Ficha Corrida

15/07/2014

Como se diz Pão e circo em alemão?

Filed under: Alemanha,Complexo de Vira-Lata,Copa 2014,Populismo — Gilmar Crestani @ 8:58 am
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Copa 2014

Seleção alemã chega a Berlim e é recebida por 500 mil pessoas

EFE

15 Julho 2014 | 07h 43

Elenco desfilou em carro aberto até o Portão de Brandemburgo, palco das grandes comemorações esportivas do país

A seleção alemã de Joachim Löw aterrissou nesta terça-feira no aeroporto de Tegel, em Berlim, pouco depois das 10h locais (5h de Brasília) em seu retorno do Brasil após conquistar pela quarta vez a Copa do Mundo, enquanto centenas de milhares de torcedores (estima-se mais de 400 mil fãs) esperam pelos heróis do tetra no Portão de Brandemburgo.

O avião especial da Lufthansa pousou no aeroporto de Berlim com mais de uma hora de atraso devido a um problema técnico detectado antes da decolagem no Rio de Janeiro. Centenas de pessoas e muitas câmeras de televisão esperavam a chegada do avião em Tegel e receberam com aplausos e gritos entusiasmados o capitão da seleção, Philipp Lahm, o primeiro a aparecer com a taça Fifa.

Após Lahm, foi a vez do restante da equipe, que pôde observar do alto, enquanto o avião sobrevoava a cidade, a multidão que os espera nas imediações do Portão de Brandemburgo, o coração "Fan Mile", o maior espaço público do país destinado às transmissões ao vivo das partidas do Mundial.

CHEGADA DA SELEÇÃO ALEMÃ A BERLIMMorris Matzen/Reuters

Jogadores alemães são recepcionados por mais de 500 mil pessoas na cidade de Berlim. Foi montado um palco de 30 metros, em frente ao Portão de Brandemburgo.

Lá estão concentrados desde o início da manhã os milhares de torcedores, que acompanharam sua chegada nos mesmos telões em que assistiram a todos os jogos da conquista do tetra no Brasil. A vitória no domingo, na final disputada contra a Argentina no Maracanã, veio após o gol de Mario Götze na prorrogação e gerou um entusiasmo futebolístico, misturado com certo patriotismo, em todo o país.

Trata-se do quarto título da seleção alemã – após as conquistas de 1954, 1974 e 1990 – e o primeiro que será comemorado junto ao emblemático monumento de Berlim, que desde 1999 voltou a ser a sede do governo e do Parlamento alemão.

Para a celebração, foi montado um palco de 30 metros onde são esperados o herói da conquista, o jovem Götze, e o restante da equipe, além da taça Fifa, diante de um mar de gente vestida com as cores da bandeira alemã, o amarelo, o vermelho e o preto.

O palco será o mesmo no qual a seleção alemã agradeceu ao público local pelo apoio recebido durante o Mundial sediado no país em 2006, quando a equipe terminou na terceira colocação. A organização anunciou que após o ato oficial com os jogadores, de uma hora de duração, a celebração continuará por mais cinco horas com diversas atuações musicais. São esperadas 500 mil pessoas nas comemorações.

A cidade receberá os campeões do mundo com um grande cartaz com a mensagem: "Obrigado meninos. Campeões do Mundo 2014"

24/07/2013

O Papa é pop

Filed under: Papa Francisco,Populismo — Gilmar Crestani @ 8:17 am
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Quando o papa prioriza o povo, é pop. Quando Lula e Dilma dão atenção preferencial ao povo, é populismo.

JANIO DE FREITAS

Os primeiros e depois

O papa lembrou as tais autoridades dessa entidade vulgarmente chamada de povo e por elas esquecida

A mudança no programa pedida pelo papa Francisco, para os seus primeiras contatos no Rio, justificou-se por sua doutrina pontifical, mas carregava também um oportuno efeito político.

"Primeiro o povo, as autoridades depois", como o papa pediu, na visão do mundo restaura um ofuscado sentido cristão; para as tais autoridades brasileiras, inclusive as religiosas, lembrou-as dessa entidade da vida vulgarmente chamada de povo e por elas esquecida, talvez pela força do hábito, na elaboração do programa para o primeiro dia da visita. Daí a mudança do programa.

As modificações sucessivas que o papa fez, lá de Roma, nos preparativos brasileiros de sua visita –a troca da suíte com móveis de estilo por um quarto simples, a alimentação sem requintes, o papamóvel aberto– mostraram que acompanhava com atenção tudo que ocorria por aqui. Logo, também a preocupação, para muitos uma certeza, com hostilidades diante do Palácio Guanabara durante sua estada ali.

A última intervenção do papa nos preparativos foi para retirar a ida direta do desembarque ao Guanabara. E no seu lugar introduzir um bom giro pelo centro da cidade, em carro aberto. Primeiro o povo. Mas, com isso, a aclamação nas ruas seria uma neutralização antecipada de eventuais manifestações negativas no Guanabara. Um indicativo de que manifestação negativa, ali, tinha outro destinatário que não o papa.

Para tranquilidade geral a respeito de hostilidades, a nossa brava Armada está com um vaso de guerra navegando em idas e vindas diante das praias, até o final do Leblon. É a mesma vigilância feita durante a Copa das Confederações, dado nunca se saber se o Equador, o Uruguai ou outra potência dos mares, valendo-se de momentânea distração dos brasileiros com um jogo ou com um visitante, decide tomar a zona sul do Rio.

No Guanabara, a manifestação que aproveitou a recepção ao papa eclodiu, como de suas tentativas anteriores, depois que o governador Sérgio Cabral não estava mais no lugar. Ainda assim, ficou um resultado importante da luta com a PM: a evidência de que os delinquentes fizeram um aumento inquietante na sua agressividade. Os coquetéis molotov deixam de ser esporádicos e se tornam usuais. É a intenção explícita de incendiar, sejam edificações, sejam pessoas, como método de baderna.

A quantidade de coquetéis molotov que as câmeras captaram em voo, naquela arruaça, indica que as prisões feitas pela PM foram em número insignificante, outra vez. Sobretudo de incendiários potenciais, caso, ao que se saiba, de um só preso com recipientes preparados.

Entregue ao planejamento do Exército, a "segurança" da visita do papa Francisco está baseada na hipótese de terrorismo. Mas o problema nem está na figura do papa, nem está no terrorismo. É pouco provável a burrice inominável de um ataque terrorista ao papa que prenuncia uma prática, e não só o gasto discurso, de maior compreensão das realidades atuais, para atenuar seus embates.

O problema é o risco de que violências baderneiras, aproveitando-se de prometidas manifestações contra determinadas intransigências da Igreja Católica, atinjam desprevenidos e indefesos. A PM ainda não dá conta desse tipo de risco. Depoimentos de pessoas presentes à recepção no Guanabara falam de momentos muito aflitivos na hora da saída.

Se as tais autoridades decidissem não ir a mais eventos do papa, seria muito bom para todos. Pode-se lançar um novo slogan: lugar de autoridade é em casa.

20/06/2013

Folha chama reinvindicações do MPL de populistas

Filed under: MPL,Populismo — Gilmar Crestani @ 7:55 am
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A Folha acusa os políticos e governantes de todos os partidos de não entenderem o Movimento Passe Livre – MPL. Ao que parece, a Folha entendeu mas não gostou. O Movimento Passe Livre que reivindica a redução das passagens do transporte urbano e agora o passe livre. Quando os governos de todos os partidos (Haddad-PT; Alckmin-PSDB; Eduado Paes-PMDB; Fortunati-PDT) atendem o pedido dos manifestantes, vem a Folha e chama isso de populismo. Isso mesmo, atender ao povo é populismo.

Atender à Folha, Veja, Globo, RBS, sim, é burrice!

Governantes apelaram para arma tradicional: o populismo

REDUÇÕES SUGEREM UMA MEDIDA PARA ACALMAR ÂNIMOS, APOIADA POR MARQUETEIROS EM PÂNICO

IGOR GIELOWDIRETOR DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

A redução das tarifas de transporte coletivo nas grandes capitais representou a rendição momentânea da política estabelecida a uma onda que ela não conseguiu compreender ainda.

