Ainda há esperança. Nem toda elite branca e endinheirada é sem educação. Não é todo dia que um tucano sai do ninho para fazer autocrítica. Depois de Cláudio Lembo, Ricardo Semler, Bresser Pereira, agora foi a vez do Juca Kfouri. Espécie rara, em extinção nos grupos mafiomidiáticos, ainda há alguns que se envergonham do déficit civilizatório dos colegas. Uma espécie de vergonha alheira por vezes reaparece em quem ainda não se deixou contaminar pela campanha de ódio de classe contra o PT e seus governos.
Seguindo bovinamente seus patrões, há uma manada de jornalista que pensa aumentar o salário puxando o saco. Estes são escolhidos a dedo para ocuparem espaços nobres e, quiçá, ocuparem o espaço político no lugar do povo. A RBS guindou Ana Amélia Lemos aos píncaros da glória. Tanto mais ela criticava o Governo Lula, mas a RBS lhe dava espaço. Era onipresente em todos os veículos do grupo. Pronto. Virou tábua de salvação de uma manada que a seguiu bovinamente ao cadafalso. Cada falso moralista depositou voto no PP gaúcho, o campeão da moralidade alheia. E não é que o PP gaúcho, todinho, ganhou um banho de Lava Jato. Moralistas, homofóbicos, racistas do PP gaúcho, secundados pela égua madrinha da RBS, estão enfiados até o pescoço nos desvios da Petrobrás. Como a ignorância é mãe do ódio, ouvem PP mas culpam PT. Como diz o Juca Kfouri, eles não suportam Bolsa Família, FIES, PRONATEC, pois as vagas nas universidades agora devem e são disputadas com gente pobre, preta e até filhos de colonos. Que ódio, ao invés de ficarem na roça, vêm pra cidade roubarem as vagas de nossos filhos, dizem os que sonegam, compram quinquilharias chinesas em Miami e se acham a fina flor do fascio littorio, gênesis do fascismo!
O panelaço da barriga cheia e do ódio
Por Juca Kfouri, em seu blog:
Nós, brasileiros, somos capazes de sonegar meio trilhão de reais de Imposto de Renda só no ano passado.
Como somos capazes de vender e comprar DVDs piratas, cuspir no chão, desrespeitar o sinal vermelho, andar pelo acostamento e, ainda por cima, votar no Collor, no Maluf, no Newtão Cardoso, na Roseana, no Marconi Perillo ou no Palocci.
O panelaço nas varandas gourmet de ontem não foi contra a corrupção.
Foi contra o incômodo que a elite branca sente ao disputar espaço com esta gente diferenciada que anda frequentando aeroportos, congestionando o trânsito e disputando vaga na universidade.
Elite branca que não se assume como tal, embora seja elite e branca.
Como eu sou.
Elite branca, termo criado pelo conservador Cláudio Lembo, que dela faz parte, não nega, mas enxerga.
Como Luís Carlos Bresser Pereira, fundador do PSDB e ex-ministro de FHC, que disse:
“Um fenômeno novo na realidade brasileira é o ódio político, o espírito golpista dos ricos contra os pobres.
O pacto nacional popular articulado pelo PT desmoronou no governo Dilma e a burguesia voltou a se unificar.
Surgiu um fenômeno nunca visto antes no Brasil, um ódio coletivo da classe alta, dos ricos, a um partido e a um presidente.
Não é preocupação ou medo. É ódio.
Decorre do fato de se ter, pela primeira vez, um governo de centro-esquerda que se conservou de esquerda, que fez compromissos, mas não se entregou.
Continuou defendendo os pobres contra os ricos.
O governo revelou uma preferência forte e clara pelos trabalhadores e pelos pobres.
Nos dois últimos anos da Dilma, a luta de classes voltou com força.
Não por parte dos trabalhadores, mas por parte da burguesia insatisfeita.
Quando os liberais e os ricos perderam a eleição não aceitaram isso e, antidemocraticamente, continuaram de armas em punho.
E de repente, voltávamos ao udenismo e ao golpismo.”
Nada diferente do que pensa o empresário também tucano Ricardo Semler, que ri quando lhe dizem que os escândalos do mensalão e da Petrobras demonstram que jamais se roubou tanto no país.
“Santa hipocrisia”, disse ele. “Já se roubou muito mais, apenas não era publicado, não ia parar nas redes sociais”.
Sejamos francos: tão legítimo como protestar contra o governo é a falta de senso do ridículo de quem bate panelas de barriga cheia, mesmo sob o risco de riscar as de teflon, como bem observou o jornalista Leonardo Sakamoto.
Ou a falta de educação, ao chamar uma mulher de “vaca” em quaisquer dias do ano ou no Dia Internacional da Mulher, repetindo a cafajestagem do jogo de abertura da Copa do Mundo.
Aliás, como bem lembrou o artista plástico Fábio Tremonte: “Nem todo mundo que mora em bairro rico participou do panelaço. Muitos não sabiam onde ficava a cozinha”.
Já na zona leste, em São Paulo, não houve panelaço, nem se ouviu o pronunciamento da presidenta, porque faltava luz na região, como tem faltado água, graças aos bom serviços da Eletropaulo e da Sabesp.
Dilma Rousseff, gostemos ou não, foi democraticamente eleita em outubro passado.
Que as vozes de Bresser Pereira e Semler prevaleçam sobre as dos Bolsonaros é o mínimo que se pode esperar de quem queira, verdadeiramente, um país mais justo e fraterno.
E sem corrupção, é claro!