN LA DICTADURA

El díptico novelístico de Roberto Bolaño sobre su país de origen se completa con Nocturno de Chile. En esta última novela, Pinochet aparece como personaje y el protagonista, un crítico literario, le hace clases de marxismo. Dos personajes secundarios, los señores Oido y Odeim (Odio y Miedo) representan las fuerzas dominantes y perversas que dominaron el período. Formas de volver a casa, de Alejandro Zambra, pone en escena lo que significó crecer en el seno de una familia de izquierdas en un suburbio santiaguino. En la misma línea, pero con carácter testimonial, acaba de aparecer Volver a los 17, editado por el periodista Óscar Contardo, que le pidió testimonios de su infancia y adolescencia bajo la dictadura a escritores y periodistas nacidos entre 1969 y 1979, entre los que se cuentan Zambra, Rafael Gumucio y Patricio Fernández. Una de las últimas novelas es Nadar desnudas, de Carla Guelfenbein, sobre los últimos días del gobierno de Allende y los primeros de la dictadura.

PINOCHET

En su novela Tengo miedo torero (2001), Pedro Lemebel logra una contradictoria hazaña: aunque la novela trata más bien de la resistencia y de amores homosexuales, la impostación de la voz de Pinochet es lo que más auténtico suena en ella. Una crónica publicada este año por el periodista Juan Cristóbal Peña: La secreta vida literaria de Augusto Pinochet, que comenzó como una investigación de lo que señala el título —cómo el dictador llegó a tener unos 55.000 volúmenes, muchos de ellos raros y valiosos; el conjunto fue valorado en 2,3 millones de euros—, y se transformó en una semblanza biográfica que sigue el hilo de la relación de Pinochet con la lectura, la docencia y la escritura de sus propios libros y muestra mucho más del verdadero carácter del personaje que la biografía canónica escrita por el historiador de derechas Gonzalo Vial. Respecto de los Pinochet, la periodista Alejandra Matus anuncia para octubre Doña Lucía, biografía no autorizada de la mujer del dictador. Ninguna bibliografía sobre Pinochet puede omitir la monumental investigación Yo, Augusto (2003), de Ernesto Ekaizer, corresponsal de EL PAÍS en Londres cuando el dictador chileno fue detenido a causa de un requerimiento del juez español Baltazar Garzón.

ALLENDE

En estos días aparece Allende. La biografía, de Mario Amorós, un texto de más de 700 páginas que aspira a circunscribir a un personaje inagotable, un político de raza del viejo Chile republicano, tipo humano que se ha extinguido por el doble flujo de la transición pactada y el paso desde la rica y elaborada retórica del discurso —Allende fue un maestro— a la cuña televisiva. Pero su más próxima y brillante biografía la escribió Eduardo Labarca, que por razones familiares conoció a Allende desde muy niño. Su particularidad está explícita en el título: Salvador Allende, biografía sentimental (2008), puesto que desde ahí, desde su compleja historia emocional, Labarca traza una línea que explica muy bien la identidad de Allende, más allá de los avatares que lo situaron como presidente de Chile al cuarto intento.

Memoria y arte

Las siguientes son algunas de las actividades culturales que se realizan estos días en Chile con motivo del 40º aniversario del golpe de Pinochet:

Imágenes de la memoria: fotografías sobre el trabajo de la Vicaría de la Solidaridad en los años setenta. Hasta el 15 de septiembre en el Centro Cultural Estación Mapocho.

Víctor sin Víctor Jara: familiares de ejecutados, músicos y actores representan la cantata sobre el cantautor. Hasta el 29 de septiembre en el centro cultural GAM.

Allende, noche de septiembre: obra teatral sobre Salvador Allende y el bombardeo de La Moneda. Hasta el 29 de septiembre en el centro cultural GAM.

Registros de golpe, instalación de la dictadura: exposición de documentos que dan cuenta de casos de tortura. Martes 10 de septiembre en el Museo de la Memoria.

Rostro: video centrado en la morfología de las víctimas de violaciones a los derechos humanos. Martes 10 de septiembre en el Museo de la Memoria.

Puestas en escena: 40 años: teatro y danza basadas en testimonios sobre el día del golpe. Miércoles 11 de septiembre a las 12.30 horas en el centro cultural GAM.

Aquí están: instalación con una veintena de actores recreando testimonios de víctimas de la dictadura. Miércoles 11 de septiembre en el Museo de la Memoria.

Mapa literario del golpe de Pinochet y sus secuelas | Cultura | EL PAÍS

24/05/2013

Fazendo Eco: cultura é crise

Filed under: Crise Financeira Européia,Umberto Eco — Gilmar Crestani @ 9:25 am
Tags:

 

“La cultura no está en crisis; es crisis”

La Universidad de Burgos lo ha investido doctor ‘honoris causa’

En esta entrevista expone su visión de Europa, EE UU, la cultura y la (las) crisis

María Antonia Sánchez-Vallejo Burgos 23 MAY 2013 – 22:07 CET48

Umberto Eco, ayer en la Universidad de Burgos. / Cristobal Manuel (EL PAÍS)

Umberto Eco (Alessandria, 1932) ha llegado a Burgos como el peregrino que remata su andadura en Santiago: con la sensación de haber cumplido una promesa. “Cuando tenía 20 años y preparaba mi tesis sobre estética medieval, veía que el modelo de los portales románicos que estudiaba eran las escenas del Apocalipsis de [las iglesias de] Castilla y León. Uno de los más bellos Apocalipsis se encontraba en Burgos, aunque ya no existe. Además, al escribir El nombre de la rosa tenía en mente la idea de un bibliotecario ciego también de Burgos, de Silos; es decir, todas mis fantasías han pasado por aquí”, cuenta satisfecho. El semiólogo recibió ayer en la Universidad de Burgos un doctorado honoris causa —“el 39º”, recuerda— en Historia Medieval.

El escritor, autor de ensayos sobre cómics y de novelas exitosas como la citada, de 1980, o El péndulo de Foucault (1989) —ejemplos de lo que los críticos han dado en llamar, no sin reparos por la contradicción, best sellers cultos—, aparenta veinte años menos y apenas si utiliza un bastón para apoyarse; de hecho, arrastra más las erres que las piernas. La víspera ha estado trepando por las escaleras de un archivo burgalés “donde se encuentran ejemplares con más de mil años de antigüedad, y sin embargo nadie es capaz de decirnos cuánto nos va a durar un USB…” La conversación va de la ceca a la meca y vuelve a las andadas, del libro al ciberespacio; a juzgar por las continuas referencias informáticas, podría deducirse que si tuviera que reeditar su clásico Apocalípticos e integrados (1964), el célebre ensayo sobre la comunicación de masas, podría renombrarlo Apocalípticos y enRedados. De la Galaxia Gutenberg a la Galaxia Internet, el semiólogo italiano teje una sutil tela de araña plagada de referencias librescas y detalles tecnológicos y de actualidad a los que solo pone un coto: ni una palabra sobre política italiana o la crisis europea.

En Europa han muerto 40 millones de personas. Pero la comodidad de atravesar las fronteras sin papeles ha hecho olvidar todo eso”.

