Ficha Corrida

22/10/2014

Coelho sai da Covas pra subir no muro

Filed under: Folha de São Paulo,Marcelo Coelho,PSDB,Tucano — Gilmar Crestani @ 7:53 am
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Subir no muro é uma especialidade atribuída ao PSDB desde os tempos do Collor de Mello. FHC queria ser Ministro do Collor, Covas não deixou. A alcunha de indeciso que pegou no PSDB só diz respeito às decisões administrativas, como esta da SABESP em não investir mais em reservas d’água. Quando se trata de vender o patrimônio que outros construíram, aí não há muro que impeça.  E sempre numa velocidade estonteante.

Todo mundo sabe que o muro é tucano. Ao subir no muro, dizendo votar nos dois, tucanou. A explicação é simples: o que aconteceu com Xico Sá serve de exemplo…

MARCELO COELHO

Se for para declarar apoio, voto nos dois

Notícias da Jacu-Pêssego

Se for para declarar o voto nesta época de declarações explícitas ou inexplícitas, digo que apoio os dois

Não há campanha eleitoral sem promessas, e minha impressão é que os próprios eleitores mais ou menos sabem que aquilo não será nem cumprido, nem cobrado, nem lembrado dali a um mês e pouco.

De resto, tudo é de um tecnocratismo, de uma numerologia insuportável. Os debates poderiam, talvez, fazer sentido num clube de engenheiros. Mas os R$ 32 milhões (ou serão R$ 13,2?) de gastos no Pisep-Fanuc que Fulano diz que faltam e Beltrana diz que foram mais me deixam em estado de completa indiferença.

Por vezes, nem é preciso usar números para que a promessa tenha a marca da chatice. Um exemplo. Durante 15 ou 20 anos de disputas municipais e estaduais, cansei de ouvir referências às obras da avenida Jacu-Pêssego, na zona leste de São Paulo.

O local primeiro apareceu, se bem me lembro, no sotaque característico de Paulo Maluf. Depois, seus concorrentes mantiveram o foco no local, e para mim aquele nome terminava soando como uma citação do "malufês".

Algo parecido, digamos, com o bordão romano ou o ilustre jurisconsulto que algum ministro do STF inclui nos seus votos: Mirabete, Damásio, bis in idem, Jacu-Pêssego. Não nego que a obra possa ser importante. Certamente era enorme, pois ao longo de muitas campanhas se prometia a sua conclusão.

Até que, na sexta-feira passada, conheci finalmente a famosa Jacu-Pêssego, ou parte dela. É um avenidão bastante vazio, pelo menos na hora em que passei por lá.

Estava voltando de Itaquera, depois de fazer mais uma das entrevistas que vão compondo o "Painel do Eleitor", publicado no caderno especial sobre as eleições.

Integrante assumido da "esquerda caviar", nunca levei minhas preferências ideológicas ao ponto de me afastar do eixo Higienópolis-Jardins. Até para vencer meus próprios preconceitos –e, sobretudo, minha timidez–, propus ao jornal uma série de reportagens em que eleitores "comuns", selecionados pelo Datafolha, dariam os motivos de seu voto.

Meu maior medo –alimentado por muitos quilômetros rodados de conversa com motoristas de táxi– era me confrontar com extremos de confusão e bobajada radical, quanto mais fundo na periferia eu me metesse. Não vi nada disso.

Aprendi que o voto para deputado estadual e federal segue uma lógica diferente da que prevalece na escolha do presidente.

O partido e o apoio a Dilma ou Aécio importam pouquíssimo. A ideologia decide quando se vota na "bancada da bala", mas o que domina é a lógica local, o voto no candidato da região.

Sem querer, portanto, o eleitor tem grandes chances de fortalecer o "fisiologismo" (pressões por emendas no orçamento, pelo menos) que gostaria de ver banido da política brasileira.

Ganhando Aécio, ganhando Dilma, o Congresso vai impor as mesmas dificuldades que se conhecem até agora. Talvez exista um ponto positivo nessa distorção. Os partidos fisiológicos acabam assumindo um papel "moderador", o que vale tanto para o caso de tentativas muito extremas de redução dos gastos públicos, quanto para as tendências antimercado que possam existir no Executivo.

