Há três diferenças básicas em relação aos governos anteriores, como bem notou Ricardo Semler com seu artigo, na Folha de Hoje, “Nunca se roubou tão pouco”.
A primeira diferença está exatamente em ser um governo de esquerda. Se é verdade que o PT ganhou o governo mas ainda não alcançou o poder, também é verdade que, por isso, não pode dar cavalinho de pau nos rumos. A mudança é gradual e vem obtendo isso ao longo das gestões Lula e Dilma. Lenta e gradual como a abertura da ditadura, as mudanças no enfoque social também é lenta e gradual, constante e irreversível.
Em segundo lugar não só a liberdade mas o incentivo para a atuação republicana da Polícia Federal. Mesmo quando seus agentes são manifestamente contrários ao projeto político do PT, fazendo propaganda contra Dilma e a favor do Aécio Neves, não há como não reconhecer que agora não são mais operações para arrancar maconha no polígono das secas. Contra aliados ou partidários, nunca antes neste país a Polícia Federal atuou com tanta liberdade.
Por fim, a terceira diferença reside na maneira como Lula e Dilma encaram as críticas e por vezes até as calúnias em relação às respectivas atuações políticas. Por paradoxal que seja, os grupos mafiomidiáticos que os acusam de antidemocráticos costumam processar tudo e todos que não concordam com eles. Lula e Dilma nunca processaram jornalistas ou grupos de mídia. Lula e Dilma não dependem de um Gilmar Mendes para se livrarem da cadeia, como FHC.
Para quem quer se inteirar um pouco mais a respeito dos grupos empresariais que estão estrelando cadeias, há uma matéria muito interessante do grupo de jornalistas investigativos, Pública, que pode ser lido aqui: As quatro irmãs!
Casamento de empreiteiras com poder começou com JK e teve lua de mel na ditadura
Carlos Madeiro, Do UOL, em Maceió , 21/11/201406h00
Folhapress
A ponte Rio-Niterói em construção em 1972
O casamento harmonioso das empreiteiras envolvidas na operação Lava Jato com as obras públicas é mais antigo do que muitos pensam: começou no governo Juscelino Kubitschek (1955-1960) e teve sua "lua-de-mel" na ditadura militar (1964-1985). Essa é a análise de especialistas ouvidos pelo UOL e que fizeram uma retrospectiva sobre a história das empreiteiras no Brasil.
Autor da tese de doutorado "A ditadura dos empreiteiros", o historiador Pedro Campos avalia que, no regime militar, as empreiteiras começaram a se nacionalizar e se organizaram, ganhando força no cenário político e econômico. Para isso, elas criaram associações e sindicatos.
"Até a década de 50, eram construtoras que tinham seus limites no território do Estado ou região. O que acontece de JK pra cá é que eles se infiltraram em Brasília", explica Campos, professor do Departamento de História e Relações Internacionais da UFRRJ (Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro). A construção de Brasília, fundada em 1961, foi um marco para a história das construtoras: foi a partir de então que elas se uniram. "Ali, reuniram-se empreiteiras de vários Estados e começaram a manter contato, se organizar politicamente. Depois, passaram pelo planejamento da tomada de poder dos militares e pautaram as políticas públicas do país."
Com a chegada ao poder dos militares, as empreiteiras passaram a ganhar contratos do governo muito mais volumosos que os atuais. "Se eles era grandes, cresceram exponencialmente no regime militar. Se elas hoje são muito poderosas, ricas e têm um porte econômico como construtoras, posso dizer que elas eram maiores. O volume de investimentos em obras públicas era muito maior. Digamos que foi uma lua-de-mel bastante farta e prazerosa", comentou.
Entre as centenas de obras feitas no período miliar, há casos emblemáticos como a ponte Rio-Niterói, que foi feita por um consórcio que envolveu Camargo Corrêa e Mendes Junior entre 1968 e 1974. Já a Hidrelétrica Binacional de Itaipu, que teve o tratado assinado em 1973 e foi inaugurada em 1982, foi feira pelas construtoras Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez e Mendes Júnior. As mesmas Mendes Júnior e a Camargo Corrêa Transamazônica, que começou em 1970 foi inaugurada, incompleta, em 1972.