E não foi qualquer "establishment". São as principais praças do país, governadas pelos mais importantes partidos, como o PT, o PSDB e o PMDB, para ficar com os exemplos de SP e do Rio.

Emparedados por uma força nova e insondável, que transbordou do mundo virtual para as ruas, curiosamente os governantes apelaram para uma arma tradicionalíssima: o populismo.

Porque é isso o que as reduções sugerem. Uma medida para acalmar ânimos, certamente apoiada por marqueteiros em pânico com o uso das imagens dos últimos dias no horário eleitoral em 2014.

Mas alguém irá pagar a conta, muito provavelmente a sociedade devido aos inevitáveis impactos econômicos do ato. Se ela será acompanhada nisso pelos interessados em manter o cipoal que compõe o tarifário do transporte, esta é uma interessante questão em aberto.

Claro que o MPL poderá agora protestar contra a "caixa-preta da tarifa". E a classe média que extravasou contra um pouco de tudo a seu reboque, igualmente.

Enfim, a medida aplacará as demandas que se veem das portas do Castelão às praças de BH, passando pelos centros incendiados do Rio e SP?

Exceto que os governos tenham serviços de inteligência excepcionais, que lhes tenham garantido que o Facebook era aparelhado pelo MPL e voltará a ser território de fotos de bichinhos fofos, apelos humanistas rasos e afins, não. As imagens do começo da noite de ontem em na TV não insinuavam prognóstico muito mais róseo.

Cabe perguntar se havia outra alternativa imediata para o problema, e a resposta talvez seja negativa.

Mas o argumento repisado por políticos de que a dificuldade em identificar interlocutores impossibilitava uma negociação clássica acabou por ser ignorado por Haddad, Alckmin, Paes e outros.

Quem estava visível do outro lado da mesa, o MPL paulistano, está longe de ser um ator usual e coerente –exceto na negação de negociar.

Acuados, governos acabaram por legitimá-lo, e por extensão legitimar os próximos candidatos a estrelas de um arremedo de democracia direta. Basta que o caldo siga fervente, e isso é imponderável até pela eventual exaustão física dos atos, e causas serão o menos importante.

Aí se encerra o grande risco político de terem dado a primeira piscada neste pôquer peculiar em jogo. O governo o fez por ter olhos; os manifestantes não os têm. Eles estão sob a máscara de Guy Fawkes, o carbonário do século 17 que inspira o protagonista de "V de Vingança".

13/06/2013

A rico, incentivo; a pobre, populismo

Filed under: Incentivo,Populismo — Gilmar Crestani @ 10:33 pm
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13 de Jun de 2013

Quando o caro amigo ou a cara amiga ler ou ouvir a palavra populismo, cuidado.

Em geral, é um adjetivo usado para desqualificar o que é bom para o povo.

Hoje, em editorial, o Estadão diz que o crédito facilitado para que os beneficiários do programa “Minha Casa, Minha Vida” comprem móveis e eletrodomésticos é “um ato populista”.

Porque “o Tesouro terá de subsidiar o novo programa de estímulo ao consumo”.

Curioso é que esse argumento não vale quando quem é estimulado é o capital, não o consumo.

Não há preocupação com quanto sai do Tesouro para bancar a elevação da taxa de juros. Nem com quanto deixa de entrar com o fim do IOF sobre investimentos estrangeiros.

Exigem superávits cada vez maiores, a qualquer preço, no Brasil. Mas os europeus, os EUA, o Japão, todos eles têm déficits astronômicos e ninguém os chama de populistas.

Quando Lula, em 2009, tirou o IPI de uma série de produtos para enfrentar a crise européia também não faltaram críticas deste tipo: populista, irresponsável, eleitoreiro.

E, se não fosse isso, a marolinha teria sido mesmo um tsunami.

O financiamento oferecido ao público do Minha Casa, Minha Vida, além do benefício imensurável que traz à vida doméstica de milhões de brasileiros de baixa renda, tem outros méritos.

Inclusive no combate à inflação.

Ao fixar valores máximos para os produtos elegíveis para a compra, a linha de crédito contribuirá para segurar os preços de várias linhas de consumo. Que empresa desejará, por alguns reais, deixar seus produtos fora dos limites do que pode ser financiado? Além disso, com a alta do dólar, o que é produzido aqui, com custos em real, será mais competitivo, certamente.

A roda da economia vai girar e é isso o que mantém a bicicleta equilibrada.

A finalidade das políticas econômicas é produzir bem estar, não superávits a qualquer custo social.

Isso não é populismo. Isso é considerar a economia um bem de todo o povo, não a economia para os bens de uns poucos.

Por: Fernando Brito

A rico, incentivo; a pobre, populismo | TIJOLAÇO | “A política, sem polêmica, é a arma das elites.”

26/09/2012

Rubens Casara: “Risco da tentação populista é produzir decisões casuísticas”

Filed under: Ação 470,Grupos Mafiomidiáticos,Poder Judiciário,Populismo,STF — Gilmar Crestani @ 8:18 am

publicado em 25 de setembro de 2012 às 17:20

por Conceição Lemes

Nesta segunda-feira 23, o julgamento da Ação Penal 470, o chamado mensalão entrou na nona semana. Muitos juristas o acompanham com preocupação. Alegam que princípios de respeito às garantias fundamentais, como “o ônus da prova cabe à acusação” e “não se pode condenar alguém com base em presunções”, estariam sendo deixados de lado.

“A Ação Penal 470 ilustra bem a encruzilhada em que se encontra o Poder Judiciário. O risco da tentação populista é que passe a produzir decisões casuísticas, para atender às expectativas do que é vendido pelos meios de comunicação como opinião pública”, observa Rubens Casara. “Isso é grave, pois princípios e teorias forjados durante a caminhada da Humanidade acabam esquecidos ou afastados para a produção de decisões direcionadas a dar essa resposta simbólica à sociedade.”

Esse risco aumenta quando as decisões casuísticas são produzidas pela maior Corte de Justiça do Brasil, como na Ação Penal 470, embora não sejam exclusividade dela.

“Acaba virando jurisprudência, pois as cortes inferiores tendem a reproduzí-las”, prossegue Casara. “Esse fenômeno o professor e ministro da Corte Suprema da Argentina Raul Zafaroni chama de comodismo crônico.”

“Ao se espalharem por todo o Judiciário, as teses do STF na Ação Penal 470 acabarão atingindo os cidadãos comuns”, adverte Casara. “São os ‘clientes’ preferenciais do nosso sistema penal que privilegia os que têm posses e condena os sem condição financeira.”

Rubens Casara é juiz da 43ª Vara Criminal do Rio de Janeiro e professor de Direito Penal da Faculdade de Direito Ibmec/RJ. Porém, nesta entrevista ao Viomundo, ele fala a partir de sua percepção como pesquisador do autoritarismo no sistema de justiça criminal.

Segue a íntegra da nossa entrevista:

Viomundo – Qual a sua percepção do julgamento da Ação Penal 470 até o momento?

Rubens Casara – Antes, um parêntese. O Estatuto da Magistratura, que é uma lei cunhada em período autoritário, impede que os juízes se manifestem sobre casos em julgamento. Portanto, falo em tese, em especial a partir do que tenho observado na mídia, em minhas pesquisas e como professor de Direito Processual Penal.

Sobre a sua pergunta, a minha percepção é de que a Ação Penal 470, que a grande mídia chama de “julgamento do mensalão”, ilustra bem a encruzilhada em que se encontra o Poder Judiciário.

De um lado, sua origem aristocrática; um poder conservador, distante do povo, comprometido com quem detém o poder e o capital, e que historicamente sempre foi utilizado para manutenção do status quo, ou seja, como obstáculo à transformação social. Não se pode esquecer que, para parcela considerável dos que sempre detiveram o poder econômico e político,  o chamado “caso do mensalão” passou a ser encarado como espécie de vingança pelas derrotas eleitorais impostas pelo Partido dos Trabalhadores.