Cosa extraña esta última, porque su discurso está empapado de un entusiasta fervor europeísta, aunque no deja de reconocer la crisis de ideas (o la lucha de tópicos) actual. “Sí, Europa está dividida en dos estratos: uno superior con una profunda identidad europea; usted lo sabe todo sobre el Fausto de Goethe, nosotros todo sobre Don Quijote, tenemos una cultura común. He encontrado hace poco una página bellísima de Proust, en el último volumen de En busca del tiempo perdido, cuando cuenta desde París la guerra contra los alemanes y cómo bombardeaban estos la ciudad, y sin embargo los personajes, que sabían que podían morir bajo las bombas, escribían artículos sobre Schiller. La clase intelectual (francesa), al margen de la guerra, continuaba sintiéndose europea. Esto no sucede con personas de otro medio intelectual, que no han comprendido todavía que tienen la suerte, por primera vez en cincuenta años, de no estar matándose entre ellos. En Europa han muerto 40 millones de personas. Pero la comodidad de atravesar las fronteras sin papeles ha hecho olvidar todo eso”.

Para forjar más Europa, Eco reivindica fórmulas de intercambio como el Erasmus. “Ha sido una gran idea, no solo porque ha permitido conocerse, e incluso casarse, a europeos de distintos países, y permitirá crear en las próximas décadas una clase dirigente al menos bilingüe… Pero fuera de ese nivel es muy difícil. En un congreso de alcaldes europeos en Florencia, propuse para los trabajadores [municipales] un intercambio parecido al Erasmus, y salió un alcalde de Gales, y dijo: “Me la sopla que uno de los míos vaya a Ámsterdam; en todo caso a Londres… (risas)”.

Entre los oscurantismos de nuestra época, el medievalista destaca el racismo, aunque, como en todo, también en eso haya clases. “Es fundamental que la gente se encuentre entre sí en situaciones no conflictivas, el racismo se produce no cuando un español va a Turquía, sino cuando un turco viene a trabajar a España. El verdadero racismo es siempre el racismo del pobre contra el pobre, los ricos no son racistas porque no les afecta. Los pogromos fueron así, contra judíos, pero también contra los rusos más pobres. El problema es hoy el racismo debido a la inmigración, que no tiene nada que ver con la posibilidad de una educación europea. Si desaparece este sentido de la unidad europea estamos perdidos. Antes Europa podía contar con la ayuda de EEUU, hoy a Estados Unidos Europa se la sopla, ahora tiene sus problemas con China, con India… Europa tiene que arreglárselas sola”.

Hablando de Europa, resulta imposible sustraerse a la palabra crisis, aunque orille adrede lo político. ¿La crisis le sienta mal a la cultura, la perturba mucho o, al contrario, la espolea? “La cultura es una crisis continua. La cultura no está en crisis, es una crisis continua. La crisis es condición necesaria para su desarrollo”. ¿Y la mercantilización del producto cultural, o el riesgo de privatización del patrimonio? Es un fenómeno que en realidad tiene muchos siglos de antigüedad, recuerda Eco, en referencia al patrocinio privado de actividades culturales (la restauración del Coliseo romano por una firma de zapatos, o los palacios venecianos propiedad de grandes fortunas que exhiben su poderío y su logo): “Eso siempre ha existido. Virgilio era pagado por Augusto; Ariosto cobraba de un duque. De alguna manera, si yo hubiese vivido en el siglo XVII habría debido estado al servicio de un señor; hoy no, mi trabajo literario o docente me permite vivir. En este sentido, la cultura es hoy más libre. Todos los textos en el ochocientos se inician con una loa al señor, al rey, es como si hoy tuviese que encabezar todos mis libros con un elogio de Berlusconi (risas)… Es justo que una empresa colabore con fondos para restaurar el Coliseo de Roma…”

En sus múltiples escritos Eco ha dejado dicho que la verdadera felicidad es la inquietud por saber, por conocer. “Es lo que Aristóteles llamaba maravillarse, sorprenderse… La filosofía siempre comienza con un gran ohhh!” ¿Y el conocimiento es acaso como el viaje a Ítaca de Kavafis, un recorrido que no debe terminar jamás? “Sí, pero además el placer de conocer no tiene nada de aristocrático, es un campesino que descubre un nuevo modo de hacer un injerto; evidentemente, hay campesinos a los que esos pequeños descubrimientos procuran placer y a otros no. Son dos especies distintas, pero naturalmente depende del ambiente; a mí me inoculó el gusto por los libros de pequeño… Y por eso al cabo de los años soy feliz, y a veces infeliz, pero vivo activamente mientras que muchos viven como vegetales”.

Un bibliómano como Eco ha integrado la presencia de Internet en su vida diaria como en su día hiciera con el automóvil o el telefonino (que no suena ni una vez durante el encuentro): como un hecho consumado ni manifiestamente bueno ni todo lo contrario. “Internet es como la vida, donde te encuentras personas inteligentísimas y cretinas. En Internet está todo el saber, pero también todo su contrario, y esta es la tragedia. Y además si fuese todo el saber, ya sería un exceso de información… Si yo comienzo a estudiar en la escuela necesito un libro así [hace un apócope con las manos], no uno enorme, que no entenderé, a nadie se le ocurre darle la [Enciclopedia] Británica a un niño…”

Internet es una cosa y su contraria. Podría remediar la soledad de muchos, pero resulta que la ha multiplicado"

Como investigador, Eco utiliza Internet como lo que considera que debe ser, una herramienta, y no un fin en sí mismo. Por tanto, no augura conflictos de intereses -ni de espacios- entre lo virtual y la realidad tangible del papel, bien sea prensa o un volumen de mil páginas. “Se puede leer Guerra y paz en ebook, obviamente, pero si lo has leído hace diez años, y lo retomas, el libro objeto te mostrará los signos del tiempo y de la lectura previa… Releerlo en un ebook es como leerlo por primera vez. Es una relación afectiva, como ver de nuevo la foto de la abuela (risas)… El libro como objeto continuará existiendo, de la misma manera que la bicicleta sigue existiendo pese a la invención del automóvil; es más, hoy hay más bicicletas que hace unos años. Lo mismo podemos decir del fin de la radio por culpa de la televisión…”.

“Internet es una cosa y su contraria. Podría remediar la soledad de muchos, pero resulta que la ha multiplicado; Internet ha permitido a muchos trabajar desde casa, y eso ha aumentado su aislamiento. Y genera sus propios remedios para eliminar ese aislamiento, Twitter, Facebook, que acaban incrementándola porque relaciona con figuras muchas veces fantasmagóricas, porque uno cree estar en contacto con una bellísima muchacha que en realidad resulta ser un mariscal de la Guardia Civil… (risas)”.

El doctor honoris causa se despide recomendando una lectura de prensa casi con lápiz y papel. “Los periódicos han perdido muchísimas funciones. Por la mañana lo hojeo rápidamente porque las noticias principales ya me las ha contado la televisión, pero continúa siendo importante por los editoriales, por los análisis, y es fundamental no leer uno, sino al menos dos cada día. Se debería enseñar a leer periódicos a la gente, dos o tres, para ver la diferencia entre las opiniones, no para conocer las noticias, eso ya nos lo dice la tele”.

La televisión, esa tele vulgarizada hasta el extremo por obra y gracia de ese Berlusconi de quien sigue resistiéndose a hablar más que de pasada, pero que vino a ser, en versión embrionaria, la gran revolución sociocultural que Internet fue después. “La televisión en Italia ha hecho mucho bien a los pobres, les ha enseñado un nivel estándar de idioma, y mal a los ricos, que se quedaban en casa en vez de ir a un concierto. Y no hablamos de ricos o pobres en función del dinero que tengan, sino de ideas, de ganas. La televisión en Italia ha enseñado a hablar a masas de campesinos, obreros, en la Italia unificada. Internet es lo contrario: a los ricos que lo saben usar, les va bien; los pobres, que no lo saben usar, no tienen capacidad para distinguir”.

