Ficha Corrida

19/01/2014

Nós vamos invadir sua praia

Filed under: Grupos Mafiomidiáticos,Rolezinho — Gilmar Crestani @ 8:33 am
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O hoje direitista Róger, da banda Ultraje a Rigor, compôs aquela música que é a comprovação de que pimenta no dos outros é refresco. Róger sabia que Shopping é a praia de paulistano. Invadir a praia dos outros era tão legal, invadir sua praia, shopping, não é nada legal.

Tome-se o exemplo de Porto Alegre. Onde foram parar os campos que existiam atrás do Chocolatão? E aqueles do Cristal, onde hoje há uma floricultura e um estacionamento de ônibus, ao lado do Hipódromo? Também estão sumindo aqueles entre a Pereira Paiva e o Guaíba. Quando vim do interior jogava peladas nestes campos. Havia campeonatos neles. Sem espaço por aqui, meus conterrâneos, incluindo dois dos meus irmãos, criaram o Esporte Clube Campo Branco em Viamão.  Onde estão os espaços públicos de Porto Alegre?

A direita não se apropria só dos espaços. Também tenta capturar as manifestações de insatisfação. As manifestações de julho incluíam jogar merda na RBS e na Globo, tanto que seus funcionários não podiam acompanhar as manifestações com os logotipos dos respectivos grupos. Tentaram direcionar contra o Governo Federal, mas estava terminantemente proibido discutir a corrupção municipal, estadual ou empresarial. Os 650 milhões de sonegação da Rede Globo não poderia ser pauta, e isto explica a invisibilidade dos manifestantes que carregavam cartazes contra a corrupção dos grupos mafiomidiáticos.

‘Rolezinhos’ têm raízes na luta pelo espaço urbano

James Holston, professor da Universidade da Califórnia, prevê novos protestos

Antropólogo estuda a periferia de SP desde os anos 80 e diz que reação da PM e dos shoppings aos ‘rolês’ foi exagerada

ELEONORA DE LUCENADE SÃO PAULO

Como os protestos de junho passado, os "rolezinhos" são manifestações de uma cidadania insurgente cujas raízes estão na luta pelo espaço urbano que ocorre há décadas no Brasil. A análise é do antropólogo James Holston, professor da Universidade da Califórnia, em Berkeley (EUA).

Pesquisador da periferia paulistana desde os anos 1980, ele avalia que a politização do movimento foi provocada pela repressão exagerada e pouco inteligente.

Autor de "Cidadania Insurgente" (Companhia das Letras, 2013), Holston tem ligações familiares com o Brasil e passa temporadas em São Paulo. Nascido em Nova York, estudou também filosofia e arquitetura.

Nesta entrevista, concedida por telefone desde os EUA, ele comenta o consumismo cantado no funk ostentação, trilha de "rolezinhos": "Do ponto de vista político, significa o triunfo de um capitalismo deslumbrado, como ocorre no Brasil nos últimos 20 anos em todas as classes".

Folha: Como o sr. avalia os "rolezinhos"?
James Holston – Os "rolezinhos" existem há tempos nas periferias. Frequentei muito o shopping Aricanduva por causa de minhas pesquisas na zona leste. O shopping é a praia do paulistano. Essa juventude não está excluída dos shoppings. Estão entre os melhores fregueses.
A diferença foi o número de pessoas. Deu medo nos lojistas. Passear, brincar, paquerar nos shoppings se politizou agora por causa da repressão policial e da reação dos donos de shoppings. Reprimir nos primeiros "rolezinhos" no fim de dezembro foi uma reação exagerada, pouco inteligente e pouco ágil. O "rolezinho" nunca teve esse aspecto politizado. Agora virou movimento, uma expressão de conquista de espaço.

O sr. estudou os movimentos nas periferias de São Paulo no século passado. Quais são as diferenças em relação ao que ocorre hoje?
Por décadas, o coração da politização das classes mais humildes do Brasil foi conquistar o espaço, o terreno da casa, o bairro, a autoconstrução, a luta. As classes altas também ocupam, conquistam, defendem, segregam seus espaços. As classes trabalhadoras fazem isso conquistando novos direitos de cidadania. Isso muitas vezes afronta as classes médias.
Há em São Paulo uma tensão em torno do espaço que há anos não existia. Antes as classes dominantes dominavam completamente. Agora, não. As classes mais humildes têm noção do direito de ocupar, de viver, de circular.

Como o sr. explica o funk ostentação, espécie de trilha sonora dos "rolezinhos"?
É uma releitura paulistana do funk carioca, passando pela Baixada Santista. A pauta mudou da criminalidade para o consumo.

Essa ideia de consumismo exacerbado não se choca com a herança política de luta por espaço, que era mais coletiva?
Claro. O consumo na autoconstrução nos bairros nos anos 1970, 1980, 1990 era mais coletivo: todo mundo trabalhando. Esse consumo de hoje é também de autoconstrução, mas, personalista. Do ponto de vista político, significa o triunfo de um capitalismo deslumbrado, como ocorre no Brasil nos últimos 20 anos em todas as classes.

E o que mostra a reação aos "rolezinhos"?
As elites sempre reprimiram as manifestações populares por conquista de espaço. A mensagem é de que o pobre tem que saber o seu lugar; pode circular humildemente, fazendo o seu serviço. Mas, se circula com ostentação, mostrando que é dono de sua própria vida, ofende e afronta a elite brasileira.

Há ligação com as manifestações de junho?
Há uma articulação politizada nos dois casos. A polícia tem que assumir uma culpa muito grande, pois teve uma reação exagerada. Os "rolezinhos" são continuidade dos movimentos de junho, pois têm a ver com ocupação de espaço, com circulação.
Há diferenças; não há homogeneidade. Os "rolezinhos" são mais focados no consumo, na produção cultural, têm menos organização política. Mas podem vir a ter.

Quais os reflexos políticos dos "rolezinhos"? Eles vão crescer ou murchar?
É difícil prever. A rapaziada dos "rolezinhos" não quer ser politizada em demasia. Querem voltar à praia do shopping, para paquerar, zoar. Não quer dizer que não possam evoluir, ou outros grupos possam adotar a tática. Acho que isso vai acontecer. Vai ser um ano quente e deveria ser. Porque as reivindicações de junho não foram atendidas e também não sumiram. O que vai acontecer com toda essa energia? Com a chegada da Copa, vai esquentar.

O gigante acordou?
Muitos disseram isso. Outros, que a periferia nunca dormiu. A cidadania insurgente está sempre presente. Esquenta e esfria dependendo de circunstâncias impossíveis de prever. O Brasil vibra nos últimos 50 anos de cidadania insurgente. É uma coisa ótima para sacudir uma sociedade de muita desigualdade.

3 Comentários »

  1. […] See on fichacorrida.wordpress.com […]

    Pingback por Nós vamos invadir sua praia | O LADO ESCURO DA LUA — 19/01/2014 @ 1:59 pm | Responder

  2. Bacana a matéria. Tem outra também bem interessante sobre os rolezinhos, todos deveriam ler: http://cutucandoaonca.blogspot.com.br/2014/01/rolezinho-ela-falava-alemao-e-ele-tinha.html

    Comentário por Erlon — 19/01/2014 @ 11:36 am | Responder

  3. […] See on fichacorrida.wordpress.com […]

    Pingback por Nós vamos invadir sua praia | EVS NOTÍCIAS. — 19/01/2014 @ 10:39 am | Responder


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