De outro lado, uma tendência que tem sido chamada de “tentação populista”.  Ela se traduz em decisões que buscam agradar a opinião pública, que muitas vezes não passa da opinião publicada pelas grandes corporações que controlam os principais meios de comunicação de massa.

Agora, a tensão entre a origem aristocrática e essa tendência populista está presente em vários julgamentos e não só na Ação Penal nº 470. De igual sorte, existem no seio do Poder Judiciário muitos conflitos, que por vezes permanecem velados.

Enfim, a magistratura é plural, diversas ideologias se fazem presentes. Existem, por exemplo, magistrados que atuam a partir de uma epistemologia e de um instrumental autoritário e outros que adotam posturas e modelos adequados à democracia.

Viomundo — Qual o risco dessa tentação populista?

Rubens Casara – É que as decisões passem a ser produzidas ad hoc.

Viomundo – O que significa?

Rubens Casara – São decisões casuísticas, formuladas para atender às expectativas do que é vendido pelos meios de comunicação de massa como opinião pública. Quando isso acontece é grave, pois princípios e teorias que existem para assegurar o respeito aos direitos e garantias fundamentais, que são conquistas de todos, forjados durante a caminhada da Humanidade, acabam esquecidos ou afastados para a produção de decisões direcionadas a dar respostas simbólicas à sociedade.

Os direitos e garantias fundamentais sempre foram trunfos contra maiorias de ocasião, limites à opressão estatal, o que, em última análise, caracteriza o Estado Democrático de Direito. Só há democracia, em seu sentido substancial, se os direitos e garantias fundamentais são respeitados. Decisões judiciais que afastam, relativizam ou violam os direitos e garantias fundamentais corporificam, portanto, sérias ameaças ao Estado Democrático de Direito.

Viomundo — O que a Ação Penal 470 vai representar mais adiante?

Rubens Casara – Como toda decisão do Supremo Tribunal Federal, a tendência é de que as teses acolhidas durante esse julgamento passem a influenciar a jurisprudência de todos os órgãos do Poder Judiciário. Essa jurisprudência é o que será chamado de legado jurídico desse julgamento.

Se, como sustentam alguns, a Ação Penal nº 470 é um “julgamento de exceção”, uma decisão casuística produzida para agradar parcela da sociedade brasileira, em detrimento de direitos e garantias que normalmente seriam reconhecidos pelo Supremo Tribunal Federal, o risco à democracia é muito grande, uma vez que se está diante de um ato, de ampla repercussão, produzido pela maior Corte de Justiça do Brasil, o Supremo Tribunal Federal (STF).

Viomundo — Por quê?

Rubens Casara — Porque há uma tendência de reprodução, pelas instâncias inferiores, das decisões que são produzidas no Supremo Tribunal Federal. A esse fenômeno, típico da burocratização judicial, o professor e ministro da Corte Suprema da Argentina  Raúl Zaffaroni chama de “comodismo crônico”.

Explico: a melhor maneira de se fazer uma carreira rápida no Judiciário é não contrariar a opinião daqueles que têm o poder de anular ou reformar as suas decisões. Os juízes reproduzem as decisões dos seus tribunais e dos tribunais superiores para não terem dores de cabeça na carreira, serem aceitos na classe e conseguirem promoções.

Assim, se, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal adotar as teses da “inversão do ônus da prova em matéria penal” ou da “possibilidade de condenação a partir de presunções contrárias aos réus”, estaremos dando passos vigorosos em direção ao Estado Penal.

Por quê?  Porque essas teses estão em franca oposição ao princípio constitucional da presunção de inocência, e o Supremo deixará de atuar como garantidor dos direitos e garantias fundamentais.

Se, de fato, isso acontecer, essas teses vão ser reproduzidas e acolhidas em outros casos a serem julgados por diversos juízes e tribunas brasileiros. A porta para os decisionismos e as perversões inquisitoriais estará aberta.

Viomundo — Isso significa que as teses aceitas pelo STF na Ação Penal 470 acabarão atingindo os cidadãos comuns?

Rubens Casara — Com certeza. São os ‘clientes’ preferenciais do nosso sistema penal que privilegia os que têm posses e condena os sem condição financeira.

Viomundo – Em função do julgamento, juristas têm usado muito a expressão “atos de ofício”. O que significa exatamente?

Rubens Casara – Atos de ofício do juiz são os produzidos sem a provocação de qualquer das partes. Eles se originam da tradição inquisitorial. No sistema processual inquisitivo, o juiz acusava, produzia as provas e, depois, também julgava a pessoa a quem ele já tinha atribuído a prática de um delito.

E qual é o risco dessa atuação de ofício?  O fenômeno que o professor italiano Franco Cordero chama de “primado da hipótese sobre fato”.

O que é esse primado da hipótese sobre o fato? O juiz assume a hipótese da acusação como verdadeira e passa o processo tentando demonstrar que está correto. Essa atuação de ofício traduz uma antecipação de seu julgamento, consubstanciada na aceitação da hipótese a partir da qual orienta a sua busca.

O problema é que, ao partir de uma hipótese falsa, o julgador que adota essa postura inquisitorial, não raro, chega a uma conclusão falsa, mas que ele acredita ser verdadeira, mais precisamente, chega a uma “verdade” que ele construiu, a partir do senso comum ou de distorções, por vezes inconscientes, do próprio conjunto probatório.

Isso compromete a imparcialidade, ou seja, viola a equidistância que o julgador deve manter das versões postas pelas partes. Isso acaba por levar ao que Cordero chamou de “quadro mental paranoico”, já que o juiz decide antes, ao assumir como verdadeira a hipótese da acusação, e, depois, sai em busca de material probatório para “confirmar” essa sua versão.

Viomundo – É um risco da Ação Penal 470?

Rubens Casara – É um risco de todos os processos nos quais o juiz quer assumir o protagonismo probatório. Ele pratica atos de ofício na tentativa de demonstrar a veracidade da hipótese que aceitou como verdadeira. Não comprovar essa versão significa fracassar e ninguém gosta de fracassar.

Há uma discussão muito grande sobre essa questão na doutrina brasileira. Há quem defenda a possibilidade do juiz produzir provas de ofício, mas há excelentes autores que dizem que não, que a gestão da prova deve permanecer com as partes.

A inércia do juiz seria, então, uma garantia de sua imparcialidade.

Eu prefiro essa segunda corrente que defende que o juiz, na medida do possível, deve ficar equidistante das versões das partes. Ele deve receber as provas da acusação e da defesa, para, no final, julgar a partir do conjunto probatório produzido dialeticamente pelas partes.

Viomundo – O ministro Joaquim Barbosa estaria assumindo o protagonismo probatório?

Rubens Casara – Na atuação do ministro Joaquim Barbosa, que vem dos quadros do Ministério Público, órgão constitucionalmente encarregado de formular hipóteses e produzir provas que a confirmem, muitos enxergam essa tendência inquisitorial.

Confesso que não estudei a fundo as decisões desse ministro, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, que será o futuro presidente do Supremo Tribunal Federal.

Para além do que a mídia noticia, não conheço a atuação do Ministro Joaquim Barbosa.

Veja bem. Existem leis infraconstitucionais que autorizam a produção probatória pelo juiz. A questão é saber se essas leis são adequadas ou não à Constituição da República. Uma lei infraconstitucional contrária à Constituição é imprestável e não deve ser aplicada.

O ideal, portanto, é o modelo em que cabe ao juiz julgar, ao acusador formular e provar a acusação e ao defensor a missão de defender o acusado. O ideal é que o juiz não participe da produção probatória. O ato de produzir provas é inerente à atividade de acusar e de defender.  Na verdade, um ônus de quem formula a acusação, porque no processo penal brasileiro a carga probatória é toda do acusador. A defesa não precisa provar nada, desde que a acusação fracasse na sua missão de comprovar os fatos que constituem a acusação.

No modelo brasileiro, o ônus da prova – aquele que tem o dever de fazer prova e vai arcar com as conseqüências de não provar – é da acusação. Se o acusador não consegue provar sua hipótese, o réu tem de ser absolvido. É a dimensão probatória do princípio da presunção de inocência, o que se expressa na máxima in dubio pro reo.

