Dados que explicam o ódio ao Irã
Estou lendo Antologia da Asneira no Século XX e eis senão quando me deparo, no verbete França, com a seguinte frase atribuía ao cineasta Jean Vautrin: “Se a imbecilidade fosse gasolina, poderíamos passar sem os árabes.” São pelo menos duas afirmações numa única frase. A imbecilidade continua tão grande quanto à variedade de queijos que tornava a França, segundo De Gaulle, ingovernável. A outra diz respeito ao sentido utilitário que a Europa em geral, e os franceses em particular, têm dos árabes. (A começar por relações, em todos os sentidos, com Muammar Kadafi…)
Tenho lido respeitáveis analistas a respeito do atentado terrorista ao hebdomadário Carlos (Charlie Hebdo). As análises variam segundo se toma o geral ou o particular. No particular, as mortes ceifadas pelo terror. No geral, o uso coletivo da oportunidade de defender o direito à liberdade de caricaturizar o profeta Maomé. Restringir-se apenas a estes aspectos não explica porque de, repente, os que mais abrem processos, como Ali Kamel, contra quem ousa divergir.
De repente o Primeiro Ministro inglês, David Cameron, não só discorda do Papa em relação ao respeito que se deve dar às religiões, como também se dá ao direito de justificar ataque às religiões. A morte do brasileiro Jean Charles de Menezes deveria ser o suficiente para entender o verdadeiro alcance da declaração de Cameron. Tem-se liberdade para atacar a religião, sem qualquer risco. Mas qual é a liberdade de ser brasileiro de mochila nas constas no metrô diante da paranoia inglesa? Logo os ingleses que, passados 400 anos das ordenações feudais, da Idade Média, continuam escolhendo para representar-lhes o berço, a genética. E isso que dá para duvidar, com um bom exame de DNA, que a linhagem tenha permanecido pura… O caso do filho da amante de FHC, Miriam Dutra, nos é suficiente para maiores conclusões. Que democracia é essa que o simples fato de nascer de determinada família lhe outorga poderes sobre os demais? Ora, dar à casta real o poder de indicar o primeiro-ministro e dissolver o parlamento interessa à uma elite que se perpetra à margem da influência real. Só Shakespeare tinha dúvida(to be or not to be), mas, depois do affaire da Diana com o magnata de origem sírio-egípcia, a única coisa real na família é a infidelidade e o poder de castas.
Portanto, falar em liberdade de ridicularizar as religiões, quaisquer que sejam elas, é apenas álibi de de bom serviçal dos EUA. Afinal, não foi na Inglaterra que a liberdade de expressão, de Rupert Murdoch, sofreu a maior derrota?! Não é em Londres que Julian Assange está refugiado na Embaixada do Equador devido a perseguição que nega exatamente a liberdade de expressão? E nem se fale em Bradley Manning ou Edward Snowden…
Quando dos famosos cables(documentos) vazados pela equipe de Julian Assange, WikiLeaks, um foi suficientemente claro em como os EUA e seus capachos constroem a hegemonia. A CIA buscava instigar no Brasil conflitos religiosos.
Embora tenha sido seminarista por seis anos, não sigo nenhuma religião, mas há um ditado romano que dá ideia de como se constrói boas relações entre os povos: “em Roma, como os Romanos”. Em terra estrangeira, respeite os costumes dos locais.
E aí volto, ao começo. Por que esta necessidade de se atacar o Profeta Maomé, mas não atacar os deuses orientais, da Índia e China, ou mesmo Japão? Simples. Mais do Maomé é a gasolina o combustível que move a liberdade de expressão ocidental… Como disse aquele Sheik “A Idade da Pedra não acabou pela falta de pedra, e a Idade do Petróleo irá acabar muito antes que o mundo fique sem petróleo”. A ganância ocidental tem feito de tudo para tornar verdadeira a frase do Sheik Ahmed Zaki Yamani.
Quando colaborava com o Observatório da Imprensa, o jornal Zero Hora fez um editorial me ameaçando com “medidas judiciais cabíveis”. São estes capachos dos EUA que agora defendem a liberdade de ofensa.
Os grupos de mídia e o desrespeito às religiões
dom, 18/01/2015 – 06:00 Atualizado em 18/01/2015 – 17:58
Em meados dos anos 90, um bispo evangélico chutou uma imagem de Nossa Senhora Aparecida em um programa da TV Record. Houve comoção nacional. A Globo aproveitou o incidente para conduzir uma feroz campanha contra o bispo e a Record.
O episódio resultou na demissão do bispo, no seu afastamento da sua igreja e em pedido de desculpas da Record.
Em Paris, o jornal “Charlie Hebdo” publica uma charge do profeta Maomé. Segue-se o atentado terrorista. A reação francesa foi uma nova edição do jornal com uma nova charge do profeta.
Nem se discute sobre o atentado: é um ato terrorista que deve ser condenado exemplarmente. O que se discute é sobre os limites da liberdade de expressão.
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No Brasil, os mesmos grupos de mídia que conduziram a campanha contra a Record levantaram-se em defesa da liberdade absoluta de expressão. E aproveitaram oportunisticamente do episódio para combater qualquer forma de regulação. Regulação, aliás, em curso em todos os países desenvolvidos.
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Vamos por partes.
Não se pode comparar a forma de expressão individual de um artista, ou mesmo de um grupo em seu meio, com a penetração de um grupo de mídia, ainda mais daqueles montados em cima de concessões públicas.
A escala é totalmente diferente. Os grupos de mídia atingem milhões de pessoas, forjam o pensamento de vastas camadas de leitores ou telespectadores. Especialmente no Brasil, detém um poder de cartel imbatível.
Por isso mesmo, tem que existir limites à sua atuação. Mas uma visão vesga do Judiciário não entende essas características e tende a colocar todos os abusos ao abrigo do conceito de liberdade de imprensa.
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Tome-se a própria Record.
Anos atrás, conduziu uma campanha pesada contra as religiões afro. O Ministério Público Federal de São Paulo abriu uma ação exigindo reparação, na forma de um programa produzido por lideranças negras, reparando os danos à imagem do negro e da religião.
Montou-se um programa digno, sem ataques à Record, mas explicando a natureza das religiões afro.
Não se conseguiu essa reparação. A sentença – absurda – dava à Record a liberdade total de veicular o que quisesse, sem que os atingidos tivessem direito à resposta.
Não há diferenças: o chute na santa, a charge do profeta, o ataque às religiões afro são atentados à religião. Por que esse tratamento diferenciado, de enaltecer o direito de Charlie Hebdo em satirizar o profeta, tirar o direito do bispo da Record de chutar a santa e conferir à mesma Record o direito de avacalhar às religiões afro?
A diferença está na ponta atingida: depende da maior ou menor influência do grupo atingido, em relação ao agressor.
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Confira-se:
- No episódio da santa, os católicos eram os atingidos e os evangélicos os agressores. Prevaleceu a maior influência católica.
- No episódio das religiões afro, atingidos foram os seguidores de religiões afro; agressores, os evangélicos da Record. Prevaleceu a maior influência dos evangélicos.
- No caso do Charlie, os atingidos eram muçulmanos.
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Há algo de muito errado nessas métricas diferentes. Católicos, evangélicos, seguidores de religiões afro, todos merecem o respeito dos meios de comunicação. E os abusos devem ser coibidos, sim, pela Justiça.
E viva o Papa Francisco, o que melhor está entendendo esses tempos nebulosos.