“La cultura no está en crisis; es crisis” | Cultura | EL PAÍS

21/05/2013

Mengele/Priebke em Bariloche

Filed under: Bariloche,Cinema,Josef Mengele,Nazismo — Gilmar Crestani @ 8:33 am
Tags:

Barioloche

Por Oscar Ranzani

LUCÍA PUENZO
En Wakolda, la película que presenta hoy en la sección Un Certain Regard del Festival de Cannes, la cineasta dibuja una inquietante historia con centro en Josef Mengele. “Para mostrar lo monstruosos que eran estos tipos hay que retratarlos en toda su complejidad: eran muy cultos y podían camuflarse en una sociedad. ¿Cuántos en Bariloche han dicho que Priebke era un viejito adorable?”

Martes, 21 de mayo de 2013

CINE › LUCIA PUENZO HABLA DE WAKOLDA, UN FILM QUE INDAGA EN LOS VINCULOS QUE ESTABLECIAN LOS NAZIS FUGADOS

“Estas historias siempre me intrigan”

En la película que se verá hoy en el encuentro francés, el médico que experimentó con judíos prisioneros en los campos de concentración va encantando, uno a uno, a los miembros de toda una familia. Especialmente a la hija preadolescente Lilith.

Por Oscar Ranzani

@Hace seis años, cuando Lucía Puenzo debutó como cineasta con XXY, comenzó a trazar un camino propio para no ser considerada únicamente como la hija del director de La historia oficial. La realizadora nacida en Buenos Aires en 1976 es también escritora. Y su segundo largometraje, El niño pez, fue una adaptación de su novela. Ahora volvió a realizar una adaptación para su tercer film de una novela propia: Wakolda. Así como XXY compitió en la Semana de la Crítica del Festival de Cannes 2007 y ganó el premio de esa competencia, esta vez Puenzo espera volver con un galardón bajo el brazo de tierra francesa: hoy presenta, en carácter de première mundial, Wakolda, en la prestigiosa sección Un Certain Regard del Festival de Cannes, antes de su estreno en la Argentina, previsto para el segundo semestre del año. “Es el mejor lugar donde la película puede empezar su vida”, admite Puenzo a Página/12. Y reconoce que “fue una noticia doblemente festejada”, porque el anuncio de las películas que estaban en la competencia oficial se hizo dos semanas antes del de Wakolda, que finalmente fue seleccionada para la segunda sección en importancia después del concurso oficial. “Ya estar en Un Certain Regard es un premio gigantesco. Hay tres películas latinoamericanas en toda la competencia. Entonces no voy con más expectativas que ser parte de ese listado de nombres”, confiesa la directora.

La historia de Wakolda transcurre en 1959 en Bariloche. Allí se encuentra escondido el criminal nazi Josef Mengele, que realizó experimentos genéticos horrorosos con los prisioneros durante los tiempos en que Adolf Hitler estuvo en el poder. Pero en Bariloche es el médico veterinario José y anda escapando del Mossad. Allí, camuflando su identidad, entabla una relación con una familia argentina, integrada por Enzo, Eva y sus hijos. Pero con quien entra en confianza rápidamente, a través de un juego de seducción –con el que busca esconderse tras la máscara de un hombre sin fines perversos–, es con Lilith, la hija de doce años del matrimonio argentino, que tiene problemas de crecimiento y con la que experimentará la “cura” a través de un tratamiento con hormonas que, de algún modo, supone buscar alcanzar la “perfección humana” que tanto anhelaba en sus tiempos. Poco a poco, José –el “Angel de la Muerte”, como quedó definido para la historia– va ganándose la confianza de esta familia hasta que llega a hacer negocios con la fabricación de muñecas junto a Enzo. Con protagónicos de Natalia Oreiro, Diego Peretti, Elena Roger y el catalán Alex Brendemühl, entre otros, Wakolda escarba en el mundo oscuro de un criminal disfrazado que busca su lugar en el mundo que lo aleje de pagar las culpas que debe. Y también en cómo se relaciona con un entorno desconocido al que debe mentirle todo el tiempo para no ser descubierto.

Puenzo comenzó a escribir la novela no sólo con la idea de combinar un personaje histórico con otros ficcionales sólo por el peso de un ser siniestro como Mengele: “Empecé por el personaje de Lilith, la niña, porque había algo que sigue pasando aun hoy con la medicina: esto de estandarizar a los cuerpos para conseguir cuerpos perfectos y ‘normalizarlos’. Así como la medicina es el mejor invento, tiene un costado de cruce de ética médica o de cruce de umbral hacia un lugar ligado al poder más oscuro que a mí siempre me inspiró mucho temor. Y desde ese lugar empecé a escribir la novela”, subraya Puenzo. Mengele “es como la expresión más perversa del costado más oscuro de la medicina. Y hace años que venía siguiendo temas de los nazis en nuestro país. Es algo que siempre me intrigó y hay un montón de historias para contar, no sólo ésta. Cada jerarca nazi que se evaporó en nuestro país es una historia de por sí. Hay mucho mito dando vueltas y ésta era una de las posibilidades”, explica la cineasta.

–La medicina asociada al poder es también un arma, ¿no?

–Sin duda. En un primer momento no estaba claro hasta qué punto la visión biomédica en el nazismo no era tangencial al movimiento bélico. Estaba en el corazón del nazismo: el lugar que ocupaban los médicos, la limpieza racial, llegar a la perfección racial, no era algo lateral y tangencial. Y esa fascinación con la genética, que es como la cima de la omnipotencia, es algo que está en el centro de la novela y de la película.

–¿Qué mantuvo y qué modificó de la novela en la película?

–Muchísimas cosas, porque el corazón temático de la novela tiene que ver con la pureza y con la mezcla. Y el lenguaje de la literatura tiene que ver con lo intangible. Y como el lector completa e imagina, te permite trabajar con cosas más intangibles. Las imágenes son imágenes y, en un punto, uno tiene que bajarlas a tierra, y cuando intentaba hacer una transcripción literal de la novela a la película era inviable, absolutamente imposible. Entonces, en un momento, la decisión fue buscar otra trama posible, que tiene que ver, pero que juega otra posibilidad.

–¿Cuando escribió la novela le resultaba muy cinematográfica? ¿Cuándo supo que también podía ser una película?

–Mucho tiempo después, como al año y pico. De hecho estaba trabajando en otro proyecto que estaba mucho más encaminado, pero me empezó a intrigar qué pasaba con ese material.

–¿Definiría el film también como un thriller psicológico?

–Tiene muchos elementos del thriller, pero también una mezcla de géneros. Tiene algunos puntos de contacto con cosas que pasaban en XXY: de personajes encerrados en un lugar. En XXY, la historia sucedía en una casa y acá es en una hostería. Y en el medio de un lugar de horizontes muy abiertos que en XXY era una playa, y en Wakolda es el lago Nahuel Huapi, en las afueras de Bariloche. Pero, de alguna manera, todo se resuelve entre un grupo de personajes a los que les está pasando algo en un mismo lugar. Wakolda tiene más elementos de thriller por todas las peripecias de lo que está ocurriendo para encontrar a este hombre.

–¿Investigó más la historia del “Angel de la Muerte” para realizar la película, o con lo estudiado para la novela era suficiente?