Então, o juiz que assume o protagonismo probatório, o juiz-inquisidor, é uma figura historicamente vinculada ao modelo inquisitivo, que não é a opção constitucional feita em 1988 nem a da maioria dos Estados democráticos.

Viomundo – O modelo inquisitorial surgiu quando?

Rubens Casara – Do ponto de vista histórico, ele é posterior ao modelo acusatório que já existia no regime ateniense. O sistema inquisitivo surge no século XIII e se torna hegemônico na Europa continental até o século XVIII, momento em que tem início a sua decadência. Curioso notar que o sistema inquisitivo nasce em uma quadra histórica na qual se busca o fortalecimento do Estado, mas ainda hoje é possível perceber sintomas desse sistema nas mais diversas legislações.

Viomundo – No julgamento do AP 470, tem se falado em inversão do ônus da prova, flexibilização de conceitos jurídicos, condenação a partir de presunções, indícios…  Como é que fica a situação, professor?

Rubens Casara — Indício é uma prova indireta. Indícios são fatos efetivamente provados que permitem, por dedução, a certeza acerca de outro fato que se quer provar.  No nosso modelo processual, é possível uma condenação com base em indícios, desde que eles sejam capazes de demonstrar cabalmente a ocorrência dos fatos descritos na denúncia. Esse não é o problema.

Por outro lado, os demais fenômenos que você menciona representam sérios riscos a uma concepção minimamente democrática de justiça penal, conforme já mencionei. Da mesma maneira, a possibilidade de uma decisão ad hoc, voltada à satisfação dos meios de comunicação de massa e de maiorias de ocasião forjadas na desinformação, representa um risco ao Estado de Direito. 

Por quê? Porque o Poder Judiciário tem como sua principal característica o fato de ser contramajoritário. Ou seja, ao contrário do Legislativo e do Executivo, que dependem da votação popular, o Judiciário tem o dever de julgar contra as maiorias, desde que isso seja necessário para preservar os direitos fundamentais das minorias ou de um único cidadão. Existem limites ao exercício do poder que, mesmo impopulares, devem ser respeitados.

Isso significa que se, para respeitar os direitos fundamentais do Fernandinho Beira-Mar ou do José Dirceu, o magistrado tiver que desagradar toda a opinião pública, ele tem que fazer isso. O Judiciário é, ou deveria ser o garantidor dos direitos fundamentais, dos direitos inerentes à condição humana.

Sempre que o Judiciário cede àquilo que, no início, chamei de “tentação populista”, ele se aproxima da atuação do Executivo e do Legislativo e, portanto, torna-se desnecessário. O Judiciário só se justifica para assegurar a concretização do projeto constitucional e, para tanto, deve, ou deveria, atuar como garantia dos direitos fundamentais de cada indivíduo, criminosos ou não, inclusive aqueles selecionados pela grande mídia para figurar como inimigos públicos da sociedade.

Viomundo – Por exemplo…

Rubens Casara — Vamos imaginar uma sociedade racista. Se o Poder Judiciário não for contramajoritário, as decisões vão ser racistas.

Numa sociedade sexista, se o Poder Judiciário não for contramajoritário, as decisões vão ser sexistas. Numa sociedade  homofóbica, as decisões vão ser homofóbicas…

Cabe ao Judiciário impor limites aos desejos e perversões das maiorias.

Acho importante também frisar que os juízes, como todo mundo, estão inseridos em uma tradição que acaba por condicionar suas decisões. O problema no Brasil é que essa tradição é extremamente autoritária. As pessoas recorrem ao sistema de justiça criminal para resolver os mais diversos problemas. Acreditam no uso da força para solucioná-los. Problemas sociais ou políticos, por exemplo, são desqualificados, descontextualizados e redefinidos como se fossem meros casos de polícia a serem resolvidos no sistema de justiça criminal.

A sociedade brasileira é autoritária. A ausência de rupturas históricas talvez explique porque ainda hoje práticas típicas da ditadura, como a relativização de direitos fundamentais, são naturalizadas. E essa natureza autoritária acaba repercutindo em todas as decisões judiciais — da primeira instância à Suprema Corte.

Viomundo – O ônus da prova cabe à acusação…

Rubens Casara – Nos modelos democráticos!!!

Viomundo – A partir do momento em que o Judiciário inverte esse papel, qual o risco para a sociedade?

Rubens Casara — A inversão do ônus da prova em matéria penal é um sintoma nítido da ausência de uma cultura democrática na sociedade brasileira. Em nome de uma maior eficiência dos órgãos encarregados da repressão penal, da busca por um maior número de condenações, direitos e garantias previstas na Constituição da República são negados, e a sociedade brasileira assiste a tudo isso calada  porque se acostumou com o autoritarismo.

A naturalização de posturas autoritárias impede a criação de uma cultura verdadeiramente democrática, de respeito aos diretos fundamentais.

Nós, por vezes, aplaudimos atos de autoritarismo. Há quem bata palmas para condenações desassociadas de um suporte probatório robusto e confiável, conforme os meios de comunicação de massa têm noticiado. Há também quem concorde com a inversão do ônus da prova em matéria penal, sem perceber que isso representa um risco à própria ideia de democracia processual.

Viomundo — Por quê?

Rubens Casara — Por que o ônus da prova cabe ao Ministério Público? Porque o Ministério Público é o Estado-Administração, a parte que tem as melhores condições de provar as hipóteses que formula. O acusado é, nessa relação, a parte mais fraca. Por mais poderoso que o acusado seja, do outro lado está o Estado, o Leviatã, com sua estrutura e recursos.

Essa é a dimensão probatória do princípio da presunção da inocência. Se o indivíduo deve ser tratado como se inocente fosse, cabe ao Estado afastar essa presunção, a única admitida, no Estado de Direito, em matéria penal.

O sistema processual penal, como instrumento de tutela da liberdade, permite constatar que ao Estado também não interessa, e não deveria interessar aos seus agentes, a condenação de um possível inocente, mesmo diante do risco da absolvição de um culpado. Ao réu, basta a dúvida, que impõe, por força da Constituição, a absolvição.

Ao adotar o princípio da presunção de inocência e atribuir ao acusador o ônus de provar a materialidade e a autoria dos delitos que o Estado pretende punir, o legislador constituinte faz uma opção política que implica no reconhecimento de que alguns culpados vão acabar absolvidos, mas que isso é melhor do que condenar pessoas que podem ser inocentes.

Diante desse quadro, o processo penal funciona e só se legitima como garantia contra a opressão estatal.

Assim, se o Estado quer punir quem pratica uma ilegalidade, ele tem de demonstrar, de forma cabal, respeitados o devido processo legal e os demais limites éticos e legais, que o acusado praticou um delito.

Não se pode presumir que alguém é culpado, por exemplo, que determinada pessoa é “o chefe da quadrilha”, a não ser que exista prova concreta, segura e suficiente da existência e da autoria do crime narrado na denúncia pelo acusador.

Para alguém ser condenado, o Estado tem de afastar qualquer dúvida razoável.  Do contrário, fica-se muito próximo do existia no modelo fascista italiano, no nazista alemão e no da extinta União Soviética. Ninguém pode ser punido pelo que é, por ser antipático ou desagradar aos detentores do poder, mas somente por aquilo que se demonstra que ele fez.

Viomundo – Por que a ideia de atribuir o ônus da prova ao Ministério Público, portanto ao Estado?

Rubens Casara — Para preservar o indivíduo da fúria persecutória do Estado, respeitando-o como sujeito de direitos. Busca-se também evitar que se onere em demasia a parte mais fraca da relação processual.

Sob o prisma processual, somente a acusação é que alega a ocorrência de um delito, atribuindo-o  ao réu. A opção do nosso sistema é de que ao réu sempre se atribuirá o benefício da dúvida, devendo a outra parte, o Ministério Público, diante das prerrogativas e poderes que têm, comprovar o que alegou na denúncia.

No Brasil, nós temos uma visão simplista de achar que só quem responde a processo criminal é bandido e que “bandido bom é bandido sem direitos”.