Apesar de denúncias de pagamento de propina terem sido escancaradas com a operação Lava Jato da Polícia Federal, o historiador acredita que a corrupção envolvendo empresários da construção e políticos é antiga.
"Todos os indícios são de que a corrupção não aumentou. O que a gente tem hoje é uma série de mecanismos de fiscalização que expõe mais, bem maior do que havia antes. Na ditadura não tinha muitos mecanismos fiscalizadores, e que o havia era limitado", afirmou.
Operação Lava Jato da
O presidente da construtora UTC, empresário Ricardo Pessoa, chega preso à Superintendência da Polícia Federal no bairro da Lapa, na zona oeste de São Paulo. Ele é um dos alvos da sétima fase da Operação Lava Jato, na qual são cumpridos 27 mandados de prisão nos Estados do Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Pernambuco e Distrito Federal Leia mais Marcos Bezerra/Futura Press/Estadão Conteúdo
Internacionalização e campanhas
Uma das provas do sucesso das empreiteiras no Brasil na ditadura foram os investimentos fora do país. A Mendes Júnior, em 1978, por exemplo, inaugurou a ferrovia Baghdad-Akashat-Alqaim, que liga três importantes cidades no Iraque e tem 515 quilômetros. A Odebrecht construiu a Hidrelétrica de Capanda, em Angola.
"As empreiteiras tiveram um volume de investimentos tão dilatado na época que os empresários fizeram ramificações econômicas e iniciaram a internacionalização. Assim, conseguiram desenvolver a estratégia manter o tamanho na participação política e na economia, diversificando suas atividades, como em ramo petroquímica, de telecomunicações, etanol. Hoje, elas são grande grandes multinacionais", afirma Campos.
Após a ditadura, e já com os cofres supercapitalizados, o financiamento privado de campanhas passou a garantir a manutenção das empreiteiras nas grandes obras do país. Somente na campanha deste ano, as empreiteiras doaram pelo menos R$ 207 milhões a candidatos de todos os cargos. No entanto, as doações sempre existiram, mas começaram a ser regulamentadas a partir de 1945 e já passaram por várias atualizações desde então.
"As vantagens a essas grandes empreiteiras nunca acabaram, pois com o regime democrático vieram as doações de campanha. E seria muita inocência achar que as empreiteiras doam por ideologia. Elas doam a todos. Tanto que vem aparecer dinheiro delas em prestação de conta de um deputado estadual aqui de Alagoas, por exemplo", disse o cientista político e professor História do Brasil da Ufal (Universidade Federal de Alagoas) Alberto Saldanha.
Para o juiz maranhense Márlon Reis, a força adquirida pelo lobby das grandes empreiteiras viciou o sistema de licitações. "A grande maioria dos empresários não acredita na possibilidade de participar das grandes licitações em condição de igualdade com as financiadoras de campanha. Isso reduz a confiança nas instituições, inibe a livre concorrência e reduz o ritmo do desenvolvimento", analisou.
Com a proximidade ao poder, as empresas passaram a tornar o mercado de participação em obras públicas exclusividade de um "clube", como era chamado.
"Nunca houve uma descentralização [de empresas] porque elas monopolizam e só abrem espaço para menores de forma terceirizada. Caberia ao gestor dar transparência ao processo, mas como aqui, nesse caso, uma mão lava a outra, aí se faz de tudo para tentar burlar", afirmou o professor Alberto Saldanha.
Data de fundação das empreiteiras
1939
Camargo Corrêa
1944
Odebrecht
1948
Andrade Gutierrez
1953
Mendes Júnior
1953
Queiroz Galvão
1965
Engevix
1974
UTC Engenharia
1976
OAS
1996
Galvão Engenharia