–Mientras escribía la novela me pasé años leyendo cualquier cantidad de libros históricos, de mitos. Me reuní con historiadores, con médicos endocrinólogos. Entonces ya tenía un bagaje. Leí sobre todo el costado esotérico del nazismo. Hay muchísimos historiadores y poetas del nazismo, incluso. Son materiales absolutamente tóxicos porque es como el costado más locoide y fanático del nazismo. Y para mí era importante meterlo en esta historia porque era un componente de cómo el nazismo imaginaba su repliegue: todo ese invento de la ciudad subterránea, de los superhombres, de la pureza racial, era muy fanático y extremo. Y estaba en contacto absoluto con la locura. Y tiene que ver con el lugar con el que se encuentra Mengele cuando se evapora.

–¿Decidió incorporar un personaje histórico para la ficción porque le daba mayor suspenso al relato? ¿Cómo combinó lo ficcional con lo histórico en la película?

–Desde la novela, y se mantiene en la película, hay un cruce entre muchos elementos de la realidad y algunos elementos ficcionales. Y hay una mezcla en la que, a veces, no se distinguen unos de otros. Hay muchos elementos reales. Se sabe que Mengele vivió en Buenos Aires, que tenía una farmacéutica que figuraba con su nombre en la guía telefónica, que huyó cuando lo capturaron a Eichmann, que reapareció en Paraguay. Y hay un período misterioso y turbio que no se sabía dónde estaba. Y ahí se enmarca la historia. Muchos dicen que pasó en algún momento por Bariloche, pero obviamente la familia protagónica es ficcional. Sí es real lo que se dice, que siguió experimentando con niños y mujeres embarazadas, y trabajando con su sangre. O sea, hay un imbricado absoluto entre qué elementos son reales y cuáles son ficcionales. Hay un mito dando cuenta que tuvo un contacto con el diseño de muñecas arias.

–¿La película indaga en la red de complicidades de la comunidad alemana en Bariloche?

–El mayor interés para la novela y la película eran los vínculos personales entre Mengele y esa familia, y cómo él va seduciendo, a su manera, a cada miembro de esa familia. En la película crecieron los personajes de los padres y los hermanos, aunque Lilith es la protagonista absoluta. Me acuerdo de la película Teorema, en la que el personaje iba enamorando a toda una familia. Acá pasa algo parecido: él los va seduciendo de a uno y ellos van bajando un poco la guardia. Le permiten entrar a su hostería, aunque la relación entre Enzo y Mengele es más compleja en la película que en la novela. Enzo, el personaje que interpreta Peretti, tiene muchos más recelos con este tipo, pero necesita su dinero. Es más una relación de necesidad.

–¿No cree que puede resultar un tanto perturbador para el espectador que a varios de los personajes Mengele les resulte alguien querible?

–Sin duda, son perturbadoras la película y la novela. Creo que para mostrar lo monstruosos que eran estos tipos hay que retratarlos en toda su complejidad. Si uno genera estereotipos donde los malos son malos, se está haciendo un mal porque la cuestión de la complejidad de estos tipos es que eran hombres muy fanáticos, muy perversos. Realmente encarnaban lo peor a lo que puede llegar la condición humana, pero eran muy complejos en el sentido de que eran muy cultos, podían camuflarse. Y por eso eran más peligrosos fuera de los campos de concentración. ¿Cuántos en Bariloche han dicho que Priebke era un viejito adorable? Eran “viejitos adorables” porque sabían camuflarse. Creo que, en realidad, hay que animarse a retratarlos así porque eran así, eran mucho más complejos. Y ése era el gran peligro que tenían. Y por eso estaban con tanta connivencia con civiles que nunca pudieron imaginar quiénes eran.

–¿Cómo trabajó el juego de seducción que se produce entre Mengele y Lilith?

–Eso varió de la novela a la película porque justamente en la novela es algo que se puede sugerir mucho más que lo que se ve. Y cuando empecé a trabajar en la película me parecía que era mucho más terrible que todo el tiempo la sensación fuera: “Puede hacer cualquier cosa, pero no lo hace” (aunque eso no lo redime ni lo justifica), y no cruzar la línea como la novela sugiere. Ese es otro camino en la película: es un lobo mucho más contenido.

–Algo que puede desprenderse de la historia es cómo y de qué manera puede llegar a formarse la conciencia política en un adolescente. ¿Cómo lo expone el film?

–Los chicos prepúberes y adolescentes empiezan a tener una construcción de su identidad política desde mucho más chiquitos de lo que creen. Ahí hay como una macerado lento, pero que se está gestando algo. Y en ese sentido me interesaba desde qué lugar los personajes de Lilith y de su hermano mayor empiezan a tener una conciencia política del caldo en el que están metidos, de esa escuela alemana a la que los llevan, las redes de complicidad, los pactos de silencio. Como ese genial documental Pacto de silencio, de Carlos Echeverría, que para mí es el mejor documentalista vivo que tenemos. Cuando empecé a escribir Wakolda, lo llamé y le pedí estar en contacto, y me ayudó muchísimo.

Discutir con una misma

Como escritora y cineasta experimentada, Lucía Puenzo se refiere a las ventajas y las desventajas de adaptar un guión cinematográfico de una novela propia. “Las ventajas son que uno puede hacer lo que quiere con el material, no hay que discutir con nadie más que con uno mismo. Y las desventajas son lo mismo: creo que, a veces, uno cree que por conocer tan íntimamente un material va a poder manejarlo mejor”. Sin embargo, Puenzo observa que, en algunas ocasiones, “eso genera trampas porque a uno le gustan algunas escenas y hay que ser despiadado y quitarlas desde el principio, y cuesta más porque a uno le gustan. Y tarda más en llegar al momento en que uno se da cuenta de que eso tiene que morir para que otra cosa crezca. Pero, al mismo tiempo, podés jugar más porque sabés qué hacer”, subraya la realizadora.

Diferencias de lenguaje

Puenzo entiende como “procesos radicalmente diferentes” la escritura de una novela respecto de un guión cinematográfico. “La sensación es que cine y literatura son lenguajes mucho más cercanos de lo que realmente son. Tienen muy pocos puntos de contacto”, explica. Lo único que comparten, según Puenzo, “es que hay palabras involucradas en ambas cosas, pero mi sensación es que en la literatura todo avanza microscópicamente”. A tal punto, que reconoce que en un muy buen día “puedo llegar a escribir una media página o una página. Pero seguramente esa página que escribí la reescriba muy poco porque cada frase es un juego de musicalidad, de ritmo, de ver qué palabra va con qué palabra. Esto es muy personal porque hay gente que escribe veinte páginas en un día. A mí me pasa esto y puedo escribir a donde va la siguiente página”. Y agrega que escribir literatura “tiene mucho más que ver con el juego de no saber. Uno puede permitirse no saber, pero en el cine todo es medido, hay que trabajar con la estructura dramática y el guión es una herramienta de trabajo para un montón de gente; entonces, tiene que ser claro. Son procesos muy diferentes”, entiende Puenzo.