Isso é falso. Tem pessoas com a ficha limpíssima que praticaram uma enorme quantidade de crimes, enquanto outras, que respondem a vários processos, são inocentes e podem acabar condenadas. O sistema penal é seletivo, de todos aqueles que praticam crimes, poucos acabam julgados; e nem todos que são julgados praticaram crimes.

O desafio é garantir os direitos fundamentais a todos que respondam a processos criminais, sejam eles inocentes ou culpados. Isso é que nos faz humanos e qualifica o processo penal como um instrumento racional de garantia dos direitos. O Estado, durante o processo criminal, não pode violar direitos ou garantias do acusado, sob pena de perder a superioridade ética que o distingue dos criminosos.

E se é para desrespeitar os direitos fundamentais, não precisaríamos do processo penal, nem do Judiciário. Bastava prender a pessoa, colocá-la na cadeia, tirando-a do convívio social, sem maiores justificativas. Insisto: o Judiciário existe para garantir os direitos fundamentais de todos.

Viomundo – Diz-se que o Supremo está sendo pressionado até pela mídia no julgamento do mensalão. O que acha?

Rubens Casara – A influência midiática está intimamente ligada ao que chamei, para utilizar um termo cunhado por Garapon, de “tentação populista”.  O populismo penal, aliás, toda forma de populismo, incorporado pelos tribunais — eu não estou falando especificamente da Ação Penal 470 — é um risco para a sociedade.

Agora, é um risco esperado. Numa sociedade do espetáculo não é estranho que o Judiciário queira chamar atenção para si e reproduzir o que já acontece em outras esferas, transformando-se num judiciário espetacular. Cada juiz também quer aparecer bem no espetáculo.

Não causa surpresa, portanto, que o Poder Judiciário, do primeiro grau até os tribunais superiores, procure agradar aos meios de comunicação de massa através de decisões, ainda que contrárias à Constituição da República.

Percebe-se que a esquerda tem uma culpa tremenda no atual quadro, porque nunca deu importância ao Judiciário, sempre o considerou como um mero instrumento de opressão e de manutenção das estruturas sociais.

Acontece que no Estado Democrático de Direito o Judiciário é fundamental à garantia dos direitos e à concretização do projeto constitucional.

E o que fez o Partido dos Trabalhadores em relação ao Poder Judiciário? Contribuiu para uma composição conservadora do órgão de cúpula do Poder Judiciário brasileiro.

O exemplo do Supremo Tribunal Federal é emblemático: foram indicados para ministros, salvo raras exceções, pessoas conservadoras, sem compromissos com uma visão progressista de Estado, alguns ligados a setores conservadores da Igreja Católica ou a políticos historicamente contrários às lutas do próprio Partido dos Trabalhadores.

Em suma, perdeu a rara oportunidade de promover uma verdadeira revolução democrática no Poder Judiciário brasileiro. Vale registrar, por oportuno, que os movimentos sociais e os setores mais progressistas da sociedade civil sequer foram ouvidos por ocasião das escolhas.

Há um mito de que os juízes devem ser neutros. Isso não existe. Sob o discurso da neutralidade e da técnica, juízes praticam, e sempre praticaram, atos políticos a partir de suas visões de mundo. A extradição de Olga Benário, grávida de Anita Prestes, para os nazistas que a mataram, por exemplo, foi promovida a partir de uma decisão política travestida da melhor técnica processual no Supremo Tribunal Federal. Aliás, há um pouco de Eichmann em todos esses magistrados que se afirmam neutros e meramente técnicos.

Acho que, diante dos últimos acontecimentos, a própria esquerda que está no governo federal acabará se conscientizando da necessidade de se pensar o Poder Judiciário, de se criarem mecanismos de efetivo controle popular e de se promoverem indicações para os tribunais superiores de pessoas comprometidas com o projeto constitucional de vida digna para todos, para além dos projetos pessoais de poder.

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Rubens Casara: “Risco da tentação populista é produzir decisões casuísticas”

Filed under: Ação 470,Grupos Mafiomidiáticos,Poder Judiciário,Populismo,STF — Gilmar Crestani @ 8:17 am

publicado em 25 de setembro de 2012 às 17:20

por Conceição Lemes

Nesta segunda-feira 23, o julgamento da Ação Penal 470, o chamado mensalão entrou na nona semana. Muitos juristas o acompanham com preocupação. Alegam que princípios de respeito às garantias fundamentais, como “o ônus da prova cabe à acusação” e “não se pode condenar alguém com base em presunções”, estariam sendo deixados de lado.

“A Ação Penal 470 ilustra bem a encruzilhada em que se encontra o Poder Judiciário. O risco da tentação populista é que passe a produzir decisões casuísticas, para atender às expectativas do que é vendido pelos meios de comunicação como opinião pública”, observa Rubens Casara. “Isso é grave, pois princípios e teorias forjados durante a caminhada da Humanidade acabam esquecidos ou afastados para a produção de decisões direcionadas a dar essa resposta simbólica à sociedade.”

Esse risco aumenta quando as decisões casuísticas são produzidas pela maior Corte de Justiça do Brasil, como na Ação Penal 470, embora não sejam exclusividade dela.

“Acaba virando jurisprudência, pois as cortes inferiores tendem a reproduzí-las”, prossegue Casara. “Esse fenômeno o professor e ministro da Corte Suprema da Argentina Raul Zafaroni chama de comodismo crônico.”

“Ao se espalharem por todo o Judiciário, as teses do STF na Ação Penal 470 acabarão atingindo os cidadãos comuns”, adverte Casara. “São os ‘clientes’ preferenciais do nosso sistema penal que privilegia os que têm posses e condena os sem condição financeira.”

Rubens Casara é juiz da 43ª Vara Criminal do Rio de Janeiro e professor de Direito Penal da Faculdade de Direito Ibmec/RJ. Porém, nesta entrevista ao Viomundo, ele fala a partir de sua percepção como pesquisador do autoritarismo no sistema de justiça criminal.

Segue a íntegra da nossa entrevista:

Viomundo – Qual a sua percepção do julgamento da Ação Penal 470 até o momento?

Rubens Casara – Antes, um parêntese. O Estatuto da Magistratura, que é uma lei cunhada em período autoritário, impede que os juízes se manifestem sobre casos em julgamento. Portanto, falo em tese, em especial a partir do que tenho observado na mídia, em minhas pesquisas e como professor de Direito Processual Penal.

Sobre a sua pergunta, a minha percepção é de que a Ação Penal 470, que a grande mídia chama de “julgamento do mensalão”, ilustra bem a encruzilhada em que se encontra o Poder Judiciário.

De um lado, sua origem aristocrática; um poder conservador, distante do povo, comprometido com quem detém o poder e o capital, e que historicamente sempre foi utilizado para manutenção do status quo, ou seja, como obstáculo à transformação social. Não se pode esquecer que, para parcela considerável dos que sempre detiveram o poder econômico e político,  o chamado “caso do mensalão” passou a ser encarado como espécie de vingança pelas derrotas eleitorais impostas pelo Partido dos Trabalhadores.

De outro lado, uma tendência que tem sido chamada de “tentação populista”.  Ela se traduz em decisões que buscam agradar a opinião pública, que muitas vezes não passa da opinião publicada pelas grandes corporações que controlam os principais meios de comunicação de massa.

Agora, a tensão entre a origem aristocrática e essa tendência populista está presente em vários julgamentos e não só na Ação Penal nº 470. De igual sorte, existem no seio do Poder Judiciário muitos conflitos, que por vezes permanecem velados.

Enfim, a magistratura é plural, diversas ideologias se fazem presentes. Existem, por exemplo, magistrados que atuam a partir de uma epistemologia e de um instrumental autoritário e outros que adotam posturas e modelos adequados à democracia.

Viomundo — Qual o risco dessa tentação populista?

Rubens Casara – É que as decisões passem a ser produzidas ad hoc.

Viomundo – O que significa?

Rubens Casara – São decisões casuísticas, formuladas para atender às expectativas do que é vendido pelos meios de comunicação de massa como opinião pública. Quando isso acontece é grave, pois princípios e teorias que existem para assegurar o respeito aos direitos e garantias fundamentais, que são conquistas de todos, forjados durante a caminhada da Humanidade, acabam esquecidos ou afastados para a produção de decisões direcionadas a dar respostas simbólicas à sociedade.