Tiro outras lições dessas visitas a bairros distantes ("periferia" como sinônimo de muita pobreza, barracos, falta de luz e asfalto, não foi o que eu vi). Votando em Dilma ou em Aécio, as pessoas que entrevistei se mostram muito menos radicalizadas do que no meu ambiente social.

Simpatizo com esse espírito mais moderado. Se for para brincar um pouco, nesta época de declarações de voto explícitas ou inexplícitas, digo o seguinte.

Voto nos dois. Acho que uma vitória de Aécio pode ter efeitos "amargos", mas necessários, na macroeconomia, e tende a cercear a autocomplacência de um PT acostumado demais às práticas do poder. Acho que uma vitória de Dilma garante mais a expansão de iniciativas sociais, que não se resumem ao Bolsa Família.

Não voto em nenhum, se for para esperar controle real da corrupção, melhoria sensível na segurança ou na saúde pública. Todos sabem que, por mais que se tenha feito, falta muita coisa a fazer, e nenhum governo deixa de ter realizações ou omissões quanto a isso em seu currículo.

No resto, espero que todos os governos, próximos ou passados, municipais, estaduais ou federais, terminem as obras na Jacu-Pêssego. Caso já tenham terminado, sugiro que dupliquem as faixas então. É que vou ficando um bocado fisiológico também.

coelhofsp@uol.com.br

02/04/2014

Saiu um Coelho da cartola

zhnE hoje, em plena democracia, a Folha continua tratando a ditadura como ditabranda, e não se sente depreciada por ter emprestado seus carros para que os torturadores desovassem os cadáveres esquartejados pelos arrabaldes. Se o jornalista da Folha não pode falar nos crimes de seu patrão, quem poderá. Os do Estadão? E quem falará da participação do Globo?

Haverá jornalista com espaço em jornal para discutir e cobrar da RBS o apoio dado à ditadura? A RBS por seu jornal de aluguel, Zero Hora, estampou na capa uma foto do ditador de plantão e tratou o sexto aniversário do golpe sanguinário como “revolução democrática”. Está no DNA da RBS seu ódio à democracia e a tudo o mais o que isso signfica:, do grego, demos = povo, cratein = governo! Não é mera coincidência que um dos colonistas mais festejados pelos energúmenos era um inspetor de polícia que traficava para dentro da RBS as informações dos calabouços: Paulo Sant’Ana. Não é difícil entender por que chegou a Delegado nem porque goza de tanta simpatia pelos patrões…

Se estamos vivendo numa democracia, o que impede os jornalistas de tratarem de suas mazelas que ocorrem dentro das empresas de vivem de trocar informação por dinheiro? Por que só as mazelas dos outros merecem aparecer na capa dos jornais e revistas?

Pior do que os torturadores, são os que os apoiaram e continuam apoiado aqueles animais fardados, mesmo em pleno século XXI, montados em ideias do século passado.

MARCELO COELHO

O outro problema

Para defensores do golpe, torturar presos políticos agora virou forma de defender a democracia

Um escritor policial da velha guarda chamado John Dickson Carr (1906-1977) era especialista nos chamados "mistérios do quarto fechado". A vítima é encontrada morta, no seu gabinete de estudos, sem sombra de arma nem pegadas do assassino por perto.

Pior que isso, o lugar estava trancado por dentro; nenhum sinal de que janelas ou portas tivessem sido arrombadas. Como o assassino entrou? Como saiu? Como matou o milionário?

Crimes assim perfeitos terminavam resolvidos pelo obeso dr. Fell, que numa tarde de verão manteve estranha conversa com um homenzinho "grave e sincero". O homenzinho conta ao detetive um crime complicadíssimo, no gênero "quarto fechado".

Poucas páginas são necessárias para que o dr. Fell reconstrua mentalmente todo o mecanismo do assassinato. A vítima havia se encostado na janela, no ponto mais alto da mansão. Levara um binóculo aos olhos.

Dentro do binóculo, um mecanismo preparado anteriormente fizera saltar uma flechinha especialmente pontiaguda, que penetrou por um olho da vítima até perfurar-lhe o cérebro. O detetive prossegue em seus raciocínios, e conclui que o assassino tinha sido o próprio homenzinho que acabava de lhe contar o caso.