Página/12 :: espectaculos

18/04/2013

Libros que hasta un adulto entiende

Filed under: Juan Gelman — Gilmar Crestani @ 8:00 am
Tags:

Quem curte livros é de esquerda. Quem não curte não é de nada… E quem curte Juan Gelman é só ler o Pagina12, onde é colunista, acessível na internet… 

Juan Gelman y José Emilio Pacheco presentan ‘Había otra vez’, una colección de textos ilustrados convertida también en exposición que rompe las barreras entre niños y mayores

Bernardo Marín México 18 ABR 2013 – 06:37 CET1

José Emilio Pacheco y Juan Gelman, durante el acto. / PEP COMPANYS

Los poetas José Emilio Pacheco (Ciudad de México, 1939) y Juan Gelman (Buenos Aires, 1930) son vecinos del barrio de La Condesa, en la capital mexicana pero casi no se ven. Y no es por falta de afecto, sino por la desmesura de la ciudad y porque Pacheco anda delicado y ya no puede practicar una de sus grandes aficiones: pasear por las calles. “Te vería más si vivieras en Buenos Aires”, bromea el mexicano. Pero cuando se juntan los dos premios Cervantes parece como si trajeran un guion preparado, para divertirse ellos y divertir al público. La última actuación del dúo se celebró este miércoles en la presentación de Había otra vez, una colección de libros que se ha convertido también en exposición o al revés: textos para niños de seis a 99 años de Gelman y Pacheco, y también de Alberti, de César Vallejo y Alfonsina Storni, ilustrados por conocidos artistas gráficos, cuyos dibujos se exhiben hasta el 5 de mayo en el Centro Cultural de España en México.

La presentación, moderada por el escritor, editor y traductor argentino Alejandro García Schnetzer, giró así en torno a la infancia, o a lo que queda de ella durante toda la vida, porque la propuesta pretende romper las barreras entre niños y adultos. Pacheco recopiló en su libro, El espejo de los ecos, “ilustrado por Juan Cisneros o tal vez escrito para los trazos del dibujante”, varias adivinanzas, unas tomadas de la tradición griega clásica, otras inventadas. Y se las propuso al público con suerte desigual en las respuestas. Algunas, como “dices mi nombre si callas”, fueron resueltas rápidamente por los asistentes. De otras, como “en mi dominio soy rey, en el tuyo soy esclavo”, la solución quedó en el aire.

Para su libro, ilustrado por Eleonara Arroyo, Gelman escogió “un sucedido, porque sucedió de verdad” que le contó de niño su madre, ucrania emigrante en la Argentina: la historia de una araña que preguntó sorprendida a un ciempiés cómo podía moverse un bicho con 92 patas más que ella; si primero movía 50 y luego las otras 50, si las movía de diez en diez, de cuatro en cuatro o de una en una. Una cuestión que dejó al ciempiés tan confundido en su reflexión que nunca más volvió a caminar. Y tanto le impresionó esta historia en verdad a Gelman que cuando le preguntan en una entrevista cómo hace para escribir o por qué sigue escribiendo, responde que es un tema sobre el que prefiere no pensar mucho. Para que no le pase como al ciempiés y nunca más vuelva a componer un verso.

A preguntas de Schnetzer, ambos evocaron sus primeras lecturas infantiles. Gelman recordó que a sus diez años leía historietas y poesía española e incluso trataba de escribir poemas. No retiene el título de los primeros versos que compuso, porque trata de olvidar todo, pero si se acuerda de algo: “Ella se llamaba Ana”. El primer libro de Pacheco fue El Príncipe Feliz, de Óscar Wilde, a los seis años, y después, El Coyote y la serie Hombres del Oeste, de Marcial Estefanía. El poeta mexicano demostró un ánimo extraordinario y ganas de charlar: de la literatura infantil pasó a la traducción, paró un rato por Bizancio y hasta hizo una reflexión sobre la bomba de Hiroshima. Tan entusiasmado andaba, que se rebeló cuando acabó el tiempo de la charla y propuso a los asistentes seguir conversando fuera, “que aquí hace mucho calor”.

Dice Gelman que le gustó mucho la idea de hacer un cuento infantil porque la literatura para niños está infantilizada, como si sus lectores fueran tontos o no supieran comprender las cosas. Y sí saben, aseguró el poeta argentino, como demuestra el cuento de la madre que quería hacer comer a su hijo porque “si no comía la comidita, vendría un pajarito se posaría en su platito y se comería todito”, a lo que el niño contestó: “Pues vaya pajarito de mierda”. Los asistentes rieron la ocurrencia de Gelman durante diez segundos. Pero la mejor prueba de que quizá los adultos sean niños atrofiados la dio César, de seis años, posiblemente el más joven de los presentes, que celebró al menos durante un minuto y con grandes carcajadas la ocurrencia del argentino. Obviamente había entendido algo que los demás no captaron.

Libros que hasta un adulto entiende | Cultura | EL PAÍS

15/04/2013

Julio Bressane

Filed under: Cinema,Julio Bressane — Gilmar Crestani @ 7:40 am
Tags:

“Para mí el cine siempre fue una dificultad, pero también un placer y un descubrimiento”, afirma Júlio Bressane.

Imagen: Guadalupe Lombardo

Lunes, 15 de abril de 2013

CINE › ENTREVISTA AL DIRECTOR BRASILEñO JULIO BRESSANE, QUIEN SE CONSIDERA UN “EXPULSADO DE LA CLASE CINEMATOGRAFICA”

“El cine es un instrumento de autotransformación”

El festival programó una retrospectiva con diecisiete de las cuarenta películas de este realizador “maldito”, quien afirma haber sido “censurado por el sistema cinematográfico brasileño y la burocracia”, pero está lejos de bajar los brazos.

Por Ezequiel Boetti

Tenía razón Marcelo Panozzo, director artístico del Bafici, cuando, durante el anuncio oficial de la programación, catalogó a Júlio Bressane como uno de los directores “más secretos y ninguneados del cine latinoamericano”. El cineasta carioca filmó cuarenta películas. Todas inéditas en la Argentina, e incluso muchas de ellas también en Brasil, donde él y Rogério Sganzerla –a quien el Bafici ’10 le dedicó una sección– fueron “expulsados de la clase cinematográfica” luego de fundar, en 1970, la productora Belair, uno de los bastiones centrales de aquel movimiento llamado Underground, opuesto en forma y contenido al autorismo del Cinema Novo tan en boga en aquellos años. “Pararme enfrente no fue una decisión consciente, sino que el destino, mi sensibilidad, mi manera de vivir, de ser y de crear películas me llevó a esa posición. Yo no había programado nada. Eso generó un tabú a mi alrededor”, reconoce el brasileño ante Página/12. Se trata, entonces, de un cineasta que bien podría rotularse como “maldito”, y que además carga con una obra prolífica e interesante. Un combo demasiado tentador para los programadores del festival porteño, quienes decidieron dedicarle una de las jugosas retrospectivas de esta edición.

Nacido hace 67 años en Río de Janeiro, Bressane siempre supo mantenerse por fuera de los cánones tradicionales, apostando por una libertad narrativa y visual por momentos rayana en lo experimental. Cineasta precoz (“empecé a filmar a los 11, pero la complejidad y el esfuerzo que requiere el cine vendría después”) y curtido al calor de la complejidad social, política y económica carioca, Bressane estrenó su primer film en 1967, Cara a cara. Un par de años después llegaría el turno de O anjo nasceu y Matou a familia e foi ao cinema, dos de las diecisiete películas que se verán durante el Bafici. Al año siguiente, la fundación de Belair lo encontró en su pico de máxima expresión creativa, llegando a filmar “siete películas en tres meses”. “Eran historias muy preparadas y organizadas a nivel producción para que pudieran hacerse en un tiempo corto y casi sin dinero. Así trabajo incluso hasta hoy”, recuerda. Exiliado en Londres en 1970, el regreso lo encontró con más presiones estatales destinadas a invisibilizarlo, aunque logró mantener un ritmo de producción que hoy le permite llegar a las cuarenta películas en toda su carrera. La sección abarcará desde sus primeras experiencias hasta la más reciente O batuque dos astros (2012), conformando así un pantallazo de toda la vida creativa del cineasta. “Todas las películas que hice para mí fueron muy importantes, y hoy cargan con una fuerza que no pensé que tendrían al momento de hacerlas”, afirma el director.