Os direitos e garantias fundamentais sempre foram trunfos contra maiorias de ocasião, limites à opressão estatal, o que, em última análise, caracteriza o Estado Democrático de Direito. Só há democracia, em seu sentido substancial, se os direitos e garantias fundamentais são respeitados. Decisões judiciais que afastam, relativizam ou violam os direitos e garantias fundamentais corporificam, portanto, sérias ameaças ao Estado Democrático de Direito.

Viomundo — O que a Ação Penal 470 vai representar mais adiante?

Rubens Casara – Como toda decisão do Supremo Tribunal Federal, a tendência é de que as teses acolhidas durante esse julgamento passem a influenciar a jurisprudência de todos os órgãos do Poder Judiciário. Essa jurisprudência é o que será chamado de legado jurídico desse julgamento.

Se, como sustentam alguns, a Ação Penal nº 470 é um “julgamento de exceção”, uma decisão casuística produzida para agradar parcela da sociedade brasileira, em detrimento de direitos e garantias que normalmente seriam reconhecidos pelo Supremo Tribunal Federal, o risco à democracia é muito grande, uma vez que se está diante de um ato, de ampla repercussão, produzido pela maior Corte de Justiça do Brasil, o Supremo Tribunal Federal (STF).

Viomundo — Por quê?

Rubens Casara — Porque há uma tendência de reprodução, pelas instâncias inferiores, das decisões que são produzidas no Supremo Tribunal Federal. A esse fenômeno, típico da burocratização judicial, o professor e ministro da Corte Suprema da Argentina  Raúl Zaffaroni chama de “comodismo crônico”.

Explico: a melhor maneira de se fazer uma carreira rápida no Judiciário é não contrariar a opinião daqueles que têm o poder de anular ou reformar as suas decisões. Os juízes reproduzem as decisões dos seus tribunais e dos tribunais superiores para não terem dores de cabeça na carreira, serem aceitos na classe e conseguirem promoções.

Assim, se, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal adotar as teses da “inversão do ônus da prova em matéria penal” ou da “possibilidade de condenação a partir de presunções contrárias aos réus”, estaremos dando passos vigorosos em direção ao Estado Penal.

Por quê?  Porque essas teses estão em franca oposição ao princípio constitucional da presunção de inocência, e o Supremo deixará de atuar como garantidor dos direitos e garantias fundamentais.

Se, de fato, isso acontecer, essas teses vão ser reproduzidas e acolhidas em outros casos a serem julgados por diversos juízes e tribunas brasileiros. A porta para os decisionismos e as perversões inquisitoriais estará aberta.

Viomundo — Isso significa que as teses aceitas pelo STF na Ação Penal 470 acabarão atingindo os cidadãos comuns?

Rubens Casara — Com certeza. São os ‘clientes’ preferenciais do nosso sistema penal que privilegia os que têm posses e condena os sem condição financeira.

Viomundo – Em função do julgamento, juristas têm usado muito a expressão “atos de ofício”. O que significa exatamente?

Rubens Casara – Atos de ofício do juiz são os produzidos sem a provocação de qualquer das partes. Eles se originam da tradição inquisitorial. No sistema processual inquisitivo, o juiz acusava, produzia as provas e, depois, também julgava a pessoa a quem ele já tinha atribuído a prática de um delito.

E qual é o risco dessa atuação de ofício?  O fenômeno que o professor italiano Franco Cordero chama de “primado da hipótese sobre fato”.

O que é esse primado da hipótese sobre o fato? O juiz assume a hipótese da acusação como verdadeira e passa o processo tentando demonstrar que está correto. Essa atuação de ofício traduz uma antecipação de seu julgamento, consubstanciada na aceitação da hipótese a partir da qual orienta a sua busca.

O problema é que, ao partir de uma hipótese falsa, o julgador que adota essa postura inquisitorial, não raro, chega a uma conclusão falsa, mas que ele acredita ser verdadeira, mais precisamente, chega a uma “verdade” que ele construiu, a partir do senso comum ou de distorções, por vezes inconscientes, do próprio conjunto probatório.

Isso compromete a imparcialidade, ou seja, viola a equidistância que o julgador deve manter das versões postas pelas partes. Isso acaba por levar ao que Cordero chamou de “quadro mental paranoico”, já que o juiz decide antes, ao assumir como verdadeira a hipótese da acusação, e, depois, sai em busca de material probatório para “confirmar” essa sua versão.

Viomundo – É um risco da Ação Penal 470?

Rubens Casara – É um risco de todos os processos nos quais o juiz quer assumir o protagonismo probatório. Ele pratica atos de ofício na tentativa de demonstrar a veracidade da hipótese que aceitou como verdadeira. Não comprovar essa versão significa fracassar e ninguém gosta de fracassar.

Há uma discussão muito grande sobre essa questão na doutrina brasileira. Há quem defenda a possibilidade do juiz produzir provas de ofício, mas há excelentes autores que dizem que não, que a gestão da prova deve permanecer com as partes.

A inércia do juiz seria, então, uma garantia de sua imparcialidade.

Eu prefiro essa segunda corrente que defende que o juiz, na medida do possível, deve ficar equidistante das versões das partes. Ele deve receber as provas da acusação e da defesa, para, no final, julgar a partir do conjunto probatório produzido dialeticamente pelas partes.

Viomundo – O ministro Joaquim Barbosa estaria assumindo o protagonismo probatório?

Rubens Casara – Na atuação do ministro Joaquim Barbosa, que vem dos quadros do Ministério Público, órgão constitucionalmente encarregado de formular hipóteses e produzir provas que a confirmem, muitos enxergam essa tendência inquisitorial.

Confesso que não estudei a fundo as decisões desse ministro, professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, que será o futuro presidente do Supremo Tribunal Federal.

Para além do que a mídia noticia, não conheço a atuação do Ministro Joaquim Barbosa.

Veja bem. Existem leis infraconstitucionais que autorizam a produção probatória pelo juiz. A questão é saber se essas leis são adequadas ou não à Constituição da República. Uma lei infraconstitucional contrária à Constituição é imprestável e não deve ser aplicada.

O ideal, portanto, é o modelo em que cabe ao juiz julgar, ao acusador formular e provar a acusação e ao defensor a missão de defender o acusado. O ideal é que o juiz não participe da produção probatória. O ato de produzir provas é inerente à atividade de acusar e de defender.  Na verdade, um ônus de quem formula a acusação, porque no processo penal brasileiro a carga probatória é toda do acusador. A defesa não precisa provar nada, desde que a acusação fracasse na sua missão de comprovar os fatos que constituem a acusação.

No modelo brasileiro, o ônus da prova – aquele que tem o dever de fazer prova e vai arcar com as conseqüências de não provar – é da acusação. Se o acusador não consegue provar sua hipótese, o réu tem de ser absolvido. É a dimensão probatória do princípio da presunção de inocência, o que se expressa na máxima in dubio pro reo.

Então, o juiz que assume o protagonismo probatório, o juiz-inquisidor, é uma figura historicamente vinculada ao modelo inquisitivo, que não é a opção constitucional feita em 1988 nem a da maioria dos Estados democráticos.

Viomundo – O modelo inquisitorial surgiu quando?

Rubens Casara – Do ponto de vista histórico, ele é posterior ao modelo acusatório que já existia no regime ateniense. O sistema inquisitivo surge no século XIII e se torna hegemônico na Europa continental até o século XVIII, momento em que tem início a sua decadência. Curioso notar que o sistema inquisitivo nasce em uma quadra histórica na qual se busca o fortalecimento do Estado, mas ainda hoje é possível perceber sintomas desse sistema nas mais diversas legislações.

Viomundo – No julgamento do AP 470, tem se falado em inversão do ônus da prova, flexibilização de conceitos jurídicos, condenação a partir de presunções, indícios…  Como é que fica a situação, professor?