Vem dessa circunstância o título do conto, "O Outro Problema". Por que, afinal, o próprio assassino procurou o detetive para lhe propor o enigma? Talvez quisesse se certificar de que ninguém, nem mesmo o dr. Fell, seria capaz de desvendar o crime.

"Ele é um exibicionista, um sádico", disse o advogado José Carlos Dias a respeito do coronel Paulo Malhães, depois do depoimento em que este admitiu à Comissão Nacional da Verdade as torturas e assassinatos que cometeu durante a ditadura militar.

Disse ter matado "tantas pessoas quanto foram necessárias"; não soube se lembrar quantas torturou, só que foram "muitas"; contou que quebrava os dentes e cortava os dedos dos cadáveres, para impedir que fossem identificados.

Fico pensando, em todo caso, no "outro problema", para usar o título daquele conto policial. O que leva um ex-torturador a comparecer diante da Comissão?

Imagino que certo machismo militar se misture à teimosia de suas convicções políticas. "Não sou homem de me acovardar; vou à Comissão e enfrento essa comunistada." De resto, está afastado o perigo de que sejam presos depois do que disserem.

A construção mental vai além disso, entretanto. Ao longo de muitas décadas, o torturador teve tempo para repetir a si mesmo o que já dizia ao fim de cada sessão de interrogatório: estou cumprindo o meu dever, estou salvando o país da ameaça comunista.

É difícil, sem dúvida, imaginar que alguém fosse capaz de convencer-se disso depois de ter feito o que o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra fez com Maria Amélia Teles, segundo esta contou à Folha.

Ustra levou os dois filhos de Maria Amélia, Edson e Janaína, à sala onde ela estava sendo torturada, junto com o marido. As crianças tinham 5 e 4 anos de idade. "Mamãe, por que você está azul?", perguntou a criança para Maria Amélia, coberta de hematomas.

O ex-dirigente do DOI-Codi silenciou na Comissão da Verdade quando perguntado sobre torturas, mas repete o que todos os personagens da repressão dizem sempre. "Lutávamos pela democracia."

A contradição, embora salte aos olhos, é das mais comuns. Para defender a democracia, faço uma ditadura. Para que o comunismo não acabe com os direitos humanos, acabo eu com os direitos humanos.

Nós matamos, mas "eles mataram também". Até aí é fácil de ir. Não sei se algum torturador chegou a afirmar que "eles torturavam também".

"Era uma guerra", dizem os generais e os civis mais graduados do sistema, como se ignorassem que até nas guerras vale a Convenção de Genebra. Nós não inventamos a tortura, dizem outros. A Gestapo também usava… Por que tanta perseguição contra nós?

Uma frase do coronel Malhães acrescenta novo ingrediente a esse espetáculo de cinismo, de deboche e impunidade. "A tortura é um meio", afirmou aos membros da Comissão. "Se o senhor quiser saber a verdade, tem que me apertar."

Talvez seja essa a maior provocação. "Não conto tudo o que sei a respeito da ditadura. Vocês terão de me torturar para saber. Torturem-me. Mostrem que vocês são no fundo iguais a mim. Só desse modo conseguirei provar que eu estava certo ao fazer o que fiz."

coelhofsp@uol.com.br

19/02/2014

Até que enfim saiu um Coelha da cartola da Folha

Filed under: Direita,Esquerda,Maniqueísmo,Marcelo Coelho,Radicalismo — Gilmar Crestani @ 8:20 am
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Só faltou dizer quem tem o poder de espalhar as filosofias maniqueístas e as põem em relevo todos os dias, seja no papel, internet, rádio e televisão. Bem aí já seria pedir demais a quem trabalha na Folha…

MARCELO COELHO

Tiro, porrada e bomba

As pessoas sensatas são as mais desinteressantes, e do bom senso não se pode esperar grandes novidades

Vestida de rainha, em seu palácio de Cinderela, a funkeira Valesca Popozuda ameaça com "tiro, porrada e bomba" as inimigas que invejam sua emergência social.

Foi o tema do artigo que escrevi na semana passada. Mas essa celebração de tudo que é "tiro, porrada e bomba" encontra, infelizmente, outros exemplos no Brasil de hoje.

Desde que a esquerda abandonou a luta armada, há coisa de quarenta anos, ninguém mais pensava em promover grandes transformações sociais pela violência. Com nuances, um discurso mais simpático a essa atitude, inspirado sem dúvida pelas bizarrices do filósofo Slavoj Zizek, encontra alguns adeptos por aqui.