–Usted empezó a filmar a los 11 e hizo su primer film a los 21. ¿Por qué ese acercamiento tan precoz?

–Bueno, empezó como un juego, pero después las películas me fueron llevando a un lugar que no esperaba. El cine apareció como un organismo intelectual sensible que me empujó por sobre las artes y las ciencias para llevarme más allá de mi propia vida. Es un instrumento radical y exigente de autotransformación. Y a partir de que acepté esa complejidad, me esforcé –y me esfuerzo– para cumplir con ese destino.

–En varias entrevistas dijo que hace películas “por necesidad”. ¿De dónde proviene esa sensación?

–Si supiese no haría más películas. Filmo porque siento una necesidad patológica de cine, y esa patología engendró mi estilo. Estas películas, sobre todos las primeras, tienen una fuerza enorme de lo no actual. Son aprehensiones figurativas que están en función de algo infinito y transitorio que no se puede controlar. No podría vivir si intentara localizar esa sombra. Para mí el cine siempre fue una dificultad, pero también un placer y un descubrimiento.

–En el libro que publica el Bafici dice que usted y Sganzerla “fueron expulsados de la clase cinematográfica”. ¿Fue para tanto?

–Sí, fue así. En 1970 llegamos a producir siete películas en tres meses. Habíamos aprendido y nos esforzamos para encontrar una buena manera de filmar. Pero en ese momento se creó la entidad estatal Embracine y nos pusimos en su contra. Pero cuando la mayoría de nuestros colegas tomó ese poder, nosotros terminamos expulsados incluso hasta hoy. Fue la historia de un terremoto clandestino. Por eso nadie sabe nada de mis películas.

–¿Por qué cree que no circula su cine?

–Por la censura del sistema cinematográfico brasileño y la burocracia. Ellas hacen que todas las películas, al igual que ocurre en el mundo entero, se hagan con dinero estatal. Y el público no quiere eso. El cine, tal como lo conocíamos, desapareció. Lo que hay hoy es otra cosa. Ya no tiene un cerebro, sino que copia el modelo televisivo con imágenes esterilizadas sin significado ni poesía. Hay que ver qué ocurre con el paso del tiempo, pero quizá sea necesario un olvido generalizado para continuar. En ese contexto, el Estado mantiene el negocio, y mis películas casi no son exhibidas.

–¿Cómo lidia con eso?

–Tengo muchos problemas para hacer circular mi cine porque los recursos están cada vez más lejos, además de que usualmente me encuentro con gente, e incluso periodistas, que no conocen mis películas ni saben quién soy. Con mucha dificultad en los últimos años mi producción se mantuvo constante. Ahora bien, es cierto que mis trabajos no se mostraron ni son conocidos. Acá, en la Argentina, por ejemplo, nunca se había exhibido ninguna de mis cuarenta películas.

–¿Eso no le quita las ganas de filmar?

–No, porque mi deseo no depende de otros. Nunca hice películas para el público sino para mí. Las ganas surgen desde mi interior y aún hoy no han disminuido. Mi trabajo está relacionado con la memoria y con la supervivencia de las formas. Es un trabajo de observación sobre los cambios y las migraciones de las formas.

–Rogério Sganzerla decía que el cine no tiene que abrir un agujero en la pared, sino funcionar como una ventana al mundo. ¿Coincide con esa definición?

–No conocía esa frase, pero estoy de acuerdo. Todo lo que venía de Rogério era bueno. Todo. Fue quizás el cineasta más grande de la historia de Brasil. No era apenas un tipo talentoso, sino un genio. Y hay una diferencia fundamental entre talento y genio de la que se habla siempre. El primero tiene una fuerza que perfecciona y controla, el segundo, en cambio, es controlado por esa entidad. Rogério tenía las dos cosas: era poseído por su genio y trabajaba a partir de esa posesión. Fue un cineasta genial que fue criminalmente tratado por el cine brasileño y que nunca logró desarrollarse todo lo que hubiera podido.

Página/12 :: espectaculos

02/04/2013

Victor Heredia, boa música com caráter e ética

Filed under: Música,Victor Heredia — Gilmar Crestani @ 9:50 am
Tags:

Heredia actuará el próximo viernes 12 de abril, a las 21.30, en el Teatro Opera Citi.

Imagen: Pablo Piovano

MUSICA › ENTREVISTA AL CANTAUTOR VICTOR HEREDIA, QUE PRESENTA SU NUEVO DISCO

“Siento que las luchas no fueron en vano”

El músico y escritor acaba de publicar el CD Algún día, en el que da cuenta de esperanzas y frustraciones. Y señala: “Con una cancioncita o un discurso no vas a modificar cosas. Hay que seguir empujando desde las políticas sociales”.

Por Facundo Gari

Ante cada pregunta, Víctor Heredia ríe. O, al menos, sonríe. Hace que su campera de cuero afloje. Después contesta. Para cada respuesta se sitúa en la alegría, aunque luego haga punto final en el dolor, viejo conocido: el cantautor es hijo, cuñado, hermano y tío de desaparecidos. Tal es la impronta de su nuevo aporte al cancionero popular de épica revolucionaria: el disco Algún día es la esperanzadora casa de diez canciones de su pluma que la mitad de las veces tienden a la pena. Diez canciones que presentará –entre clásicos como “El viejo Matías”, “Sobreviviendo” y “Todavía cantamos”– el viernes 12 de abril a las 21.30 en el Teatro Opera Citi, en Avenida Corrientes 860. Diez canciones cuyo repaso sirve de excusa para la charla con Página/12.

–El álbum arranca con la melancolía de un bandoneón: en “Cenizas de ayer” usted admite que hoy, a sus 66, entiende lo que fue, un poco lo que es. ¿Qué fue y qué es?

–Soy parte de una generación que fue muy vapuleada, en todo sentido. Que fue feliz hasta los años setenta, diría. A partir de entonces recibió la cachetada del “enemigo”, del defensor de lo que se pretendía modificar. Un enemigo importante, serio y maligno, que utilizó todo el aparato a su alcance, incluso el del Estado, para derrotar a aquel que se le oponía, justamente el movimiento popular. ¿Qué fui? Un tipo esperanzado, con una mirada hacia el futuro muy especial: creía que podíamos cambiar lo que teníamos delante con sólo desearlo. Trabajamos muchos de la mano, con inocencia, pero también con fuerza, y nos pegamos un porrazo tremendo con la dictadura del ’76. La tortura, la desaparición, los exilios, la muerte de amigos y las traiciones… ¿Qué soy? Tengo la mirada más acotada, más limitada sobre lo que pueda llegar a ser futuro. No quiere decir que haya cambiado la expectativa de modificar cosas, pero sé que cuesta.

–De hecho, el disco abreva de a ratos en cierto escepticismo.