Rubens Casara — Indício é uma prova indireta. Indícios são fatos efetivamente provados que permitem, por dedução, a certeza acerca de outro fato que se quer provar.  No nosso modelo processual, é possível uma condenação com base em indícios, desde que eles sejam capazes de demonstrar cabalmente a ocorrência dos fatos descritos na denúncia. Esse não é o problema.

Por outro lado, os demais fenômenos que você menciona representam sérios riscos a uma concepção minimamente democrática de justiça penal, conforme já mencionei. Da mesma maneira, a possibilidade de uma decisão ad hoc, voltada à satisfação dos meios de comunicação de massa e de maiorias de ocasião forjadas na desinformação, representa um risco ao Estado de Direito. 

Por quê? Porque o Poder Judiciário tem como sua principal característica o fato de ser contramajoritário. Ou seja, ao contrário do Legislativo e do Executivo, que dependem da votação popular, o Judiciário tem o dever de julgar contra as maiorias, desde que isso seja necessário para preservar os direitos fundamentais das minorias ou de um único cidadão. Existem limites ao exercício do poder que, mesmo impopulares, devem ser respeitados.

Isso significa que se, para respeitar os direitos fundamentais do Fernandinho Beira-Mar ou do José Dirceu, o magistrado tiver que desagradar toda a opinião pública, ele tem que fazer isso. O Judiciário é, ou deveria ser o garantidor dos direitos fundamentais, dos direitos inerentes à condição humana.

Sempre que o Judiciário cede àquilo que, no início, chamei de “tentação populista”, ele se aproxima da atuação do Executivo e do Legislativo e, portanto, torna-se desnecessário. O Judiciário só se justifica para assegurar a concretização do projeto constitucional e, para tanto, deve, ou deveria, atuar como garantia dos direitos fundamentais de cada indivíduo, criminosos ou não, inclusive aqueles selecionados pela grande mídia para figurar como inimigos públicos da sociedade.

Viomundo – Por exemplo…

Rubens Casara — Vamos imaginar uma sociedade racista. Se o Poder Judiciário não for contramajoritário, as decisões vão ser racistas.

Numa sociedade sexista, se o Poder Judiciário não for contramajoritário, as decisões vão ser sexistas. Numa sociedade  homofóbica, as decisões vão ser homofóbicas…

Cabe ao Judiciário impor limites aos desejos e perversões das maiorias.

Acho importante também frisar que os juízes, como todo mundo, estão inseridos em uma tradição que acaba por condicionar suas decisões. O problema no Brasil é que essa tradição é extremamente autoritária. As pessoas recorrem ao sistema de justiça criminal para resolver os mais diversos problemas. Acreditam no uso da força para solucioná-los. Problemas sociais ou políticos, por exemplo, são desqualificados, descontextualizados e redefinidos como se fossem meros casos de polícia a serem resolvidos no sistema de justiça criminal.

A sociedade brasileira é autoritária. A ausência de rupturas históricas talvez explique porque ainda hoje práticas típicas da ditadura, como a relativização de direitos fundamentais, são naturalizadas. E essa natureza autoritária acaba repercutindo em todas as decisões judiciais — da primeira instância à Suprema Corte.

Viomundo – O ônus da prova cabe à acusação…

Rubens Casara – Nos modelos democráticos!!!

Viomundo – A partir do momento em que o Judiciário inverte esse papel, qual o risco para a sociedade?

Rubens Casara — A inversão do ônus da prova em matéria penal é um sintoma nítido da ausência de uma cultura democrática na sociedade brasileira. Em nome de uma maior eficiência dos órgãos encarregados da repressão penal, da busca por um maior número de condenações, direitos e garantias previstas na Constituição da República são negados, e a sociedade brasileira assiste a tudo isso calada  porque se acostumou com o autoritarismo.

A naturalização de posturas autoritárias impede a criação de uma cultura verdadeiramente democrática, de respeito aos diretos fundamentais.

Nós, por vezes, aplaudimos atos de autoritarismo. Há quem bata palmas para condenações desassociadas de um suporte probatório robusto e confiável, conforme os meios de comunicação de massa têm noticiado. Há também quem concorde com a inversão do ônus da prova em matéria penal, sem perceber que isso representa um risco à própria ideia de democracia processual.

Viomundo — Por quê?

Rubens Casara — Por que o ônus da prova cabe ao Ministério Público? Porque o Ministério Público é o Estado-Administração, a parte que tem as melhores condições de provar as hipóteses que formula. O acusado é, nessa relação, a parte mais fraca. Por mais poderoso que o acusado seja, do outro lado está o Estado, o Leviatã, com sua estrutura e recursos.

Essa é a dimensão probatória do princípio da presunção da inocência. Se o indivíduo deve ser tratado como se inocente fosse, cabe ao Estado afastar essa presunção, a única admitida, no Estado de Direito, em matéria penal.

O sistema processual penal, como instrumento de tutela da liberdade, permite constatar que ao Estado também não interessa, e não deveria interessar aos seus agentes, a condenação de um possível inocente, mesmo diante do risco da absolvição de um culpado. Ao réu, basta a dúvida, que impõe, por força da Constituição, a absolvição.

Ao adotar o princípio da presunção de inocência e atribuir ao acusador o ônus de provar a materialidade e a autoria dos delitos que o Estado pretende punir, o legislador constituinte faz uma opção política que implica no reconhecimento de que alguns culpados vão acabar absolvidos, mas que isso é melhor do que condenar pessoas que podem ser inocentes.

Diante desse quadro, o processo penal funciona e só se legitima como garantia contra a opressão estatal.

Assim, se o Estado quer punir quem pratica uma ilegalidade, ele tem de demonstrar, de forma cabal, respeitados o devido processo legal e os demais limites éticos e legais, que o acusado praticou um delito.

Não se pode presumir que alguém é culpado, por exemplo, que determinada pessoa é “o chefe da quadrilha”, a não ser que exista prova concreta, segura e suficiente da existência e da autoria do crime narrado na denúncia pelo acusador.

Para alguém ser condenado, o Estado tem de afastar qualquer dúvida razoável.  Do contrário, fica-se muito próximo do existia no modelo fascista italiano, no nazista alemão e no da extinta União Soviética. Ninguém pode ser punido pelo que é, por ser antipático ou desagradar aos detentores do poder, mas somente por aquilo que se demonstra que ele fez.

Viomundo – Por que a ideia de atribuir o ônus da prova ao Ministério Público, portanto ao Estado?

Rubens Casara — Para preservar o indivíduo da fúria persecutória do Estado, respeitando-o como sujeito de direitos. Busca-se também evitar que se onere em demasia a parte mais fraca da relação processual.

Sob o prisma processual, somente a acusação é que alega a ocorrência de um delito, atribuindo-o  ao réu. A opção do nosso sistema é de que ao réu sempre se atribuirá o benefício da dúvida, devendo a outra parte, o Ministério Público, diante das prerrogativas e poderes que têm, comprovar o que alegou na denúncia.

No Brasil, nós temos uma visão simplista de achar que só quem responde a processo criminal é bandido e que “bandido bom é bandido sem direitos”.

Isso é falso. Tem pessoas com a ficha limpíssima que praticaram uma enorme quantidade de crimes, enquanto outras, que respondem a vários processos, são inocentes e podem acabar condenadas. O sistema penal é seletivo, de todos aqueles que praticam crimes, poucos acabam julgados; e nem todos que são julgados praticaram crimes.

O desafio é garantir os direitos fundamentais a todos que respondam a processos criminais, sejam eles inocentes ou culpados. Isso é que nos faz humanos e qualifica o processo penal como um instrumento racional de garantia dos direitos. O Estado, durante o processo criminal, não pode violar direitos ou garantias do acusado, sob pena de perder a superioridade ética que o distingue dos criminosos.

E se é para desrespeitar os direitos fundamentais, não precisaríamos do processo penal, nem do Judiciário. Bastava prender a pessoa, colocá-la na cadeia, tirando-a do convívio social, sem maiores justificativas. Insisto: o Judiciário existe para garantir os direitos fundamentais de todos.

Viomundo – Diz-se que o Supremo está sendo pressionado até pela mídia no julgamento do mensalão. O que acha?