Toda essa aproximação, ainda que vaga, com a tática dos "black blocs" não faz mais do que jogar lenha na vasta fogueira inquisitorial da direita.

Será fácil, como nos anos 1970, associar todo pensamento democratizador, igualitário e timidamente socialista aos "baderneiros", aos "terroristas", aos "black blocs" e, por que não, aos "comunistas". Como se não vivêssemos, no panorama internacional, a verdadeira baderna criada por George Bush, pelos neocons e pelos irresponsáveis do mercado financeiro –sempre aplaudidos pela direita local.

No horror aos desatinos persecutórios da direita, há quem se confunda. O moderado de esquerda muitas vezes toma as dores dos sectários, dos fanáticos, dos radicais, porque reconhece e abomina a caça às bruxas.

Mas esses grupinhos violentos de esquerda não têm por que serem vistos como aliados de quem quer mais progresso social. Os "black blocs", ou seja lá quem for, atrapalham, combatem, inviabilizam esse caminho.

O progressismo, ao ser moderado, não necessita ser menos firme por causa disso. Rejeita com firmeza a direita do "prende e arrebenta", assim como rejeita o suposto charme radical do "bota pra quebrar".

Reconheço que é uma atitude meio sem graça, que de tanto olhar para os dois lados se imobiliza na inação. Infelizmente, as pessoas sensatas às vezes são as mais desinteressantes, e do bom senso não se pode esperar grandes novidades.

O mais preocupante é que o vandalismo, de certa forma, interessa a muita gente ao mesmo tempo. Ajuda o campo truculento das forças policiais, que precisam legitimar os excessos em que incorrem, por vício de formação. Ajuda o campo conservador, que pode colocar no mesmo saco toda crítica ao capitalismo e ao autoritarismo de Estado.

Ajuda, ao mesmo tempo, petistas e antipetistas. Os críticos do PT podem atacar as tentativas de "diálogo" com os "black blocs". O PT e aliados podem se livrar dos ataques que recebiam durante as manifestações.

Não se sabe quem são, e em que medida existem, os financiadores do vandalismo. Mas, pela quantidade de forças a quem os vândalos terminaram ajudando, o caixa dessa turma já poderia estar maior do que o do tio Patinhas.

Curiosamente, produziu-se uma espécie de "anticonsenso". Durante as manifestações de junho, sempre havia alguém defendendo alguma coisa com a qual milhares de outros podiam concordar. Havia caminho para um grande (não digo que fácil) acordo nacional.

A situação se inverteu: o caminho está aberto para o desacordo acirrado e completo, em que cada Valesca mostra unhas e dentes para as rivais.

Caso exemplar desse tom agressivo foi o da comentarista Rachel Sheherazade. Diante da foto do menor de rua amarrado nu a um poste, ela foi longe: é uma reação de "legítima defesa" da sociedade, e a quem se apieda do "marginalzinho", ela lançou a campanha "adote um bandido!".

O seu raciocínio não poderia ser mais típico da mentalidade extremista. Ou você acha certo amarrar um marginalzinho a um poste, ou então você deve adotar o garoto, acolhendo-o em sua própria casa.

Não há, nesse raciocínio, atitude intermediária. Todo caminho médio é "irrealista". Ou você mata ou beija. Quem não conhece a típica frase dos torturadores, segundo a qual você "não trata bandidos com luvas de pelica"? É nessa mentalidade, mas do lado oposto, que Joaquim Barbosa vira "torturador" e que José Dirceu vira "preso político".

De onde vem tanto extremismo? Há uma "policialização" do ambiente, irrompendo através da nossa película mais civilizada.

Afinal, no mundo da classe baixa, correm soltas as divisões: quem não está com o traficante está com a polícia, quem não é evangélico fundamentalista está entregue a Satanás. Suba um andar nesse barraco: quem é contra o PT é golpista, e quem é de esquerda apoia Pol Pot e Fidel.

Quem não está comigo é meu inimigo, e, como diria Valesca Popozuda, merece "tiro, porrada e bomba". O castelo encantado dessa rainha é o favelão da nossa atual miséria ideológica.

coelhofsp@uol.com.br

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