–Sí. Pareciera que a una parte de la generación de los que hoy tienen 40 le gusta el escepticismo. No soy escéptico, igual. Yo siento que las luchas no han sido en vano. Le han puesto almohada, colchón y plumas al escéptico, que existe porque antes había utopías. Se han modificado cosas para que el escéptico pueda seguir usando su escepticismo, porque de otra manera todos estaríamos buscando comida en los tachos de basura. Hay una generación que reconozco escéptica. Y lo es con alguna razón. No obstante, en el disco no quise dejar solamente el escepticismo que reconozco sobre algunas cosas que no se han podido modificar en el planeta, como la mirada de la humanidad sobre el medioambiente y sobre sí misma, que es muy pobre. La demostración de que el continente funciona mejor cuando los gobiernos son democráticos y tienen ese punto de vista sobre sus economías parece no hacerle mella a nadie. La gente permite que se tergiverse la realidad. América mejoró muchísimo y, sin embargo, en referencia a algunos gobiernos se habla de dictaduras populares. Le ocurre a éste. ¿Cómo puede compararse con una dictadura como la del ’76, que fue aberrante, o con las de Lanusse, Levingston y Onganía, que no por menos aberrantes dejaron de ser dictaduras? ¿Cómo pueden compararse esas dictaduras con los gobiernos de Chávez, Correa o Lula? Me parece una estupidez. El disco y esa primera canción hablan de eso.

–Nutrirse incluso de los aspectos grises de la vida suele vincularse con la madurez. ¿Es su caso?

–Uno empieza a cansarse, a perder el humor sobre determinadas cuestiones. No sé si eso es madurar. Uno se pone nervioso y triste frente al poco avance del pensamiento analítico de los compatriotas. Todos estos años de experiencia democrática deberían haberles hecho entender quiénes son los que están haciendo algo bueno. A veces a los tropezones, lo cual también es cierto. Pero hay que reconocer el esfuerzo, por lo menos. Hay que distinguir a determinados individuos que siempre le han hecho mal a la Argentina de los que le quieren hacer un bien.

–Los militares y los civiles detrás de la última dictadura le han hecho mal. En referencia a ésta, en la canción “Algún día” le pide a la patria que cierre la herida. ¿En qué sentido?

–“Cierra tu herida” habla de esta trinchera que se ha abierto entre un sector y el otro, que es tremenda. En lugar de aquietarse, se hace más profunda, más seria y angustiante. Hoy no hay un debate lógico y argumentado respecto de posturas ideológicas o de clase. Lo que hay es un insulto. Para cerrar esa herida hay que reconocer lo que ha pasado, quiénes son los culpables y quiénes sus defensores. Cuando la gente empiece a darse cuenta de eso, la herida empezará a cerrar. Cuando toda la Argentina, su común denominador, incluso quienes son de derecha, se den cuenta de que es inaceptable vivir en un país sin decir la verdad, sin esgrimir justicia cierta y verdadera, la herida se cerrará. Vaticino un futuro en esa canción con respecto a los nietos recuperados: tendrán una mirada distinta y serán los combatientes de la Argentina que soñamos.

–Ese vaticinio puede ser interpretado, de manera más amplia, a modo de bienvenida a las formas de la memoria de las generaciones posteriores a la dictadura.

–Por supuesto. La historia que nos ha tocado vivir nos tiene demasiado protagonistas. Es difícil desembarazarse del dolor, de la lágrima, del terror. Las generaciones venideras verán en la dictadura una etapa histórica. La apropiación de la memoria es absolutamente válida. Es más, no hay otro camino. No puede ser el que se propuso en los noventa: ocultar todo bajo la alfombra.

–“Breve historia de las islas Malvinas” es un track pícaro: sortea rítmicamente la tristeza del abordaje usual del tema. ¿Por qué?

–Es que la escribí para Camilo, mi hijo de diez años. Con mucha inocencia, un día me preguntó: “Papá, ¿por qué todos dicen que las Malvinas son argentinas y allí viven ingleses?”. Le quise explicar y me di cuenta de que sabía muy poco. Entonces fui a indagar y refresqué algunas cuestiones que había olvidado. Recordé a Luis Vernet. Y fui aún más atrás, hasta Louis Antoine de Bouganville, que las colonizó para Francia. Luego aparece el reclamo de potestad de España, por la conquista de América, y el acuerdo por el que Francia vende las islas a 603 mil libras, una ganguita. Las recuperamos con la Revolución de Mayo. La participación de Vernet es muy importante. Mandado por Rosas, intenta establecer una cabecera de playa comercial en las islas. Más tarde, cuando una fragata de Estados Unidos ataca, en un acto medio alocado, los ingleses aprovechan, se meten y rompen todo. Cuento eso con una canción infantil, con un ritmo juguetón, lo cual no quiere decir que no mencione hechos dolorosos. De hecho, el final es un guiño a los ingleses.

–“Ahora, ¿dónde irán con tanta soledad/ y sin la paz y amor que el viejo Lennon supo imaginar?/ ¿Qué harán con tanta sangre nuestra sin nombrar?/ ¿Qué harán con tanto amargo llanto maternal?/ ¿Qué harán con nuestro amor soñando allende el mar?/ ¿Qué harán si el cielo les recuerda la verdad?/ ¿Qué harán, Malvinas Argentinas, dónde irán?”

–¿Qué van a hacer? Lo del plebiscito es tremendo. La solución, más allá de todo, es diplomática. Si los habitantes quieren tener la ciudadanía británica, adelante, pero el suelo es nuestro. Ahí está la cuestión de potestad patrimonial y económica. La bandera de las islas tiene que ser argentina.

–La canción está dedicada a los caídos en Malvinas. ¿Por qué no a los sobrevivientes de la guerra?

–Bueno, tiene que ver con eso. Algunos volvieron, pobrecitos, muy mal. Unos y otros fueron a dejar la vida. Pero hubo quienes utilizaron la guerra como herramienta política para eternizarse en el poder. Es lo que habrán pensado Galtieri y el resto de los comandantes. La realidad es que los que fueron en nombre del Ejército no sólo no cumplieron desde el punto de vista profesional sino desde el personal. Los generales actuaron livianamente. No voy a decir “cobardemente” porque nadie que va a la guerra es un cobarde. Asumieron inmediatamente la derrota y no cuidaron a nuestros chicos.

–Usted vivió dos exilios “breves” en Europa durante la dictadura, pero decidió volver a la Argentina por “obligación ética y moral”, según declaró. Entonces tuvo que vérselas con amenazas y censuras. A ésta le canta en “Canción censurada”, que parece remitir a la “langosta”…

–Es que “Informe de la situación” fue eso: se me ocurrió lo de la langosta y la gente lo entendió rápidamente. En “Canción censurada” quería hacer una broma en relación con cómo te volvés loco y difícil tratando de esquivar al censor. Porque muchos de nosotros seguimos tocando. Y le hicimos muy bien a la gente. En los conciertos, siempre me dicen que mantuvimos la puerta semiabierta, que fuimos un pie contra el marco. Eso hizo la cultura, que era lo que podía hacer. Cuando escribí “Informe…”, en el ’78, era impensable que pasara el tamiz de la censura. En el ’81, cuando la grabé, pasó. Y en el ’82 se trasformó en un éxito impresionante. Es el juego que propongo.

–El tema está dedicado a Silvio Rodríguez, y nombra al Che, a Neruda y a Walsh, figuras asociadas con la “revolución”, que como ícono ha sido usado por diversos palos políticos. En ese sentido, “Vuela conmigo” reclama: “No se envuelvan con banderas/ que escupieron con desprecio./ No me canten viejos himnos/ con hipócrita parada”.

–Descubrir en el discurso de determinados individuos la defensa de una simbología a la que nunca pertenecieron es hallar signos de hipocresía. Y la hipocresía está a la orden del día. Si la gente se pusiera a ver seriamente cuáles son las posturas ideológicas y qué se defiende detrás de cada una, sabría el camino a seguir. Esto no quiere decir que hay que estar a la derecha, a la izquierda o al centro. Quiere decir que hay que seguir lo posible. Los cambios tienen que ser auténticos. La gente tiene que recurrir a la realidad, no le pueden seguir contando el país. Tiene que enterarse de quiénes son los hombres y las mujeres que han hecho que nuestras vidas mejoren.