Rubens Casara – A influência midiática está intimamente ligada ao que chamei, para utilizar um termo cunhado por Garapon, de “tentação populista”.  O populismo penal, aliás, toda forma de populismo, incorporado pelos tribunais — eu não estou falando especificamente da Ação Penal 470 — é um risco para a sociedade.

Agora, é um risco esperado. Numa sociedade do espetáculo não é estranho que o Judiciário queira chamar atenção para si e reproduzir o que já acontece em outras esferas, transformando-se num judiciário espetacular. Cada juiz também quer aparecer bem no espetáculo.

Não causa surpresa, portanto, que o Poder Judiciário, do primeiro grau até os tribunais superiores, procure agradar aos meios de comunicação de massa através de decisões, ainda que contrárias à Constituição da República.

Percebe-se que a esquerda tem uma culpa tremenda no atual quadro, porque nunca deu importância ao Judiciário, sempre o considerou como um mero instrumento de opressão e de manutenção das estruturas sociais.

Acontece que no Estado Democrático de Direito o Judiciário é fundamental à garantia dos direitos e à concretização do projeto constitucional.

E o que fez o Partido dos Trabalhadores em relação ao Poder Judiciário? Contribuiu para uma composição conservadora do órgão de cúpula do Poder Judiciário brasileiro.

O exemplo do Supremo Tribunal Federal é emblemático: foram indicados para ministros, salvo raras exceções, pessoas conservadoras, sem compromissos com uma visão progressista de Estado, alguns ligados a setores conservadores da Igreja Católica ou a políticos historicamente contrários às lutas do próprio Partido dos Trabalhadores.

Em suma, perdeu a rara oportunidade de promover uma verdadeira revolução democrática no Poder Judiciário brasileiro. Vale registrar, por oportuno, que os movimentos sociais e os setores mais progressistas da sociedade civil sequer foram ouvidos por ocasião das escolhas.

Há um mito de que os juízes devem ser neutros. Isso não existe. Sob o discurso da neutralidade e da técnica, juízes praticam, e sempre praticaram, atos políticos a partir de suas visões de mundo. A extradição de Olga Benário, grávida de Anita Prestes, para os nazistas que a mataram, por exemplo, foi promovida a partir de uma decisão política travestida da melhor técnica processual no Supremo Tribunal Federal. Aliás, há um pouco de Eichmann em todos esses magistrados que se afirmam neutros e meramente técnicos.

Acho que, diante dos últimos acontecimentos, a própria esquerda que está no governo federal acabará se conscientizando da necessidade de se pensar o Poder Judiciário, de se criarem mecanismos de efetivo controle popular e de se promoverem indicações para os tribunais superiores de pessoas comprometidas com o projeto constitucional de vida digna para todos, para além dos projetos pessoais de poder.

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18/10/2011

Populismo argentino

Filed under: Argentina,Populismo,Rodríguez Saá,Wi-Fi — Gilmar Crestani @ 6:46 am
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Quando é para derrotar a esquerda, o populismo vira opção da direita. Mesmo que o candidato seja um sedizente de esquerda. O que importa são os fins, como diria a Veja…

El peronista Rodríguez Saá predica un populismo de promesas milagrosas

El candidato ‘federal’ y anti-Kirchner ofrece Wi-Fi gratis en toda Argentina

Soledad Gallego-Díaz Buenos Aires 17 OCT 2011 – 19:58 CET4

El candidato peronista Alberto Rodríguez Saá durante su campaña electoral en Buenos Aires. / MARTIN ACOSTA (REUTERS)

Muchos de los anuncios de campaña del candidato presidencial Alberto Rodríguez Saá le presentan con un cierto aire de predicador, en tonos muy claros y con ofertas casi milagrosas: “Pintemos juntos un futuro lleno de luz”, “Mi compromiso: Wi-Fi gratis para toda la Argentina”. En persona, el gobernador de la provincia de San Luis es un político bastante más terrenal, que sabe muy bien a lo que juega: conservar una cuota de poder dentro del peronismo no kirchnerista que le permita tener algunas cartas con las que negociar después de las elecciones del próximo domingo.

Las encuestas le conceden entre un 10% y un 8% de los votos, pero su gran objetivo es quedar por encima de Eduardo Duhalde, el otro representante del peronismo federal y anti-Kirchner. “Los dos fuimos a una [elección] interna, una contienda entre Duhalde y yo, pero cuando yo iba quedando por delante, Duhalde se separó”, explica. La típica batalla a cara de perro entre dirigentes justicialistas, no ya por ganar unas elecciones, sino por conservar la “conducción” de determinados espacios, resultó con dos candidatos presidenciales peronistas, además, por supuesto, de la propia presidenta, Cristina Fernández de Kirchner, que también se reclama heredera del general.

Alberto Rodríguez Saá, de 62 años, abogado, casado, con tres hijos, pertenece a una familia que manda en la provincia de San Luis desde hace décadas, o mejor dicho, un par de siglos. San Luis es un territorio relativamente pequeño para los parámetros argentinos: 76.748 kilómetros cuadrados, algo así como toda Castilla- La Mancha, pero con solo 400.000 habitantes, y la familia Rodríguez Saá siempre ha sido una de las más poderosas. Uno de sus antecesores, Juan Saá, fue gobernador allá por 1860, y desde entonces se puede decir que las cosas les han ido muy bien. Su hermano, “el Adolfo”, como le llaman en San Luis, fue gobernador durante cinco mandatos seguidos, de 1983 a 2001, y llegó incluso a ser presidente de la República durante siete días del funesto mes de diciembre de 2001, cuando todo el país estalló con la crisis del corralito. Algunos testigos de la época, cuentan que cuando el breve expresidente regresó a San Luis, celebró una fiesta de 48 horas seguidas, de la que todavía se habla. Tras un breve periodo de descanso en el control personal de la gobernación, en 2007 le sucedió su hermano Alberto, el actual gobernador.

“¿Es verdad que su hijo es el secretario del gobierno local y que su sobrina dirige un periódico que recibe subvenciones?”, le preguntó ayer la periodista Magdalena Ruiz Guiñazu en una de las entrevistas presidenciales que, a cuatro manos junto con el también periodista Víctor Hugo, realiza en Radio Continental. (http://www.continental.com.ar/) “Sí, pero las subvenciones no es un tema que lleve yo sino el vicegobernador”, respondió Rodríguez Saá sin vacilar. “Usted critica mucho el capitalismo de amigos, pero muchas empresas locales son de sus propios amigos”, insistió, por su parte, Víctor Hugo. “No, no son empresas de amigos, son sociedades anónimas con mayoría de capital del Estado”, aseguró el candidato.

Rodríguez Saá busca una cuota de poder para negociar tras las elecciones del domingo

Alberto Rodríguez Saá se presenta en estas elecciones ofreciendo trasladar a toda Argentina lo que ha hecho en San Luis, una provincia, explica, con más de 800 kilómetros de autopista, algo insólito en un país con unas infraestructuras viarias muy atrasadas, y en la que se han construido “en los últimos años”, 60.000 nuevas viviendas. San Luis ha sido, ciertamente, objeto de mucha atención y muchos reportajes en los medios argentinos, impresionados por el aspecto renovado de la provincia. “Por supuesto que cuando afirmo que mi compromiso es ofrecer Wi-Fi gratuito en toda Argentina, como sucede en mi provincia, a lo que me refiero es a un compromiso con una agenda del progreso del país”, alega.

El candidato asegura que es contrario a cualquier reforma de la Constitución que permita a Cristina Fernández renovar mandato en 2015, un tema que se ha comenzado a discutir, antes incluso de que gane las de 2011. Niega que su candidatura favorezca a la presidenta al haber dividido a los peronistas anti-Kirchner, como se le ha acusado, y lanza muchas criticas a la gestión social del Gobierno actual: “Las villa miseria no han disminuido en los últimos años, sino que han aumentado un tercio”, precisa. Y se vanagloria de que los 400.000 habitantes de su provincia ya no padecen el terrible Mal de Chagas, una enfermedad que se contagia en viviendas insalubres e infectadas de un insecto llamado vinchuca. “No pueden decir lo mismo en otras partes del país”.

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