–No obstante esas mejoras, en “Los ojos del Che” asegura: “Mientras haya un niño sin hogar/, sin cobijo y sin amor,/ no me sirve esta canción”.

–Se han mejorado cuestiones sustanciales en la Argentina, y sin embargo, hay algunos bolsones en los que hay que trabajar muchísimo. Como parte de ese “ejército” de tipos que hemos querido modificar y mejorar la realidad, siento que hay mucho más por hacer. Con una cancioncita o un discurso no vas a modificar cosas. Hay que seguir empujando desde las políticas sociales y económicas para que se profundicen en aquellos sectores que todavía no han recibido el tan mentado equilibrio económico.

–Por ejemplo, el de los pueblos originarios, presentes en Algún día como en buena parte de su obra, de la que al respecto se destaca Taki Ongoy (1986, reeditado en 2006), un disco muy criticado por la Iglesia.

–Cuando hice Taki Ongoy se me vinieron encima todos los organismos cercanos a la Iglesia, ni hablar del monseñor Collino. La de los pueblos originarios es una madeja difícil de desenmarañar porque tiene quinientos años. Lo converso con mis hermanos del pueblo mapuche. Hay que entender que no ha habido, salvo en estos últimos diez años, una mirada sobre esta problemática. Es incipiente el intento de solucionarla, y a veces erróneo, pero hay que trabajar más en el análisis para que quienes han sufrido el escarnio de ser marginados por medio milenio tengan una devolución valiosa, que los haga sentir integrantes de la ciudadanía. Ahora el tema está instalado, sin dudas, y eso es muy bueno.

–En “La veleta de Armando” canta: “Yo conozco bien a esos tipitos y el sermón/ que preparan siempre que presienten, como hoy,/ que está cerca el tiempo de empezar a cosechar/ todo lo sembrado a fuerza de amar y sangrar”. Habla de la izquierda.

–Es el discurso de la supuesta izquierda purista, que siempre está reclamando lo que falta y niega lo hecho, en pos de su beneficio electoral. A veces es tan exagerada que pone en peligro situaciones democráticas que verdaderamente favorecen a la gente. Y pisan muy peligrosamente el terreno de la derecha, en contra de quienes intentan hacer cosas.

–En el álbum desliza que escucha la radio. ¿Cómo se informa?

–Escucho radio cuando manejo, pero veo noticieros. Tengo algunos diarios que me interesan y me informo con ellos. También leo las entrelíneas de otros medios que me asustan, que están todo el tiempo hablando mal de este país, tratando de hacerte entender que no sirve para nada. Me hacen acordar a la vieja educación de la primaria y la secundaria: todo lo que tenía que ver con nosotros no servía, lo de afuera era mejor. Aprendíamos celtas, griegos y romanos antes que coyas, guaraníes y tobas. ¡Si te largaban en la Patagonia con un libro de la propuesta escolar, te morías de hambre!

–Si bien posibilitan una lectura “social” por el uso de algunos signos, varios temas son en rigor románticos. Entre ellos, “Ahora” propone que ser feliz no es necesariamente no estar triste.

–Amar no es estar con una sonrisa todo el día. Al contrario, cuando uno asume una responsabilidad en una pareja se le vienen encima un montón de cosas y está bien que así sea. Pero frente a un mundo difícil como en el que estamos, el afecto inevitablemente me provoca tristeza. Y también la falta de tiempo: uno mira el almanaque y se da cuenta de que pasaron tantos años… Suelo preguntarme cuántos me quedan para disfrutar los afectos que tengo.

Declaración de principios

Llegó el punto en el que Heredia se pudrió de escuchar que “los artistas que apoyan este modelo lo hacen por dinero”. “Tienen razón: hicimos un ahorro de exilio, censura y persecución para cobrarlo ahora”, repite ahora una ironía que hizo carta de respuesta a la “infamia” hace año y medio. “No, estimados enemigos del progreso, no es por tan despreciable razón que acompañamos este modelo. Nuestra militancia tiene tantos años como cicatrices, tanta felicidad como lágrimas, tanto ayuno como renovada esperanza. Somos parte de un proyecto que comenzó hace mucho tiempo atrás y que fue encarcelado, desa-parecido, torturado y asesinado tantas veces como las que resucitó”, subraya la misiva, que se reprodujo en sitios de noticias, blogs y redes sociales. Si bien en ella reivindica los “logros” del Gobierno –sobre todo los vinculados con los derechos humanos, tema clave en su trayectoria– no dice explícitamente si se autodenomina kirchnerista, etiqueta que le endilgan en varias notas que gustan de agrupar artistas por simpatía política. El cantautor de Paso del Rey, que se ha presentado en varios recitales oficiales y de colectivos sociales, dice que no. “Fui admirador de la propuesta política de Néstor, pero soy cristinista –se define–. La Presidenta está tratando de cumplir los sueños de los pibes que fuimos. Desde ese lugar, los que reconocemos su trabajo no somos ningunos boludos.”

Un ajuste en la mira

Algún día cuenta con guitarras de Panchi Quesada, bajos de Ricardo Zielinski, baterías de Gustavo López y teclados de Gabino Fernández y Babú Cerviño, conjunto con el que Heredia se presentará en el Teatro Opera Citi. El disco suma también aportes de Daniel Homer, Fernando Nürnberg, Luis Gurevich y Lito Vitale. Es editado por Alternativo Americano, sello del propio cantautor, en un contexto que vaya si ha cambiado desde Gritando esperanzas (1968); en lo que refiere a circulación de obras musicales, por gracia de Internet, señala: “Van Gogh no se preguntaba al pintar si iba a tener alguna repercusión. Cuando uno graba no puede pensar en el resultado comercial. Quiero que el disco me dé placer y que despierte algo en quien lo escuche. La piratería sí es una preocupación porque el que roba lesiona intereses específicos: les quita el empleo a muchas personas, y detrás de cada una hay una familia. Es tarea de las industrias fonográficas encontrar un método para preservar esos derechos –sostiene–. Internet es un soporte extraordinario y una vía de difusión de la obra. Hay que ajustar la mira en un análisis profundo sobre cómo se hace para comercializar hoy el arte”.

La cuarta novela

La próxima Feria del Libro será el escenario en el que Heredia presentará su cuarta novela, Los perros (Planeta). “Es la historia de una familia marginal que sobrevive a orillas de un basural de Buenos Aires reciclando comida y otras cosas –adelanta el autor–. Me interesó ese tema porque en algún momento tuve contacto con chicos que tienen ese oficio.” Seguramente en el stand de Longseller se podrá conseguir además el reciente poemario/cancionero Aquellos soldaditos de plomo.

Dos amigos muy presentes

La canción “Momentos” está dedicada a Facundo Cabral, cantautor asesinado en Guatemala, en 2011. Heredia lo recuerda: “Vivimos momentos muy aciagos: estábamos en plena gira en el ’77, una gira absolutamente prohibida. Y siempre tengo en la cabeza mi primer Obras Sanitarias, en el ’82. Lo invité y vino con mucha felicidad, alegría y autenticidad”. Otra figura de la canción popular vernácula que aparece inevitablemente durante la charla es Mercedes Sosa. “Sigue siendo la mejor voz del continente y del planeta. Una mujer entrañable desde todo punto de vista. Además de una compañera, fue mi madrina artística: me cobijó, como a muchos.”

Página/12 :: espectaculos

Blog no WordPress.com.

%d blogueiros gostam disto: